O fim dos third-party cookies é bom, mas não se espere muito disso: Opinião de João Paulo Luz
Privacidade é o direito que os indivíduos têm de controlar a recolha, o uso e a divulgação de informação acerca de si próprios e dos seus comportamentos. Esta definição retirada […]
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Privacidade é o direito que os indivíduos têm de controlar a recolha, o uso e a divulgação de informação acerca de si próprios e dos seus comportamentos. Esta definição retirada do ChatGPT deve ser bastante consensual e, até à era digital, deve ter levantado poucas dúvidas na sua interpretação.
Se quisermos então seguir um raciocínio estruturado teremos três fases na forma como a nossa privacidade pode ser violada. A primeira é alguém guardar informação sobre nós e sobre o nosso comportamento, sem o nosso conhecimento e autorização explícita. A segunda é a forma como a vai tratar, por quanto tempo a vai guardar, que informação correlaciona e para que fins o faz. Mais uma vez, se qualquer desses atos for realizado sem o nosso conhecimento e a nossa explícita autorização, a nossa privacidade estará em causa. A terceira é a divulgação pública dessa informação. Sendo esta a mais visível é, por isso mesmo, aquela de que temos maior consciência, não devendo significar de todo que é com o que mais nos deveremos preocupar.
Ora a discussão sobre privacidade que hoje ocorre no mundo digital está, eventualmente, demasiado focada na parte visível da invasão da privacidade. Já achamos normal que os nossos gadgets, iOS ou Android, nos sugiram coisas baseadas em padrões dos nossos comportamentos. Como essas sugestões nos são habitualmente muito úteis, a maioria de nós aceita esse lado positivo e não pensa excessivamente sobre isso. No entanto, isso significa que autorizámos, de forma nada consciente, termos e condições que permitiam acumular informação que não fazíamos ideia ter autorizado.
Em toda a Europa, há dois países em que o LinkedIn tem menos de metade da penetração média que tem no restante continente. É na Alemanha e na Áustria e é-nos fácil entender que, para esses povos, a ideia de preencherem uma ficha com todo o seu currículo profissional voluntariamente lhes levante reservas. No entanto, para quase todos nós, a ideia de que a gratuitidade de bons serviços justifica a cedência da nossa privacidade é algo que nos faz sentido. Ainda não são conhecidos dados sobre a percentagem de europeus que estão a aderir à subscrição da Meta de 9,99€ por mês (12,99€ se for em app iOS ou Android), mas todos antecipamos que deverá ser muitíssimo marginal.
A realidade em que participamos é de uma autorização não consciente do que irá ser recolhido sobre nós, durante quanto tempo e para que fins. Desde que os serviços sejam bons fazemo-lo e nem diferenciamos se as empresas que o estão a fazer têm comportamentos que validaríamos. Podem usar essa data apenas para ganharem muito dinheiro, com anunciantes que até agradecemos que nos impactem, mas também podem usá-la com outros que já preferíamos que não o fizessem, sejam entidades financeiras, seguradoras ou prestadoras de serviços de saúde. Mas também podem vir a ser adquiridas por um Elon Musk, que pode achar que deve intervir em questões políticas ou até em guerras e com posições que a maioria dos seus users não apoiaria. E podem até pertencer a estados com os quais não nos identificamos e que não deveríamos, de todo, querer que tenham tanta informação sobre nós.
No entanto, e a favor de todas estas empresas, a discussão que se faz sobre privacidade realiza-se como se fosse legítimo recolher, da forma que o fazem, tanta informação sobre os seus users, e apenas se deva questionar que tipo de informação é hoje acessível a tantos players tecnológicos.
O fim dos third-party cookies, muito falado porque a Google irá impedi-los no início de 2024, irá dificultar algumas práticas bastante intrusivas. Estes cookies permitem marcar um user em qualquer site, através de qualquer elemento terceiro que esse site carregue, como um mero anúncio. Em oposição, os first-party cookies são apenas possíveis de ser marcados no browser pelo próprio site. É um avanço, mas muito aquém do que deveria estar a ser discutido. Quem tiver os sistemas operativos, os browsers e as aplicações com milhares de milhões de users, não irá reduzir em nada a recolha da informação que hoje realiza, nem o uso que dela faz diretamente. Irão ser impactadas todas as empresas que, não tendo nenhuma dessas fontes de informação, desenvolveram ferramentas que marcam a nossa navegação e que ainda permitem, de forma simples, segmentar comportamentos evidentes. Perseguir alguém que foi a um site ficará limitado, ou alguém que fez determinada ação que essas ferramentas identificavam, mas as grandes plataformas não são as que vão estar aqui condicionadas.
O fim dos third-party cookies no Chrome será um passo positivo, tal como foi quando a Apple o decidiu no Safari em março de 2020, mas está longe de alterar algo de significativo. Não precisamos de recear a eficácia da publicidade online, mas também não podemos achar que a nossa privacidade passará a estar protegida. O meu Apple Watch continua a dizer-me, quando ligo o carro e o iPhone sincroniza com o Apple CarPlay, que com o trânsito que se verifica vou precisar de apenas 16 minutos para chegar a casa, porque já sabe que, perto das 20h, é o trajeto que faço de segunda-feira a sexta-feira. É útil e não é aborrecido como ver anúncios em sequência dos sites que visitámos, mas certamente tem muito mais intromissão na minha privacidade.
Artigo de opinião assinado por João Paulo Luz, diretor de negócios digitais e publishing da Impresa