Rui Oliveira Marques (Meios&Publicidade), Bruno Almeida (Unilever Jerónimo Martins), Bruno Monteiro ( DIA Portugal) e Miguel Salema Garção (CTT)
O digital continua a ganhar espaço nos orçamentos e nas estratégias de marketing, com investimento publicitário a ser transferido de outros meios, nomeadamente da televisão para as plataformas digitais, num ecossistema cada vez mais fragmentado em que o dinheiro é o mesmo mas os meios à disposição não param de aumentar. Mas é preciso lá estar porque as audiências estão a mudar e há públicos-alvo que não podem ser alcançados de outra forma que não através das plataformas digitais. Além disto, é necessário um esforço maior para cativar aa audiência num ecossistema cada vez mais saturado e no qual o grau de atenção diminuiu. É este o dilema e desafio das marcas na era digital, de acordo com o cenário traçado no painel “Marcas: Quais as prioridades em 2018?” por representantes de três sectores distintos: retalho, produtos de grande consumo e comunicações.
“Os hábitos dos consumidores estão a mudar muito rápido e isso implica alterações muito fortes, antes um anúncio colocado num intervalo à hora da novela de prime time alcançava uma grande quantidade de pessoas e hoje já não é tão simples, é preciso explorar outros canais e técnicas mais sofisticadas”, afirma Bruno Monteiro, director de marketing, comunicação e digital do grupo DIA Portugal, que detém a insígnia Mini Preço, admitindo que “a forma como é distribuindo o orçamento de marketing tem vindo a mudar, tal como a forma como se faz marketing”. “Os princípios básicos mantêm-se, as prioridades das marcas mantêm-se, mas a tecnologia e a fragmentação dos media e das audiências implica mudanças na forma como o marketing é feito”. “A televisão continuar a ser o principal meio mas é preciso olhar para outros meios que permitam um maior engagement com o consumidor que a publicidade tradicional pode efectivamente já não conseguir alcançar”, esclarece o responsável do grupo DIA, embora considere que “no caso do retalho alimentar tem havido um shift mais lento, o próprio e-commerce ainda vale pouco e é um sector onde a introdução do digital talvez seja mais lenta”. Ainda assim, sublinha, hoje em dia “para além da criatividade é preciso conteúdos mais personalizados e adaptados ao local onde se contra o consumidor, com ofertas focadas na localização e no seu perfil, algo que só está ao alcance do digital”.
“Hoje quando falamos de media é tudo muito mais complexo”, considera também Bruno Almeida, lembrando que a deslocação do investimento para o digital tem a ver ainda com outra questão determinante para as marcas: as vendas. Isto porque, explica o director de marketing foods e director de media da Unilever-JM, “no digital mistura-se algo que é a comunicação das marcas mas no fundo é também um canal de venda, o que faz com que capte desde logo muito investimento naturalmente”. Apesar do “mood de optimismo e de confiança económica”, Bruno Almeida sublinha que “a realidade é que, apesar do sentimento positivo, o universo de media está cada vez mais fragmentado” e “com um comportamento de consumidor cada vez mais dividido torna-se mais difícil o trabalho das marcas para alcançar quem querem alcançar”. “A televisão vai continuar a ser um meio muito importante, sobretudo num mercado como o português onde ainda se consome muita televisão e onde este é um dos meios que permite alcançar mais pessoas, mas a pressão é maior, quer para a televisão quer para outros meios, porque as pessoas hoje consomem muito mais meios e dividem muito mais a sua atenção”, reforça Bruno Almeida. “Agora, sem aumentar o investimento como é que mas marcas podem conseguir estar em todos esses meios? E estar com conteúdos relevantes para captar a atenção dos consumidores?”, questiono o responsável da Unilever-JM.
Um problema difícil de solucionar para muitas marcas cujos orçamentos de marketing não estarão a aumentar apesar do ciclo económico positivo que o país atravessa. Antecipando a chegada de 2018, Miguel Salema Garção adianta que “o orçamento não será maior do que o dos últimos anos”. “Não posso falar sobre ele porque os CTT estão num plano de transformação que será anunciado em breve mas não será maior do que o que tivemos este ano”, garante o director de marca e comunicação dos CTT, marca que aloca cerca de 35 por cento do seu investimento em meios digitais. Para Bruno Monteiro, que revela valores do orçamento de marketing do grupo DIA Portugal, “a tendência será a transferência do investimento da televisão para o digital”. Sobre o peso dos gigantes Google e Facebook nesse investimento, o responsável não avança valores mas confirma que “se consideramos o Google incluindo o investimento no YouTube é muito significativo”. “Durante algum tempo dizia-se que as pessoas não viam conteúdos muito longos no digital mas, se o conteúdo for impactante, as pessoas chegam até a ver mais tempo do que na televisão”, refere o responsável, explicando que “o consumo de media tem aumentado mas o nosso cérebro é o mesmo e por isso é muito mais difícil alcançar a atenção, é preciso conteúdos originais que contém uma história, que gerem envolvimento”. “Só assim é possível sobressair num ecossistema muito saturado da comunicação das marcas nos meios tradicionais”, acredita Bruno Monteiro.
No mesmo sentido, Bruno Almeida considera que formatos como branded content ou brand entertainment são “provavelmente o tipo de conteúdos, com uma história capaz de envolver, que têm mais capacidade para cativar o consumidor do que conteúdos demasiado informativos de produto, que é basicamente aquilo que o consumidor hoje em dia passa à frente nos breaks publicitários”. “As agências de meios têm um papel muito importante porque a digitalização veio fazer evoluir muito o negócio em que estamos inseridos”, concorda Miguel Salema Garção. Além das agências de meios, Bruno Almeida destaca também o papel das grandes empresas tecnológicas. O responsável considera que Facebook e Google “são parceiros através dos quais conseguimos alcançar públicos que não alcançaríamos de outras formas”, admitindo que estes dois gigantes “representam à volta de 50 por cento, talvez um pouco mais, do investimento digital” da Unilever-JM. “Há uma curva de aprendizagem que tivemos percorrer em termos de organização, as equipas na Unilever compreendem que o trabalho no digital é diferente e socorremo-nos destes parceiros para nos ajudar a ajustar mais rápido de forma a que consigamos acompanhar a constante evolução do meio digital”, explica Bruno Almeida, que deixa, contudo, um aviso: “O elemento sexy do digital não pode sobrepor-se aos objectivos de negócio, ou seja, não pode levar-nos a fazer coisas de nicho quando aquilo de que precisamos é de comunicar em larga escala. Face aos nossos objectivos, há um trabalho de comunicação que não pode ser para one-to-one nem sequer one to ten, temos de chegar ao maior número de pessoas possível.”