“Miguel Relvas lidera claramente uma equipa de especialistas em comunicação”
Alda Telles destaca, ao nível da comunicação, o desempenho dos ministros da área do CDS (Paulo Portas, Pedro Mota Soares e Assunção Cristas) e de Nuno Crato.
Rui Oliveira Marques
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Alda Telles, directora geral de clientes da Fonte – Consultores de Comunicação, pronuncia-se num depoimento ao M&P sobre os primeiros meses do governo de Passos Coelho, analisados do ponto de vista da comunicação. “Existe uma máxima em comunicação que aconselha a que as más notícias sejam dadas de uma só vez e as boas em pequenas doses regulares. Claramente, o governo não optou por segui-la, atribuindo ao ministro das Finanças o ingrato papel de anunciar sucessivas medidas de aumentos de impostos”, considera a responsável, que destaca pela positiva o desempenho dos ministros da área do CDS (Paulo Portas, Pedro Mota Soares e Assunção Cristas) e de Nuno Crato. Amanhã será a vez de Rui Calafate (Special One) apresentar o seu depoimento sobre a estratégia de comunicação do executivo. Esta recolha de opiniões arrancou esta segunda-feira, com o testemunho de João Tocha (F5C).
Meios & Publicidade (M&P): Quais as principais diferenças que detecta no governo de Passos Coelho face ao de José Sócrates?
Alda Telles (AT): Nestes primeiros três meses, podemos distinguir duas fases de comunicação: a fase do “minister empowerment”, em que coube aos membros do executivo apresentarem individualmente as suas expectativas em relação ao seu mandato, em exercícios aparentemente pouco controlados de exposição mediática. Isto ocorreu de uma forma nem sempre eficaz, devido em parte à sua impreparação e inexperiência, criando alguns soundbites e posicionamentos menos positivos (de que “Chamem-me Álvaro” terá sido porventura o expoente máximo). Estamos agora numa fase mais “concêntrica” da comunicação, na qual as declarações dos ministros parecem mais preparadas e controladas. Não sei se existe a falada “central de comunicação” do governo, como se falava no anterior executivo, mas o ministro Relvas lidera claramente uma equipa de especialistas em comunicação, designadamente assessores e consultores com experiência políitica e, facto interessante, de diferentes quadrantes políticos
M&P: Quais os ministros que estão a ser mais bem sucedidos ao nível da comunicação?
AT: Naturalmente, os ministros que vêm da política e do Parlamento têm maior preparação e eficácia na comunicação mediática, sobretudo em termos do terrível e impiedoso meio que é a televisão. Cabem aqui, portanto, os ministros do CDS – Portas, Cristas e Mota Soares. Nos “não-políticos”, Nuno Crato tem boas capacidades de passar a mensagem, utiliza uma linguagem pouco hermética que consegue criar alguma empatia.
M&P: E quais os ministros com pior desempenho?
AT: Os ministros das Finanças e da Economia acumulam ambos as características de serem académicos e gerirem as pastas com maior impacto e escrutínio. Têm, por isso, uma maior exposição sem terem a necessária preparação. Penso mesmo que a surpresa e algum élan positivo que Vítor Gaspar conseguiu gerar pela sua postura singular não terá garantias de continuar a funcionar, à medida que o cenário “lição de economia com anuncio de novos impostos” se for repetindo.
M&P: Detecta algum aspecto que poderia ser melhorado na forma como o primeiro-ministro se relaciona com os jornalistas?
AT: O primeiro-ministro tem conseguido gerir habilmente sua comunicação individual e a sua relação com os media, ao manter um certo distanciamento da agenda mediática e delegando a maioria dos anúncios de austeridade nos seus ministros. Digamos que os “focal points” da análise mediática, e até política, têm sido os membros do governo, com particular destaque para o ministro das Finanças, pelo papel crucial do seu ministério. Esta estratégia tem evitado o desgaste de imagem de Passos Coelho, que tem preferido orientar-se para a política e os media internacionais. É o que eu chamo a estratégia de “double-dip” (no sentido seinfeldiano do termo), em que as principais declarações do primeiro-ministro são dadas aos media internacionais (Wall Street Journal, Le Figaro,…) e repescadas pelos media nacionais. Usada com equilíbrio, e complementada com grandes entrevistas televisivas como a de terça-feira à RTP, parece-me que o primeiro-ministro tem conseguido demarcar a sua imagem da imagem do colectivo a que preside.
M&P: As sucessivas medidas de austeridade estão a ser comunicadas aos portugueses da forma mais apropriada? Que conselhos daria nesta área?
AT: Existe uma máxima em comunicação que aconselha a que as más notícias sejam dadas de uma só vez e as boas em pequenas doses regulares. Claramente, o governo não optou por segui-la, atribuindo ao ministro das Finanças o ingrato papel de anunciar sucessivas medidas de aumentos de impostos. Contudo, esta metodologia contém uma realidade e um ponto forte. A realidade é que as medidas necessárias ainda não estão suficientemente conhecidas e apenas se pode gerir a sua expectativa (o que tem sido, neste aspecto, conseguido). O ponto forte é a consistência do discurso de austeridade que tem permitido uma boa gestão das (más) expectativas. O anúncio recente pelo ministro da “normalização” da economia a partir de 2012 foi, neste sentido, um movimento arriscado. Outro ministro que terá muitas dificuldades em fazer passar a sua mensagem é o titular da Saúde. A política anunciada de “moralização” da despesa e a responsabilização dos dirigentes do sector, baseada essencialmente na divulgação de números catastrofistas para o SNS, não será suficiente para evitar o sentimento de degradação dos cuidados de saúde que a maioria dos portugueses encara como um direito absoluto. Uma pasta muito sensível, e muito exposta a oposições políticas, resistências profissionais e protestos populares. Todas as medidas neste sector têm de ser comunicadas nas suas duas dimensões: a dimensão financeira, que o ministro domina bem, e a dimensão da responsabilidade social do estado nesta matéria, que o discurso do ministro tem de interiorizar.