“Queremos subir as audiências, mas mantendo o perfil do público”
O rebranding da SIC Notícias, acompanhado por uma mudança de logotipo e uma maior aposta no digital, serviu de pretexto para uma conversa com Ricardo Costa. O diretor de informação […]
Sónia Ramalho
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O rebranding da SIC Notícias, acompanhado por uma mudança de logotipo e uma maior aposta no digital, serviu de pretexto para uma conversa com Ricardo Costa. O diretor de informação da SIC Notícias analisa as mudanças e dá a sua opinião sobre a nova imagem, revela que está atento ao que se passa na concorrência e confessa ter uma obsessão: acompanhar as tendências de consumo de media.
A SIC Notícias quer ser mais do que um canal de televisão. O rebranding, apresentado no passado dia 9 de outubro, faz com que a atualidade noticiosa possa a ser abordada numa perspetiva transversal, com o digital a ocupar um espaço mais relevante. Quer seja através da televisão, do telemóvel ou outro dispositivo, a SIC Notícias quer ser o destino da informação. O canal que inaugurou, em Portugal, a informação no cabo, em 2001, antecipa-se ao consumo da informação e aposta num movimento de foco no digital, com um novo site e uma nova app. Uma reformulação com o dedo da consultora Adyant e que foi acompanhada por uma campanha de publicidade multimeios, em TV, imprensa, rádio, outdoor, digital e multibanco. Para Ricardo Costa, não se trata de um Big Bang, como aconteceu com outro canal da concorrência. É uma evolução, não uma revolução. “É algo que faça as pessoas perceber que estamos noutro patamar”.
No dia 9 de outubro revelaram o rebranding da SIC Notícias, com um novo logotipo. Como está a ser o feedback a esta nova imagem?
Globalmente, está a ser bom. O objetivo principal com o rebranding é modernizar a imagem da SIC Notícias, torná-la mais competitiva e com um posicionamento mais digital. Desse ponto de vista, o feedback é que isso foi percecionado. Esperemos que o mercado também o percecione, quer as pessoas que nos veem, ouvem e leem, quer os anunciantes. Estamos no bom caminho e os objetivos foram cumpridos no primeiro dia: ter um momento zero em que a imagem da televisão muda, bem como o site e a app, e ficámos com um posicionamento mais moderno, mais competitivo e mais digital. Claro que há pormenores a afinar e ideias novas que vão surgir.
O que há para afinar?
Quando se muda uma marca, uma estrutura de grelha, uma televisão, um site e uma app, há sempre algo a afinar. Aliás, costumo dizer que esse é o lado bom de quem trabalha na parte criativa da informação. Há sempre algo novo, há uma ideia, um projeto ou um tema novo.
Não mudavam a imagem há quase 24 anos?
O logotipo da SIC Notícias não mudava desde 2001, mas houve alterações ao longo dos anos, bem como quando mudámos para o novo edifício da Impresa, em 2019. Aí, houve uma grande mudança de imagem. Passados quatro anos, entendemos que faltava dar um salto mais digital e começarmos a trabalhar naquilo que já não é o futuro, mas é o presente. Não escondo que a alteração do ecossistema de cabo, nomeadamente a entrada da CNN em Portugal, nos obrigou a olhar para esse projeto de forma mais ampla. Este projeto começou por ser uma evolução digital e acabámos por chegar à conclusão que devia também ser acompanhado por uma evolução em televisão. Foi aí que se caminhou para o rebranding. Começou por uma ideia de colocar a SIC Notícias com maior capacidade digital, pois achamos que é muito importante para o público e para os anunciantes, mas concluímos que, se fizéssemos isso, devíamos fazer com que a televisão casasse com essa aproximação digital. E, para fazer isso, devíamos mudar de logotipo. Foi um processo longo, por etapas.
Como foram essas etapas?
O ano passado foi um ano muito complicado pois fomos alvo de um ataque informático que nos paralisou durante dois meses, depois começou a guerra na Ucrânia e estivemos praticamente meio ano sem grande capacidade para pensar de forma mais estruturada. Foi sobretudo no outono do ano passado que começámos a planear o que poderíamos fazer e só no início deste ano é que as decisões começaram a ser tomadas. Fomos caminhando até chegarmos, antes do verão, à ideia do rebranding e do novo logotipo. Trabalhámos com a consultora Adyant, que nos ajudou a alterar o logotipo, sozinhos não teríamos conseguido.
Foi uma alteração, em termos gráficos, substancial, deixa de haver o globo.
Sim, a perda do globo deixou-nos um pouco baralhados.
Um pouco perdidos?
Não, só durante uns minutos. A primeira vez que o vi reconheço que fiquei à procura do globo, mas quando começámos a ver o novo logotipo animado, e todas as animações possíveis, começámos a perceber que fazia todo o sentido, que era um logotipo mais moderno e mais digital, que ia ao encontro do que queríamos. Porque a televisão, os media, estão a entrar numa nova era. Nunca sabemos se estamos a sair de uma era e a entrar noutra, mas claramente há uma mudança de era, com um consumo digital crescente, para o qual achamos que temos armas, mas não estavam afinadas. Agora estamos muito melhor preparados.
Pode dar exemplos do que melhoraram?
Se abrir o site, percebe isso imediatamente. Se for ver o que era antes, não tem nada a ver com a imagem, os conteúdos próprios que estamos a fazer ou a utilização de vídeo vertical, que queremos fazer mais neste novo site. Tentamos ligar permanentemente o que fazemos em televisão com o que fazemos em áudio e no site. Tudo interligado. Claro que podem dizer: ‘mas isso é o que todos fazem em todo o mundo’ e eu digo: sim, é o que fazem porque tem de se fazer e nós também temos de fazer porque hoje, em 2023, temos pessoas que se consideram consumidores da SIC Notícias, mas só nos seguem no Instagram ou no site, como haverá pessoas que só veem televisão ou que só seguem podcasts e o que queremos é que essas pessoas vejam, leiam e oiçam o que fazemos nesse ecossistema. Achávamos que não estávamos organizados para isso e agora estamos mais bem organizados. Mas repito: é um processo contínuo.
Já estou nesta área há muitos anos, mas lembro-me que começámos a evolução digital do Expresso em 2014, na altura em que se decidiu lançar o Expresso Diário. O que permite hoje ao Expresso ser um jornal sólido foi esse caminho iniciado em 2014. A verdade é que, passados nove anos, se isso não tivesse sido feito teria sido trágico para o jornal. Não quero fazer um paralelismo direto, mas se este tipo de mudança não começasse a ser feita na SIC Notícias e na SIC, acho que nos iríamos arrepender daqui por cinco ou dez anos e não nos queremos colocar nessa posição.
Falou do logotipo e da estranheza quando o viram pela primeira vez. Podemos fazer uma comparação a frase primeiro estranha-se, depois entranha-se?
Acho que sim, embora na semana antes de ser lançado mostrei-o numa reunião de redação e, pelo olhar das pessoas, diria que a esmagadora maioria gostou, ou seja, muitas pessoas nem passaram pela fase do estranha-se porque também já o viram animado. Vi-o pela primeira vez vi um PowerPoint estático e não é a mesma coisa. Com as animações as pessoas ficaram convencidas. Não estou a dizer que todos acharam o máximo, mas internamente foi muito bem recebido.
E, externamente, qual tem sido o feedback?
O feedback que temos tido também é muito positivo.
Quais as novidades que apresentaram?
A SIC Notícias não é um canal novo, no sentido em que fechou um e foi criado outro. É uma evolução do mesmo canal, os princípios e os valores editoriais são os mesmos. Mas quem olhar para o ecrã da SIC Notícias percebe que está diferente. Queremos um canal mais dinâmico, mais competitivo e que mostre que estamos a trabalhar em várias linhas. Isso é importante. Uma primeira linha televisiva para uns, uma primeira linha digital para outros, uma primeira linha de áudio para outros ainda. Somos muito fortes em áudio, juntamente com o Expresso, estamos muito fortes em redes sociais e tínhamos a noção que, no site, podíamos ter resultados muito superiores e os primeiros dias têm corrido muito bem. Em televisão, a nossa ideia sempre foi solidificar audiências. Crescer, mas manter o perfil de espectadores. Este não é um processo só para ganhar de quota de mercado. Queremos crescer, mas mantendo o perfil de público.
O objetivo das novas apostas não está apenas relacionado com as audiências?
Não. Queremos subir as audiências, mas mantendo o perfil do público. Não estou a dizer que é fácil subir as audiências, muitos outros canais têm esse mérito, acho é que algumas decisões poderiam fazer crescer a audiência, mas iriam destruir-nos o perfil e isso não queremos. A SIC Notícias é um projeto muito sólido do ponto de vista empresarial, essa solidez é a garantia da nossa independência editorial e é para se manter nos próximos anos. Mas, se ficássemos parados, iria ser praticamente impossível responder às necessidades digitais crescentes das pessoas para quem trabalhamos e fizemos essa evolução.
As audiências são um tema ao qual está atento ou não é obcecado com as audiências?
Obcecado não sou, mas é algo que faz parte do nosso trabalho. Todos os dias vemos as audiências de manhã e tentamos vê-las em detalhe. Vamos estudando e tentando perceber como conseguimos solidificar determinados horários com as armas que temos. Mas confesso uma obsessão e não tenho problema em assumir: sou obcecado com tendências de consumo de media. Tento ler o que se passa nos Estados Unidos, Inglaterra, França, Espanha ou Brasil para perceber tendências de media que podem chegar a Portugal. Algumas vão chegar inevitavelmente, outras podem não chegar porque há mercados diferentes, mas tento acompanhar. Convém perceber as alterações de consumo de televisão generalista e por cabo, de consumo de áudio ou de informação digital pois muitas delas vão cá chegar. Provavelmente não à mesma velocidade, nem necessariamente na mesma escala, mas vão chegar.
Hoje, as pessoas estão disponíveis em vários sítios e é isso que temos de fazer.
Por exemplo, no caso da informação da SIC: o “Jornal da Noite” e o “Primeiro Jornal” são dois porta-aviões muito sólidos, com audiências muito fortes e como um perfil comercial extraordinário. No caso da SIC Notícias, está muito sólida no cabo, mas as alterações de concorrência, por um lado a CMTV, e por outro a CNN, alteraram muito o ecossistema. Agradeço sempre à concorrência porque faz-nos mudar o que provavelmente não iriamos alterar se não houvesse esse espicaçar da concorrência, que é muito importante.
Qual a sua relação com a concorrência, costuma ver os programas, está atento?
Vejo muito. Obviamente que, no dia a dia, estou a ver a SIC Notícias e a SIC, embora tenha sempre as outras televisões ligadas, mas existem períodos em que tenho a televisão ligada no canal X ou Y e muitas vezes vejo coisas que estão claramente bem feitas, que são interessantes e estimulantes.
O que gostava que fosse o futuro da SIC Notícias, como o idealiza?
Estamos a falar a quantos anos? Essa é que é a questão complexa. Sou bastante mais prático, mas o que idealizo a cinco anos é que esta redação faça grandes jornais e grandes formatos para televisão generalista. Que faça um ótimo canal de informação no cabo, onde ainda há capacidade de crescimento de audiências, e que tenha uma presença digital muito forte não só porque vamos produzir conteúdos originais para digital, mas sobretudo porque há pessoas que vão querer consumir e ver, ouvir e ler conteúdos que até fazemos para televisão generalista e para cabo, mas vão querer ouvir-nos em podcast, ver no site e na app. É isso que espero que a redação da SIC seja daqui a cinco anos porque, se for isso, é uma redação que pode manter a mesma linha e independência editorial.
Off-air
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Programa de informação preferido?
Nacionais os da SIC e SIC Notícias. Internacionais vou dar uma resposta que vão achar que sou maluco. Vejo muito a francesa BFM TV porque acho muito bem feita e, por períodos, a Fox News. Detesto a Fox do ponto de vista jornalístico, mas é um canal muito bem feito do ponto de vista formal. Repito, é um desastre jornalístico, mas do ponto de vista formal é uma lição incrível.
Podcasts que ouve regularmente?
Ouço muitos portugueses, alguns estrangeiros, mas quase todos ligados à comunicação social. Ouço vários do Expresso e da SIC Noticias, ouço um ou outro do Observador e, depois, alguns internacionais, sobretudo do Financial Times (FT). Gosto muito do Rachman Review, do Gideon Rachman, comentador de política internacional do FT, que faz um podcast muito simples, mas muito bem feito, porque entrevista sempre pessoas com alto conhecimento.
Gostaria de ter o seu podcast?
Fiz um em 2021, chamava-se O Dia Em Que o Século Começou’, sobre o 11 de setembro. Foi uma experiência difícil pois deu muito trabalho, é um podcast narrativo que ainda se pode ouvir nas plataformas, embora esteja ligeiramente desatualizado pois foi feito quando os americanos saíram do Afeganistão, no verão de 2021. Gostei muito, foi uma experiência nova, mas a fazer algum podcast preferiria algo com uma estrutura narrativa e não apenas no formato entrevista.
O que vê na televisão?
Como trabalho no meio, tento ver muita televisão. Apesar de não ser espetador de novelas, quando estreiam gosto de ver um ou dois episódios para estar a par da estrutura narrativa. Não sou um grande consumidor de séries, sobretudo porque não tenho tempo, mas vou destacar duas das melhores que vi nos últimos tempos: “Succession”, na HBO, com um nível de texto absolutamente incrível, entrou para o top 5 de séries que vi em toda a vida, e “Euphoria”, recomendada sobretudo por pessoas mais novas, e fiquei muito bem impressionado. É uma série fabulosa, sobretudo para o público mais jovem.
Vê mais a concorrência ou a SIC?
Vejo mais a SIC, até porque no trabalho olho mais para a SIC, mas também vejo muito a concorrência, que é fundamental. O Expresso é hoje um jornal sólido do ponto de vista digital porque começou esse trabalho em 2014, mas se o Observador não tem sido lançado, o Expresso provavelmente não tinha feito este caminho a esta velocidade. E o próprio Público deu um grande salto no digital. Não estou a dizer que o Expresso teria ficado parado, mas é altamente improvável que tivesse feito o mesmo caminho, à mesma velocidade, se não tivesse aparecido o Observador e se o Público não tivesse começado a trabalhar muito mais o digital. Por isso é que a concorrência é muito importante.
Teme o erro?
Não, de todo. Num processo agressivo de digitalização ninguém pode temer o erro. A única coisa que temo, por isso é que fomos mais cautelosos neste rebranding, é de dar passos numa direção e que se descaracterize uma marca a ponto de perder público e anunciantes. Aí tememos, por isso é que tentámos fazer um caminho de evolução e não de revolução. Isto não é um Big Bang, porque isso é o início de qualquer coisa. Não é um Big Bang, é uma evolução, algo que faça as pessoas perceber que estamos noutro patamar. Isto não é uma critica, mas na Media Capital fez-se um processo diferente. Optou-se por fechar a TVI 24 e criar algo com uma marca diferente, com toda a legitimidade. É um processo diferente, esse é um Big Bang. O nosso é uma evolução.
Livro ou filme que o inspirou recentemente?
Inspirar não é bem a palavra. Li vários livros no verão, mas o que mais me impressionou nos últimos tempos foi “Aniquilação”, do Michel Houellebecq. Nunca tinha lido nada deste autor até ao ano passado e depois li vários livros dele de seguida. É um dos escritores que mais me impressionou nos últimos anos, é muito desagradável, fala sobre a falência da civilização ocidental, de uma certa decadência. A forma como constrói os romances e caracteriza a sociedade, neste caso a francesa, é muito interessante.
O que gostava de fazer se não fosse jornalista?
Se amanhã tivesse de deixar de ser jornalista, não tinha problema. Tenho uma ou duas ideias do que poderia fazer, mas quando esse momento chegar darei a resposta. Gosto de ter planos B na cabeça, não sei se são exequíveis ou se saberei fazer, mas tenho sempre. Estou há 34 anos nesta profissão, gosto do que faço, mas se amanhã, por alguma razão, tivesse de deixar de ser jornalista não era um problema, mesmo que não gostasse da mudança.