Marie Kondo e o Principezinho vão a um bar…
O ‘branding’ minimalista dita as regras nos dias que correm. As mensagens tornam-se muito mais claras, num mundo em que somos bombardeados por milhares de estímulos visuais a cada segundo que passa
Ainda se lembram da japonesa pequenita arrumadora profissional, que saltou para a fama em 2014? Entrava em casa das pessoas e, num abrir e fechar de olhos, libertava os desesperados donos de casa de todos os seus pertences supostamente desnecessários.
Quando alguém contratava os seus serviços, ficava a saber que nem a gaveta das meias ficaria por verificar. Praticar o desapego, para ela, era uma verdadeira obsessão: desde esvaziar gavetas a dobrar um par de cuecas, tudo tinha a sua arte. Libertar, desapegar, desafeiçoar-se e, até, arrancar eram as suas palavras de ordem. Arrancar, sim, porque o desapego às vezes pode ter aquela sensação do penso rápido a ser tirado de um braço peludo.
Confesso que nunca mais ouvi falar da Marie Kondo, provavelmente porque estas modas que chegam da costa ocidental norte-americana são tantas que muitas delas acabam por desaparecer no ar, ou talvez porque um cliente mais resistente se recusou a ficar apenas com 14 casacos em vez de 25. Mas a arte – ou moda – de praticar o desapego, essa, parece ter entrado pelo mundo da comunicação adentro.
Quem trabalha nesta área há uns tempos tem uma sensação estranha quando vê um spot de televisão, um múpi ou um anúncio de imprensa. A sensação que tem é a de conseguir, pela primeira vez, concentrar-se na mensagem, no objetivo, no ‘claim’. Onde anda o logótipo? Quem assina esta campanha?
Até há bem pouco tempo, nenhuma campanha saia para a rua sem um “o logótipo tem de ser maior”, dito pelo cliente, já depois de várias aprovações. Os manuais diziam que a marca tinha de ocupar x por cento da mancha, para que o consumidor não tivesse a mínima dúvida sobre o ‘dono’ da campanha que tanto o impactava.
Agora não. A Marie Kondo chegou à comunicação e espero que, ao contrário das modas da costa oeste da América do Norte, tenha trazido armas e bagagens para ficar. O ‘branding’ minimalista dita as regras nos dias que correm. As mensagens tornam-se muito mais claras, num mundo em que somos bombardeados por milhares de estímulos visuais a cada segundo que passa. E focadas no essencial.
De logotipos estamos nós fartos e este movimento ‘menos é mais’ também representa uma tendência maior de consumo consciente e sustentabilidade. Se nos focarmos no essencial, vamos ao encontro do propósito das marcas que escolhemos.
A mais recente campanha da Nike, que fala das dores físicas que todos os atletas sentem no dia a seguir a uma maratona, fez isso mesmo. O logotipo, que todos conhecem e que não é preciso gritar ao mundo que existe, quase não aparece no filme criado pela Wieden-Kennedy. O que importa é a sensação que provoca a campanha. A empatia, o sentido de comunidade, o sentimento de pertença e de familiaridade.
Quem trabalha nesta área há uns tempos, sobretudo os criativos, provavelmente nunca pensou que chegássemos a um momento na história em que fosse preciso usar óculos progressivos para vislumbrar logótipos em campanhas.
Mais. Mesmo quem trabalha nesta área há uns tempos e que acha que isto até poderia ser possível, nunca acreditou que quanto menor fosse a importância de um logótipo, maior seria o sucesso da campanha.
O essencial é invisível aos olhos, como dizia o piloto de aviação francês que, perdido no deserto do Saara encontra um principezinho. E as marcas finalmente compreenderam isso. Fica, Marie Kondo, fica. É essencial.