“Não somos uma entidade pública muito conservadora”
O Turismo de Portugal é hoje um case study internacional ao nível da comunicação. Em entrevista ao M&P, Lídia Monteiro, directora de marketing e promoção do organismo público, explica a estratégia seguida e como funciona o departamento que gere um dos maiores orçamentos de marketing do país.
Pedro Durães
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Os números do turismo nacional não param de surpreender e sucedem-se os valores recorde. No último ano, as receitas geradas pelo sector superaram pela primeira vez a fasquia dos 15 mil milhões de euros, aumentando 19,5 por cento relativamente ao ano anterior, o ritmo de crescimento mais elevado desde 1998. O número de hóspedes ultrapassou também pela primeira vez os 20 milhões. Resultados que fazem da estratégia de promoção seguida pelo Turismo de Portugal um caso de sucesso a nível internacional. “Arriscar é o nosso ponto de partida, obviamente com objectivos operacionais, sejam eles descentralizar a procura turística, tornar o país menos dependente da sazonalidade ou diversificar mercados externos”, aponta Lídia Monteiro, para quem “uma posição contida, institucional, num sector tão competitivo como o turismo, não é uma boa estratégia”. Em conversa com o M&P, a directora de marketing e promoção do Turismo de Portugal, que dirige uma equipa de 33 pessoas que incorpora internamente elementos das agências de publicidade e de meios, explica a estratégia e conta como funciona o departamento que gere um dos maiores orçamentos de marketing do país: 50 milhões de euros.
Meios & Publicidade (M&P): O turismo nacional está em estado de graça e multiplicam-se os recordes no sector. Onde é que a evolução da abordagem estratégica do Turismo de Portugal ao nível da comunicação e do marketing ajuda a explicar este crescimento do turismo?
Lídia Monteiro (LM): Houve de facto uma evolução grande. Ainda que acredite que os resultados que o turismo tem hoje são produto do acumular de investimento em comunicação e em marketing que tem sido feito ao longo dos anos. No último ano comemorámos 25 anos da nossa marca, que foi criada por José de Guimarães e que todos reconhecem. Foi também o ano em que Portugal foi eleito o melhor destino turístico do mundo. Costumo fazer esta relação porque é uma distinção que acontece ao fim de 25 anos de, consistentemente, usarmos a mesma marca, de termos acumulado estratégias de comunicação coerentes e que, acima de tudo, têm sabido adaptar-se e recriar-se conforme o contexto, as oportunidades e as necessidades. Julgo que tem residido aí a nossa eficácia de comunicação.
M&P: Mas olhando para essa evolução, há uma alteração estratégica que considere ter contribuído mais para estes resultados mais recentes?
LM: Nos últimos anos adaptámos a nossa comunicação às tendências mundiais. Enquanto destino, evoluímos do ponto de vista de comunicar a nossa oferta exclusivamente focada no seu produto para, acima de tudo, passar a ser focada em insights humanos. Tentamos comunicar sempre com um compromisso com aquilo que é relevante e pertinente para as pessoas. Por isso, o que temos feito é, por um lado, estarmos presentes com mensagens e propostas que estão de acordo com aquilo que as pessoas hoje gostam de fazer, sentir, partilhar e, por outro, ir acompanhando os diferentes momentos do ciclo de uma viagem. Desde o momento da inspiração até ao momento em que as pessoas estão já a escolher o seu destino turístico e, finalmente, os momentos em que têm a experiência e em que a partilham para que no final nos possam recomendar. Houve aqui, tanto do ponto de vista conceptual como do branding, o assumir de um propósito para a marca destino: receber bem todas as pessoas venham elas de onde vierem, um conceito de turismo inclusivo. Por outro lado, utilizar as ferramentas que temos hoje em dia disponíveis, mais tecnologia com uma abordagem cada vez mais digital. Tivemos um capital de aprendizagem muito grande nas plataformas digitais, foi um investimento que fizemos, não só do ponto de vista de recursos financeiros mas também de recursos humanos. Estamos cada vez mais, dentro do Turismo de Portugal, capacitados para poder gerir bem campanhas digitais. Mas não esquecemos que temos outras ferramentas mais tradicionais e continuamos a tirar partido delas.
M&P: Essa evolução fez com que o marketing do turismo se tenha afastado das campanhas estanques a cada novo ciclo de comunicação para assumir uma estratégia mais contínua e constante. Na prática, o que mudou e como é hoje o trabalho diário de promoção do país?
LM: Mudou bastante. Desde logo, há uma mudança muito importante que passa por incorporarmos pensamento digital em tudo o que fazemos. Mesmo quando se trata de utilizar ferramentas offline, a ideia é sermos capazes de incorporar pensamento digital, ou seja, pensarmos sempre qual é o máximo partido que podemos tirar de cada iniciativa que fazemos, seja uma feira seja uma activação de marca. Passa por perceber como é que podemos utilizar também estas oportunidades para que tenham o máximo de visibilidade para lá do espaço físico onde acontecem. Estamos sempre a pensar de forma global e digital. Sem esquecer naturalmente que o que estamos a comunicar é o nosso país, mas quando digo global é ter presente que tudo aquilo que estamos a comunicar, toda a nossa oferta, é exportável. Outra mudança é o facto de nos termos tornado mais produtores de conteúdos. Somos, hoje em dia, uma equipa muito focada em produzir conteúdos e uma equipa que, acima de tudo, procura conversar com as pessoas. Ou seja, mudou aquele mindset que tínhamos de como íamos comunicar e fazer um material promocional para um mindset em que pensamos sobretudo como vamos conversar com as pessoas, que é, desde logo, o principio da redes sociais. É isso que tentamos, manter este diálogo. E transformamos também as pessoas em nossos activos. Tentamos sempre que sejam as pessoas a apropriarem-se e sejam co-produtores connosco das campanhas de Portugal, como aconteceu com a campanha Ponha Portugal no Mapa. No fundo, deixámos de ser tão fechados do ponto de vista do trabalho para estarmos mais abertos e disponíveis, para que todos os que experienciam Portugal possam expor o seu ponto de vista sobre o destino turístico. Tem sido muito produtivo e enriquecedor, temos aprendido imenso com a forma como os outros promovem Portugal e o fazem de uma forma tão eficaz.
M&P: Mindset mais digital e mais produtores de conteúdos implica uma adaptação ao nível dos recursos humanos. Como compara a equipa do marketing do Turismo de Portugal que dirige hoje com a de há uns atrás, como foi essa evolução do próprio departamento?
LM: É importante referir que não foi apenas incorporar novos recursos, foi também pegar nos recursos que já estavam no Turismo de Portugal, recursos técnicos muito competentes, e dar-lhes mais formação e mais competências nesta área. Fizemos uma formação especificamente dedicada e taylor made para a nossa equipa de marketing com a Universidade Católica na área do marketing digital e, permanentemente, procuramos que a nossa equipa esteja presente em diferentes acções de formação em Portugal e também no estrangeiro. O objectivo tem sido que a equipa que está aqui no Turismo de Portugal cresça, naturalmente também incluindo outras pessoas. Hoje em dia temos um departamento de comunicação e marketing digital, que não existia, ainda que grande parte das pessoas que o integram já cá estivessem a trabalhar. Actualmente, a nossa direcção tem dois grandes departamentos, o departamento de comunicação e marketing digital e depois um departamento de marketing territorial e de negócios. É um departamento que tem mais a ver com o território, com as nossas regiões, mas também com todas as plataformas que proporcionam às empresas fazer negócios, como é o caso das feiras, dos workshops.
M&P: Como é composta a equipa e como está distribuída entre os departamentos?
LM: Abrangendo os dois departamentos, somos no total 33 pessoas. Metade integram o departamento de comunicação e marketing digital e a outra metade está dividida pelo departamento de marketing territorial e de negócios e por duas equipas multidisciplinares de trade marketing e de M&I (Meetings & Incentives).
M&P: Uma das áreas em que têm apostado e que terá levado a mudanças na equipa são as redes sociais, com base nessa estratégia de diálogo constante. Quantas pessoas no Turismo de Portugal trabalham actualmente a presença nas redes sociais e como é operacionalizado esse trabalho nos vários mercados?
LM: É uma equipa pequena para o volume de trabalho e para a ambição que temos. Contamos aqui no departamento com duas pessoas que trabalham em exclusivo e em full time a gestão de redes sociais e, depois, temos administradores nas nossas equipas de turismo no estrangeiro. Temos 27 equipas espalhadas por diferentes países e cada uma delas tem um administrador que trata de gerir conteúdos para o mercado em questão relativamente ao seu idioma. Definimos uma estratégia editorial e fazemos uma edição mensal exactamente como se fossemos uma publicação, com um conjunto de conteúdos pensados de acordo com um plano editorial mensal. Esse plano editorial tem a possibilidade de, semanalmente, ter rubricas de oportunidade dependendo dos acontecimentos, mas é disponibilizado às nossas equipas no estrangeiro e as rubricas relativamente a cada mercado são definidas pelas equipas locais em cada geografia. No caso da China, temos uma situação bastante diferente porque temos plataformas distintas. Não há Facebook por isso estamos no WeChat e no Weibo. Neste caso específico contamos com o apoio de uma agência local.
M&P: Trabalham com agências locais noutros mercados?
LM: A China é um caso particular, é o único mercado que tem uma agência para trabalhar estas plataformas porque são diferentes de todas as outras. Nos outros mercados as plataformas são comuns e não temos uma agência local. Temos depois, pontualmente, no caso dos EUA e do Brasil, agências de comunicação que nos dão apoio ao mercado, não só obviamente nas redes sociais.
M&P: A Partners e a OMD são as vossas agências criativa e de meios quer em Portugal quer para as campanhas desenvolvidas para os mercados internacionais. A Partners trabalha não só as campanhas de maior dimensão mas também as iniciativas de activação de marca, comunicação digital e redes sociais. Onde é que começa e acaba o trabalho desenvolvido internamente e aquele que fica do lado da agência? De que forma tem evoluído também essa relação e o modo como se articula a equipa de marketing?
LM: Temos uma relação muito próxima com a agência, no fundo como um prolongamento quase da própria organização. E a agência também tem assumido um pouco esse papel, o que é muito interessante do ponto de vista dos resultados que daí advêm. Hoje em dia é cada vez mais fácil passar briefings à agência porque interiorizaram e incorporaram muito bem toda a nossa estratégia de turismo e a estratégia de comunicação. Aquilo que nós, enquanto marketers e comunicadores, retiramos da estratégia do sector, a ET27, está muito incorporado na agência e têm-nos ajudado a interpretar esses objectivos operacionais e transpor para ferramentas de comunicação e de marketing. Há um diálogo muito positivo e o resultado final, conceptualmente e criativamente, é da agência mas no Turismo de Portugal temos também um trabalho de grande proximidade para podermos sugerir formas diferentes de fazer o trabalho. Há algo que costumo dizer sempre nos briefings: vamos arriscar e vamos superar-nos. Porque uma posição contida, institucional, num sector tão competitivo como o turismo, não é uma boa estratégia. Arriscar é o nosso ponto de partida, obviamente com objectivos operacionais, sejam eles descentralizar a procura turística, tornar o país menos dependente da sazonalidade ou diversificar mercados externos. Temos naturalmente objectivos de marketing que perseguimos, as nossas campanhas não aparecem apenas por criatividade. Acreditamos mesmo que branding, comunicação e marketing são poderosíssimos para que se possa crescer enquanto destino turístico.
M&P: Essa premissa de arriscar é fácil de fazer passar para lá do departamento de marketing ao nível da restante estrutura do Turismo de Portugal, um pouco contra o estereótipo do conservadorismo de uma entidade pública?
LM: Não somos uma entidade pública muito conservadora, é fácil. Na verdade, temos isso ao nível da administração e é extensível à própria secretaria de Estado, não têm perfil conservador, antes pelo contrário.
Leia aqui a entrevista completa, publicada na edição desta quinzena do M&P