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‘Silly season’- vamos falar de sexo e luxo, Ok?

Desconsiderar rapidamente esse ‘efeito da marca’ num tema tão sensível como a a intimidade pode ser uma perspetiva apressada

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‘Silly season’- vamos falar de sexo e luxo, Ok?

Desconsiderar rapidamente esse ‘efeito da marca’ num tema tão sensível como a a intimidade pode ser uma perspetiva apressada

Sobre o autor
Pedro Simões Dias

Cinco anos depois, uma campanha da Saint Laurent leva-me a relembrar uma manhã à volta de sexo, a propósito de um novo produto, também lançado pela marca francesa de luxo. No final de 2019, a Vanda Jorge, que há muito acompanha e escreve sobre marcas, ‘lifestyle’ e tendências, convidou-me para assistir à primeira Ecoolhunter Talk. O tema era ‘O Sexo e o Luxo’.

A ‘premissa’ (sic) de base para esta conferência era o lançamento de preservativos com a marca YSL. Para a conferência, a Vanda tinha convidado a Mónica Seabra Mendes, a Fátima Cotta e o Carlos Coelho. A Mónica era, e é, académica e uma das maiores consultoras especialistas portuguesas na área do luxo, uma das pessoas que mais considero nesta área e por quem tenho muitíssima estima.

O Carlos já era, e continua a ser, porventura, a maior estrela em Portugal na consultoria relacionada com marcas, e por inerência de marcas de luxo, que conheço pessoalmente, mas com quem estive apenas uma ou duas vezes. A Fátima é uma reconhecidíssima jornalista e ex diretora de revistas femininas.

Preservativos da YSL e estes três, moderados pela Vanda, já valia a pena ir. Tinha ainda um interesse adicional: é que, meses antes, em junho de 2019, tínhamos lançado um novo perfume Comporta Perfumes, o Ocaso, um perfume hipersexual, com notas de jasmim e tuberosa misturadas com especiarias.

O jasmim (sobretudo o do Egipto) e a tuberosa (também apelidada ‘dama da noite’) são consensualmente consideradas as notas florais mais carnais da paleta das moléculas olfativas. O Ocaso é, pois, um perfume super indólico, a transpirar sexo por todos os lados e que era apresentado num frasco com pepitas de ouro micro, que saíam e ficavam na pele quando era usado.

Para essa imagem de ouro, com dourados e um perfil sensual/sexual, delineámos, para promover o perfume, uma campanha assente numa foto que exprimisse sensualidade, num final da tarde na praia da Comporta. A minha equipa pensou num piscar de olhos à cena do filme ‘From Here to Eternity’, ‘Até à Eternidade’ em Portugal, em que Deborah Kerr e Burt Lancaster se devoravam na areia molhada, mesmo à beira-mar.

Quando se tenta uma colagem dessas, o resultado tem de ser ‘flawless’ e, para isso, foram selecionados, como modelos, a Helena Coelho e o Tiago Lobo, dois dos mais importantes manequins portugueses e com uma sólida carreira internacional. Como fotógrafo, escolhemos o Gonçalo Claro, que é sem qualquer dúvida um dos mais conceituados fotógrafos na área da moda, tendo fotografado para a Vogue, a Elle, a GQ, a Chanel, a Dior, a YSL e a Zadig&Voltaire.

A fotografia que resultou desse trabalho é a que se apresenta na página seguinte. Fomos arrasados. Genericamente, comentou-se, percebemos nós, que uma marca de tão bom gosto e na área do luxo não se deveria misturar com imagens relacionadas com sexo. Também por isto, e para perceber por que razão é que tanto tínhamos errado, tinha de ir a essa Ecoolhunter Talk ‘O Sexo e o Luxo’.

Aprontei-me a agradecer à Vanda Jorge o convite, sendo que também lhe escrevi: “Tem a certeza deste tema? Isso não dá nem para cinco minutos de conversa”. No dia marcado, acordei ainda mais cedo, às 7h estava no ginásio e pelas 9h15 cheguei à Stivali, esse local de extremo bom gosto tranquilo. Fui o primeiro a chegar. E o primeiro a sair, também já vos digo, mas porque também tinha um outro compromisso.

O primeiro andar da Stivali, adaptado para o efeito, foi-se enchendo e, quando começou, a Vanda fez uma breve intervenção sobre aquelas ‘talks’ e, logo de seguida, lançou para o painel o repto de falarem sobre os preservativos da YSL e, com isso, sobre o sexo e o luxo. Com maior (a Fátima), assim-assim (o Carlos) ou menor (a Mónica) esgar de nojo pelo tema e por terem de falar sobre o mesmo, o trio, acreditem, fechou o tópico em 10 minutos.

Os três foram unânimes: a ‘cena’ dos preservativos da YSL era um absurdo, que era meramente para ‘buzz’ comunicacional e que, se assim fosse, não viam como uma marca de hiperluxo como a YSL podia aproveitar. Não viam como podia ser vantajoso uma marca como
aquela estar colada a uma coisa que era quase uma ‘commodity’ sem valor acrescentado, para um domínio que era de gosto dúbio.

Em 10 minutos, fecharam a conversa, sobretudo porque a impreparação dos três convidados para falarem sobre o tema foi quase total. Tinham lido umas coisas sobre as máquinas de venda automática onde se podiam comprar e o que eram os preservativos. Mas, nenhum dos três especialistas na área das marcas e do luxo os tinham usado e muito menos testado com um parceiro ou com vários, nem os tinham comparado com outras marcas de preservativos. Nada.

Ora, se me tivesse levantado às 6h30, ido ginásio às 7h, para estar bem acordado para assistir, por exemplo, a um debate sobre o último álbum do Lou Reed com o Ricardo Saló, o João Lisboa e o Nuno Galopim, por exemplo, não esperaria menos do que os três terem escutado
previamente o álbum.

Não uma, mas umas três ou quatro vezes, e que tivessem voltado a ouvir o penúltimo do Lou Reed e o último dos Velvet Undergound. E, depois, tivessem refletido sobre o mesmo e sobre o seu contexto na carreira daquele artista. Ou seja, que tivessem feito o trabalho de casa.

O que é que passou na ‘talk’ sobre sexo e luxo: os convidados não tinham experimentado os preservativos. Parece básico tê-lo feito, se iam falar sobre os mesmos, não? Como é que poderiam saber se eram mais finos ou mais fáceis de manusear. Ou, muito mais importante, se não eram muito mais ‘eficazes’.

Como é que poderiam saber se alguém que os usasse não se sentiria muito mais poderoso no ato? Que as parceiras ou parceiros recetores não iriam ter orgasmos mais explosivos ou mais contínuos? Que diabo. Porque é que um preservativo há de ser muito menos ‘empoderador’ do que uma carteira?

Porque é que uma pessoa, ao iniciar a fase mais quente da noite e colocar aquele preservativo, ao saber que é da YSL, não há de ficar com muito mais ‘power’ perante alguém com quem vai sair para um primeiro encontro? Quando leva a carteira YSL que comprou nessa tarde na Stivali, não vai com muito mais confiança para esse momento desafiador? Só porque a marca não se expõe tanto publicamente?

Se este exemplo, por um lado, não é o mais feliz por se tratar de um produto que não se mostra ostensivamente (o preservativo) versus um produto que se usa despudoradamente para mostrar a toda a gente (a carteira), assim demonstrando força ou estatuto, então, vejamos outro: serão os preservativos da YSL muito mais uma mera ‘commodity’ do que uns boxers da Dolce&Gabbana?

Estas peças de roupa interior também não estão assim tão ‘expostas’ durante um encontro a dois, só eventualmente no final da noite. Os meus filhos, sempre que podiam, sacavam os meus D&G quando saiam à noite e agora é só o que usam. É porque o algodão é melhor? Qual quê! É pelo puro ‘efeito da marca’, que pode ocorrer com quem use uns preservativos YSL. Desconsiderar rapidamente esse ‘efeito da marca’ num tema tão sensível como a a intimidade pode ser uma perspetiva apressada.

Como aquele painel se apressou no tema que me tinha levado à talk, no restante tempo, vim a saber posteriormente – porque, entretanto, já tinha saído – por um artigo da Vanda Jorge no site do ECO, que a Mónica, o Carlos e a Fátima “foram mais longe numa reflexão sobre as diferentes dimensões do luxo e até questionando se há ou não marcas de luxo em Portugal”. Sobrou tempo, o que até é raro nas conferências.

Há cerca de dois dias, recebi a newsletter da Saint Laurent a anunciar ‘Rive Droite – Wilson Tennis Balls’, a novíssima colaboração com a Wilson para bolas de ténis YSL. Fui ver a imagem e pensei ir encontrar um Nadal ou um Alcaraz num ‘backhand overhead smash’. Encontrei a imagem publicada nestas páginas. Chamem-lhes burros!

Nota: Tudo o que se refere neste texto passou-se publicamente e/ou disse-o diretamente às pessoas envolvidas.

Sobre o autorPedro Simões Dias

Pedro Simões Dias

Fundador da Comporta Perfumes e advogado de proteção de direitos de marcas
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