Com uma carreira construída entre Lisboa, Barcelona e agora Berlim, João Peixoto (na foto) traz na bagagem uma visão internacional da publicidade e uma forma diferente de ver o mundo, que aprende com os profissionais de 40 nacionalidades que com ele trabalham na Jung von Matt Spree.
Saiu de Portugal há 14 anos, como ambicionava, e atualmente lidera a direção criativa da agência, que integra a rede Jung von Matt. Num mercado altamente competitivo, tem saudades de “estabelecer relações profissionais e de amizade mais facilmente”.
Na rubrica dedicada a profissionais expatriados, o criativo partilha a experiência de liderar equipas multiculturais, os desafios de criar campanhas para marcas globais e a forma como a identidade portuguesa influencia o seu trabalho no centro da Europa.
Trabalhar fora de Portugal foi sempre uma ambição?
Desde os tempos de estudante que queria ter essa experiência, independentemente das condições de trabalho ou financeiras. Queria experimentar outro tipo de projetos e trabalhar com marcas de nível global. Idealmente, por um período não muito longo, mas num ápice passaram-se 14 anos.
Quais as principais diferenças entre trabalhar em Portugal e na Alemanha?
Há um facto curioso: quando se conhece bem a realidade alemã, percebemos que o estereótipo de organização e eficiência que os portugueses associam ao país não corresponde totalmente à verdade. Em Portugal há uma grande resistência à mudança, talvez devido ao tamanho do mercado e à constante instabilidade.
Na Alemanha, identificam-se os problemas que realmente interessam para os resolver e avançar. Destaco ainda o facto de o mercado alemão conseguir atrair pessoas de várias partes do mundo, com pensamentos diferentes e com quem tenho aprendido muito a trabalhar. Portugal ainda não consegue atrair essa diversidade.
Quais são as mais-valias de ser português e trabalhar noutro país?
Os portugueses têm uma grande capacidade de adaptação, o que pode ser considerado uma mais-valia. Atualmente, Portugal está na moda. Conheço muitas pessoas nesta área que visitaram o país recentemente e falam dele de uma maneira muito positiva. Não sei se isso nos beneficia de alguma forma, mas há uma identidade que agora é reconhecida e que passava despercebida há alguns anos.
Teve de enfrentar obstáculos por ser português?
Ser português nunca constituiu um obstáculo na minha vida profissional, e há cada vez mais casos de portugueses com sucesso internacional nesta área. O facto de pertencermos à União Europeia permite-nos circular e trabalhar nos países europeus com liberdade. É um benefício que nos abre as portas da Europa e uma vantagem em relação a pessoas de outros países.
Quais são as particularidades do mercado de publicidade na Alemanha?
A estrutura de clientes é bastante hierarquizada e, apesar de ser um país maior do que Portugal, há muito contexto regional na publicidade. Desde que trabalho para clientes globais a partir da Alemanha, percebo que o maior desafio é tornar este mercado mais atrativo, em oposição a outros mercados na publicidade, como os Países Baixos ou o Reino Unido.
Em Portugal, não é possível atrair este tipo de clientes. Falta dimensão, estrutura, organização e visibilidade. Num país maior, é natural que existam mais clientes globais, mais oportunidades e valor de produção. Os problemas também surgem, mas assumem outras dimensões porque existe um ‘budget’ substancial para criar e produzir um bom trabalho. Isso influencia as ideias e o que é possível fazer.

João Peixoto é um dos criativos responsáveis pela unidade internacional da Jung Von Matt
Que funções desempenha atualmente e que projetos tem em mãos?
Sou diretor criativo executivo na Jung von Matt Spree, em Berlim. Trata-se de uma agência alemã histórica e independente, com uma presença global significativa em dez países. Sou um dos criativos responsáveis pela unidade internacional da agência.
Neste momento, lideramos a comunicação digital da Hyundai a nível mundial e trabalhamos diretamente com a sede da marca na Coreia do Sul. Também desenvolvo outros projetos globais em áreas não digitais.
Enquanto responsável pela equipa internacional, dedico-me ao sucesso e expansão da agência nesta área, seja através da atração de talento ou do reconhecimento internacional do nosso trabalho nos festivais de criatividade.
Qual foi a experiência profissional que teve na Alemanha que mais o marcou e porquê?
Trabalhar com contas globais. Atualmente, trabalho maioritariamente com a Hyundai, mas também já trabalhei com a Mini, entre outras grandes marcas. O que mais me enriquece é aprender sobre diferentes culturas. Isso faz-me perceber que existem muitas maneiras de olhar para um problema e de ver o mundo. Na agência trabalham atualmente pessoas de cerca de 40 nacionalidades. Poder participar e contribuir para essa diversidade é muito bom.
O reconhecimento internacional é importante?
Ganhar prémios internacionais, que pareciam uma miragem quando iniciei a minha carreira em Portugal, é outro ponto a destacar. No fundo, não consigo destacar uma só experiência porque foram várias as oportunidades que me marcaram e contribuíram para a minha evolução profissional.
Em termos profissionais, do que é que tem mais saudades de Portugal?
Trabalhei pouco tempo em Portugal, mas tenho saudades de estabelecer relações profissionais e de amizade mais facilmente. Os portugueses têm uma capacidade de ‘fazer muito com pouco’ que gostaria que fosse mais generalizada. É também uma característica muito útil quando trabalhamos noutros países.
Pensa regressar?
Neste momento, não estou a pensar regressar. Os problemas do tecido empresarial português mantêm-se. O mercado nacional e a sua estrutura não são suficientemente apelativos. Gostava que Portugal conseguisse atrair clientes de todo o mundo.
Com a evolução do trabalho remoto, qualquer grande cidade europeia pode transformar-se num ‘hub’ global, atraindo não só talento português, mas também internacional. Isso seria muito interessante para os portugueses, mas implicaria uma mudança no mercado.

João Peixoto trabalha com várias marcas na Jung Von Matt, incluindo a Hyundai, a Mini e a Nivea