Disrupção do negócio? O melhor é namorar uma das Kardashians
[A Ideo] perguntou se os negócios não deveriam vir de questões, em vez de ideias
Pedro Simões Dias
Fundador da Comporta Perfumes e advogado de proteção de direitos de marcas
No artigo anterior na coluna que assino no M&P, admiti explicar a forma como se pode questionar os negócios de forma disruptiva, nos termos propostos pela Ideo num exercício apresentado durante o Luxury Brands Summit. Mas não tinha garantido partilhar essa explicação, por isso me levar a ter de revelar segredos de negócio da minha marca.
Depois de, em conjunto com a diretora do M&P, ponderar este risco face à importância dessa partilha de conhecimento, regresso ao assunto. Numa breve síntese, a Ideo, consultora mundial de ‘design thinking’ e inovação, perguntou se os negócios não deveriam vir de questões, em vez de ideias. Ou seja, se não seriam as questões que deveriam originar respostas/soluções e com isso novos negócios.
Nesse sentido, a Ideo propôs a um grupo de pessoas que questionassem os seus negócios, num exercício em que se responderia a:
– ‘Obvious truths’
– ‘Rug puller question’
– ‘Solution’
Questionei o meu negócio, mas, na minha mesa de trabalho (que tinha cinco pessoas), um bom samaritano arranjou uma ‘obvious truth’ praticamente transversal a todos os negócios: “para lançar uma marca é preciso investir dinheiro”, no sentido de criar uma marca relativamente global.
A ‘rug puller question’ foi “e se não fosse preciso investir dinheiro?”. A ‘solution’ certa levar-nos-ia ao nirvana.
A discussão foi brava, porque levou a mesa a questionar essencialmente dois aspetos: o modelo de distribuição de cada um dos negócios e o modelo de investimento em comunicação.
Não conseguimos obter uma ‘solution’ épica, porque seria muito difícil e cada negócio tem, aliás, variáveis diferentes em ambos os modelos. A solução que dei, e que ainda hoje acredito piamente que seria a mais eficaz para todos os negócios, foi alguém da marca em causa conseguir namorar com uma das Kardashians.
Não sei porquê, os meus colegas de mesa e os técnicos da Ideo ignoraram a minha resposta. Podemos olhar para este tipo de exercícios de metodologia inovadora da mesma forma como encaramos os ‘team buildings’ da nossa empresa: uma xaropada que tentamos evitar sempre que podemos, inventando uma desculpa qualquer. Sempre achei este tipo de exercícios e os ‘teams buildings’ horríveis.
Mas a Ideo é a Ideo e eu lá fui. De facto, foi diferente. Para o meu negócio dos perfumes, havia várias ‘obvious truths’, mas a que escolhi para disrupção foi:
– ‘Obvious truth’: “os perfumes são colocados na pele [isto é, no exterior, seja na pele, nas roupas – péssima solução – ou no cabelo]”. Assim é, nas diversas versões em que podemos perfumar-nos, seja com ou sem vaporizador, com ‘roll-on’ ou cremes e pós.
– ‘Rug puller question’: “e se os perfumes não tivessem de ser colocados na pele, no exterior”?
– A resposta que encontrei para a ‘solution’ foi: “tomando uma pílula”.
Se quando as pessoas comem alho (ou tomam suplementos de alho em cápsulas) a pele passa a exalar um odor aliáceo (pelos compostos voláteis de doses maciças de enxofre que o alho tem, designadamente de dissulfureto de alil-metilo), porque é que não poderiam tomar um comprimido, que fizesse exalar o cheiro do perfume de que gostam?
Já pus a minha equipa a tentar concretizar este sonho. Vai ser muito difícil. Muito difícil. E, para este caso, as Kardashians não valem de nada.