Rentrée televisiva: As armas dos generalistas para atrair mais público(s)
Os espetadores estão a consumir televisão de outra(s) forma(s). A mudança de paradigma condicionou as opções para as novas grelhas dos três principais canais nacionais, mas os formatos de maior […]
Luis Batista Gonçalves
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Os espetadores estão a consumir televisão de outra(s) forma(s). A mudança de paradigma condicionou as opções para as novas grelhas dos três principais canais nacionais, mas os formatos de maior êxito, uma aposta segura em tempos de incertezas, não foram esquecidos nas propostas para 2023/24. As maiores inovações estão, todavia, nos novos projetos de ficção.
As informações são contraditórias. Apesar do Media & Advertising Global Report, análise anual da Marktest, afirmar que o consumo diário médio de televisão em Portugal recuou 17 minutos em 2022, descendo para cinco horas e 21 minutos, há, todavia, dados que apontam no sentido oposto, como os que vão chegando aos principais decisores televisivos. “As pessoas dizem que não veem, mas é mentira. Estão a ver mais TV do que viam o ano passado ou há dois ou três anos”, garantiu, em declarações exclusivas ao Meios & Publicidade, Francisco Pedro Balsemão, CEO da Impresa, dona da SIC. “Dizer que já ninguém vê televisão é um mito que não corresponde à realidade e as nossas equipas de research podem comprová-lo. Há mais gente a ver TV do que em 2019”, assegura. “Muito mudou na forma como vemos TV. Hoje, já não o fazemos só num televisor, também o fazemos nos telemóveis, nos tablets e nos computadores”, afirmou durante o evento de apresentação da nova grelha da SIC.
Na revelação das novidades da TVI e da RTP1, o discurso foi semelhante. “O negócio da televisão, hoje em dia, já não é o mesmo”, alerta José Eduardo Moniz, diretor-geral da TVI. “Somos confrontados atualmente com muitos desafios e procuramos dar resposta. Hoje, não podemos ter a perspetiva hegemónica que havia no passado”, adverte.
“A RTP1 é um canal generalista, mas os nossos conteúdos, hoje, passam por muitas outras plataformas, pelo cabo, pelo satélite e pelo streaming, onde alguns dos nossos formatos mais recentes têm tido números muito fortes, até nalguns casos mais do que no ecrã tradicional”, sublinha José Fragoso, diretor de programas da RTP1 e da RTP Internacional, apontando como exemplo a série “Pôr do sol”, o concurso de talentos “The voice Portugal” e até o Festival RTP da Canção.
Esta mudança de paradigma condicionou algumas das opções para as novas grelhas dos três canais, mas os formatos de maior êxito, uma aposta segura em tempo de incertezas, não foram esquecidos nas propostas para 2023/24. As maiores inovações vão poder ser vistas nos novos projetos de ficção dos três principais canais generalistas.
As apostas da RTP1
“The Voice Portugal”, o programa de entretenimento de maior audiência da RTP1 em horário nobre, volta a ser uma opção para atrair (ainda) mais espetadores nas noites de domingo. Na sua décima-primeira edição, volta, à semelhança da primeira, a ser só apresentado por Catarina Furtado, sem Vasco Palmeirim. Outra das apostas fortes da RTP1, o último dos três maiores canais generalistas a apresentar publicamente a sua grelha, é terceira edição de “Takmaster”, nas noites de sábado. Vasco Palmeirim e Nuno Markl voltam a ser os anfitriões. Cândido Costa, Madalena Abecassis, Wandson Lisboa e Gabriela Barros são os novos protagonistas dos sete programas gravados, que contarão com outros tantos convidados. “A temporada já está toda gravada há algum tempo”, revela Vasco Palmeirim, que se mantém à frente do regressado concurso “Joker”, outra das apostas para o prime time semanal. “Há meia dúzia de provas que vão ficar na história do programa a nível mundial”, garante Nuno Markl.
A 30 de setembro, há mais um regresso, o de Filomena Cautela com a terceira temporada de “Programa cautelar”. A ascensão do autoritarismo, os perigos da utilização da inteligência artificial (IA) e a habitação são três dos temas abordados nos seis programas previstos. A 12 de outubro, volta outro clássico, “5 para a meia-noite”. Na vigésima temporada, a novidade é Gilmário Vemba. Os primeiros programas vão ser gravados, mas, mais para a frente, deverão começar a ser transmitidos em direto.
Em novembro, regressa mais uma edição do “MasterChef Portugal”, a sétima, com um grupo de chefs renovado. Além do retorno de Miguel Rocha Vieira ao formato, conta com Noélia Jerónimo, que transita da temporada anterior. Diogo Rocha é a única novidade. Durante a quadra natalícia, haverá uma edição especial, só com avós. A versão infantil, “MasterChef Júnior”, apresentada por Manuel Luís Goucha quando o programa foi exibido na TVI, é outro dos regressos anunciados.
As maiores novidades estão nas séries, minisséries e telefilmes. “A RTP é a grande máquina de produção independente na área da ficção”, orgulha-se José Fragoso. Em outubro, “Codex 632”, protagonizada por Paulo Pires e realizada por Sérgio Graciano a partir do livro “O codex 632” de José Rodrigues dos Santos, é a primeira das novas séries a estrear. Seguem-se “Erro 404” com Inês Aires Pereira, “Lusitânia”, “Matilha” e a terceira e derradeira temporada de “Operação Maré Negra”. “Hoje, mostrámos aqui cinco exemplos, mas podíamos ter mostrado 15”, garantiu ao Meios & Publicidade à margem da apresentação da nova grelha. “Temos uma linha de produção de ficção nacional bastante forte, muito potente, com conteúdos já muito adaptados ao mercado internacional”, refere. Nas restantes áreas, as apostas são menos arriscadas. “Como tentamos fazer conteúdos diversificados, precisamos de ter sempre na nossa grelha uma evolução de formatos que são clássicos na RTP1, mas têm soluções diferentes em cada época, além das mudanças de cenografia que fazemos sempre”, justifica.
A comemoração dos 40 anos do programa “O tal canal”, dos 50 anos de carreira de Herman José e dos 50 anos do 25 de abril de 1974 também vão ser assinalados em antena. “Vamos ter ainda documentários sobre a vida natural em Portugal. Temos muitos conteúdos em produção. No próximo ano, no entretenimento, também vamos ter formatos que ainda não foram produzidos em Portugal”, avança José Fragoso. A exibição de “Pôr do sol – O mistério do colar de São Cajó”, o filme mais visto do ano até agora, também está garantida para 2024. “Apostamos muito em conteúdos fortes em língua portuguesa. É um dos nossos fatores diferenciadores”, defende. A forma de financiamento também. “O nosso orçamento para a grelha da RTP1 é o mesmo há anos. Não tem variado. Espero que, no próximo ano, tenhamos um valor semelhante. As nossas opções são sempre feitas dentro deste orçamento, em função das flutuações de consumo das diferentes épocas”, justifica.
A estratégia (arriscada) da SIC
Foi a segunda generalista a apresentar a grelha para os próximos meses e tem em mãos uma das apostas mais arriscadas, um projeto de ficção omincanal que promete vir a fazer correr muita tinta. “Papel principal”, protagonizada por Carolina Carvalho e Margarida Vila-Nova, ainda sem data de estreia anunciada, é o grande trunfo da SIC para o último quadrimestre do ano. A nova telenovela é, no entanto, apenas um dos formatos da arrojada estratégia, que também integra uma sitcom semanal, “A casa da Aurora”, com personagens da novela, e um espetáculo de revista à portuguesa que o canal de Paço de Arcos pretende levar a teatros e salas de espetáculos de norte a sul do país.
Esta nova telenovela, que pode ser vista já no próximo outono, conta ainda com uma série juvenil para a plataforma de streaming Opto. “Os eleitos” retrata o conflito na origem da trama de “Papel principal”, a história de duas aspirantes a atrizes que não tiveram a mesma sorte. “A estreia é faseada. A novela é a primeira a estrear. A série da Opto será a última”, informa Daniel Oliveira, diretor de programas da SIC. Esta nova aposta pisca o olho ao caráter mais popular que fez da telenovela “Festa é festa” um dos maiores êxitos de audiências da TVI dos últimos anos. “Acredito que pode levar muito público que tinha deixado de ver novelas a reconciliar-se com este formato”, desabafa.
Francisco Pedro Balsemão também está expectante em relação a esta aposta. “Este é um projeto multiplataforma que me entusiasma muitíssimo. Vai ter também uma grande cobertura no digital, com novidades exclusivas nos nossos meios digitais e nas nossas redes sociais com bloopers. A televisão, hoje, é audiovisual, é vídeo, é on-demand e nós, enquanto SIC, somos obrigados a estar em todas as novas plataformas”, admite. A audácia da aposta não o assusta. “A nossa ficção tem tido muito êxito ao longo dos anos. Há produtos que têm mais sucesso e outros um sucesso mais relativo. O risco faz parte do negócio e o maior risco é ficarmos estagnados. Achamos que o caminho é este”, assume. “Não conheço nenhum projeto igual. Não houve nenhuma outra experiência destas que nos servisse de inspiração”, garante.
O reality show “Casados no paraíso”, apresentado por Cláudia Vieira e filmado nas Filipinas, foi, a par de “Isto é gozar com quem trabalha”, o programa humorístico conduzido por Ricardo Araújo Pereira, uma das primeiras confirmações da nova grelha a serem exibidas no início de setembro. Nas próximas semanas, as noites de domingo vão passar a ser ocupadas por “Hell’s Kitchen Famosos”. Novamente apresentado por Ljubomir Stanisic, o concurso de culinária conta a participação de figuras publicas como Lourenço Ortigão, Ana Garcia Martins, Francis Obikwelu e Diogo Amaral, que entretanto trocou a SIC pela TVI.
No ano em que comemora cinco anos de emissão, o programa “Terra nossa”, apresentado por César Mourão, ruma ao Brasil, EUA e Austrália em busca de histórias de portugueses que, um dia, emigraram para o Rio de Janeiro, para San Diego ou para Sydney.
“Estamos satisfeitos por conseguir apresentar um grupo de propostas que corresponde àquilo que entendemos ser hoje a TV. Atualmente, falamos para muitos públicos diferentes, que têm modos de consumo também eles diferentes. Hoje em dia, uma novela também é vista no telemóvel. Temos de adaptar as nossas apostas para que, ao nível da realização e de planos, possam corresponder aos públicos que estão de um lado e de outro”, afirma Daniel Oliveira, diretor de programas da SIC.
Em relação ao investimento da grelha, os comentários são mais comedidos. “Está tudo dentro do orçamento. O nosso plano estratégico foi lançado o ano passado. Termina em 2025. A estratégia está desenhada. Não podemos inscrevê-la na pedra, mas temos de nos ir adaptando e antecipando. O investimento que estamos a fazer está dentro do orçamentado. Não há aqui loucuras”, garante o CEO da Impresa.
TVI baralha e volta a dar
Vinte anos após a estreia, o regresso da popular série juvenil “Morangos com açúcar”, já em outubro, é uma das apostas mais fortes do ano da TVI, uma produção em colaboração com a Prime Video. “É a marca ou, pelo menos, uma das marcas televisivas com maior projeção de sempre em Portugal. Cruzou gerações e tornou-se referência para todas elas. Ousar voltar à série é desafiar o desconhecido, mas é também ter a coragem de assumir que há fenómenos que merecem ser revisitados, precisamente pela sua transversalidade geracional e pelo apelo que continuam a despertar junto de camadas diversas da nossa população”, justificou ao Meios & Publicidade José Eduardo Moniz, diretor-geral da TVI. “Numa altura em que a internacionalização é uma das preocupações da TVI e da Media Capital, esta série assume-se como uma ferramenta importantíssima no desbravar de caminhos que nos deem acesso a novos mercados e novas fontes de receita. A parceria com a Amazon Prime permite-nos abandonar uma visão paroquiana e abre-nos portas a um mundo mais global”.
Para José Eduardo Moniz, um dos principais desafios da televisão generalista passa por perceber que os tempos mudaram. “O modo como os espetadores veem televisão alterou-se, a tecnologia possibilitou um incontrolável leque de oferta e impõe-se um novo e corajoso olhar sobre a essência da TV generalista. É preciso encontrar fórmulas novas de comercialização e a humildade tem de ser vestimenta dos profissionais da área, pois as dinâmicas de hoje não se compadecem com o imobilismo, nem com a soberba, de quem acha que as metodologias e sucessos do passado se prolongam, imutáveis, ano após ano, semana após semana e dia após dia. Este meio está repleto de génios que desapareceram sufocados na inércia e na falta de compreensão das novas realidades”, defende. “Ninguém tem fórmulas mágicas, mas há uma coisa que se revela imprescindível: ter vontade de aprender e de se regenerar, sem complexos de superioridade, nem medo de abdicar de convicções perante ideias melhores. Os sucessos do passado moram lá atrás. Tanto no plano empresarial, como pessoal, tanto na conceção e produção de programas, como na apresentação. O mundo não para, a vida é uma roda em movimento incessante e a reinvenção quotidiana um imperativo”.
Na apresentação da nova grelha, a estação de Queluz de Baixo revelou as primeiras imagens da nova telenovela, “Cacau”, outra das apostas fortes, a par da nova edição do “Big Brother”, que estreou no passado dia 10 e, logo na primeira emissão, foi visto por mais de 1,2 milhões de espetadores. Protagonizada por Matilde Reymão e José Condessa, a nova novela conta com a participação de Paulo Pires e Fernanda Serrano. Esta produção marca também o regresso dos atores Diogo Amaral e Alexandra Lencastre à estação.
Depois de uma breve passagem pela SIC, a atriz volta também a ser uma das juradas de “Dança com as estrelas”, outro formado que regressa com Cristina Ferreira e o mesmo júri. A oitava temporada da telenovela “Festa é festa” foi confirmada durante o evento, transmitido em direto. Entre as novidades está ainda um novo concurso familiar apresentado por David Carreira e Kelly Bailey, “Onde está o dinheiro?”. “Isto é para os apanhados” é outra das novidades na grelha. Tal como todas as outras, ainda não tem data de estreia.
Na ficção, são as novas séries que (pre)dominam, a maioria delas inspiradas em factos reais. “Filha”, com Diogo Infante, Luciana Balby e Dalila Carmo, revive o drama de Esmeralda, a criança acolhida por um casal que o pai biológico veio, depois, reclamar. “João sem Deus”, uma coprodução entre a TVI, a Plural e o Canal Brasil, é outra das estreias. Com Marco Nanini e Ana Sofia Martins, conta a história de um cartomante brasileiro acusado de violar 335 mulheres.
Em preparação está ainda um documentário sobre o comendador Rui Nabeiro, falecido em março, realizado por Lionel Vieira. “É uma grande responsabilidade, mas também a realização de um sonho”, admite o realizador. O regresso de Miguel Sousa Tavares à antena da TVI foi outra das novidades anunciadas. Na informação, o reforço das rubricas de investigação foi confirmado por Nuno Santos, diretor de informação da TVI e diretor da CNN Portugal.
Ainda que não assuma a recuperação da liderança do como uma prioridade, Mário Ferreira, presidente do Conselho de Administração da Media Capital, dona da TVI, abriu os cordões à bolsa na tentativa de suplantar a SIC, que lidera há 55 meses consecutivos. “Foi feito um reforço de investimento considerável nas novas séries. Não estamos a falar do preço por minuto de uma novela. Estas minisséries são bastante mais caras”, garantiu o empresário ao M&P, também ele sem avançar valores. “Não lhos consigo avançar em concreto porque ainda não estavam completamente fechados. Ainda há coisas a acertar, mas é um investimento considerável”, confirma.
“Acreditamos naquilo que fazemos. Estamos a ser confrontados com muitos desafios e estamos a preparar as respostas adequadas. Recuperar a liderança não é das coisas que mais me preocupam. Na minha outra encarnação aqui, também estivemos muitos meses atrás e depois foi o que se viu. As contas fazem-se no fim”, assume José Eduardo Moniz.
“Acho que não se estava à espera de muitas das coisas que apresentámos. Temos muitas novidades no entretenimento e na ficção, sobretudo séries, um formato que marca um pouco o que a TVI quer implementar mais no seu futuro. Temos vários projetos em mãos que acho que vão surpreender. Estou muito entusiasmada com quase todos eles”, assume Cristina Ferreira, diretora de entretenimento e ficção da TVI e nova administradora executiva da Media Capital Digital.
“A televisão generalista já não mobiliza como antes”
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O entusiasmo dos dirigentes dos vários canais generalistas contrasta com o desânimo de Eduardo Cintra Torres, professor universitário e comentador do Correio da Manhã e da CMTV. “Quando as pessoas dizem que não veem TV estão a dizer que não veem conteúdos no televisor tradicional. A medição de consumos em computadores, tabletes e telemóveis comprova-o. Isto sem contar com os conteúdos de streaming, que não são, na esmagadora maioria, para não dizer na quase totalidade, realizados em linguagem televisiva. A televisão generalista já não mobiliza como antes, está em curva descendente quanto à audiência, perde recursos para fazer programas que atraiam mais espectadores e, portanto, tem perdido a relevância cultural, social e política”, defende. “Já nem há comédia decente, assassinada pelo politicamente correto e pela mediocridade dos humoristas do sistema nacional”, critica.