Depois da saúde mental, o kindness veio para ficar
Nunca se falou tanto de saúde mental como nos dias de hoje. A pandemia fez com que o tema saltasse para a ordem do dia e são cada vez mais […]
Sónia Ramalho
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Nunca se falou tanto de saúde mental como nos dias de hoje. A pandemia fez com que o tema saltasse para a ordem do dia e são cada vez mais as pessoas e as empresas que assumem a importância de discutir o tema, o que abriu as portas a uma nova tendência: o kindness. Falámos com Susana Coerver, que trocou uma multinacional para se dedicar a ajudar quem mais precisa.
No rescaldo da pandemia, que nos obrigou a viver fechados em casa e a transformar as salas de jantar em salas de reuniões, salas de aulas e que normalizou as reuniões por Zoom, algo mudou na forma de encararmos o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Algo mais importante saltou à vista: a importância de parar e cuidar da saúde mental. O tema deixou finalmente de ser tabu e são cada vez mais os exemplos de líderes de opinião que assumem a importância de cuidar da saúde da mente, assim como se cuida da saúde do corpo.
O tema é uma das grandes tendências e obrigou a pensar na forma como tratamos de nós próprios e dos outros, seja na esfera pessoal ou profissional. Pesquisas comprovaram que ajudar os outros pode ser benéfico para a saúde mental já que reduz o stresse, aumenta o bem-estar e até melhora a saúde física. A gentileza (kindness) deixou de parecer uma fraqueza, para assumir cada vez mais importância e é uma ferramenta de inteligência emocional cada vez mais poderosa que está a mudar a relação entre as empresas e as pessoas. Se antes era pedido a uma marca que cumprisse o que prometia, de preferência a um preço razoável, depois o cliente passou para o centro da equação e era necessário encontrar soluções para o satisfazer. No entanto, atualmente o desafio é outro e está centrado no ser humano: o que podemos fazer para que as pessoas se sintam bem?
O relatório “A importância de fazer com que as pessoas se sintam bem: do propósito às empresas human centric”, elaborado pela área de deep digital da LLYC, revela as razões pelas quais as marcas têm de se comprometer com esta estratégia e como podem desenvolver uma metodologia para construir um plano de posicionamento que se conecte com qualquer um dos seus stakeholders e gerar uma influência positiva sobre eles, seja um cliente, um funcionário, um investidor ou um fornecedor.
“É preciso pensar mais nas pessoas do que no produto. Se queremos fazer com que alguém se sinta bem, temos de o conhecer primeiro e, para isso, temos de perceber o que o preocupa, o que faz para resolver esses sentimentos e onde. Atualmente, não há nada melhor do que os dados para alcançar uma maior probabilidade de sucesso. Ao colocar as pessoas no centro das decisões e das ações, as marcas podem construir relações mais valiosas e duradouras com os seus clientes”, afirma Celia Fernández-Sesma, diretora de clientes de deep digital da LLYC Portugal e uma das autoras do relatório.
Já a segunda edição do Global DEI Census, estudo liderado pela World Federation of Advertisers (WFA), que avalia o estado da diversidade, equidade e inclusão no setor do marketing, indica que entre as várias matérias analisadas destaca-se a saúde mental, com 41 por cento dos respondentes nacionais a referir que estão frequentemente em stresse no trabalho e apenas 46 por cento concorda que o seu local de trabalho é aberto à saúde mental.
Um salto de fé
O que leva alguém a trocar uma multinacional por um projeto pessoal a começar do zero? Os valores e as crenças que valem a pena seguir. “O Lidl é uma empresa incrível, onde aprendi muito sobre cultura alemã, organização e processos, mas há algo muito comum para quem trabalha há muitos anos em publicidade ou marketing: começar a questionar-se sobre o que está a fazer em relação aos seus valores e crenças”, confessa Susana Coerver, antiga head of marketing do Lidl e que atualmente é uma das caras por detrás do Kindology, um projeto que promove a saúde mental com oferta de consultas de psicologia a quem não tem a possibilidade de suportar esse custo.
“Arriscar numa startup é sempre um momento de ansiedade e incerteza, mas também é um ato de paixão e coragem para correr atrás daquilo em que acreditamos, além de ser uma oportunidade de aprendizagem contínua, algo fundamental na vida”. Em 2022, decidiu que a Kindology era “um projeto de grande relevância com impacto social. Por isso, juntamente com o João Henriques e a Joana Namorado decidimos embarcar neste processo empreendedor, ao mesmo tempo em que percebemos que as coisas nem sempre acontecem na velocidade que desejamos. Chegou um momento em que sentimos que tínhamos de investir mais energia no projeto para que saísse do papel”.
Susana Coerver está consciente que levará algum tempo até que possam viver exclusivamente do Kindology. “Terá de ser equilibrado com outros projetos, como dar aulas e realizar workshops em empresas, consultoria, assim como outras novidades que estão em desenvolvimento. No entanto, o nosso projeto precisava de atenção, de kindness e finalmente foi concretizado”. Kindology é uma empresa de impacto social na área da saúde mental, cuja missão passa por democratizar o acesso a ela. “Há um ano, uma pessoa próxima, grávida de seis meses, foi aconselhada pelo médico de família a tirar licença e receber atendimento psicológico urgente, pois estava a passar por um momento difícil e logo teria um bebé nos braços, o que, devido às flutuações hormonais, poderia agravar os sintomas. Esse bebé já nasceu, completou seis meses e a consulta ainda não aconteceu”.
A importância da empatia
Susana Coerver assume que a empatia sempre fez parte da sua vida, começando no contexto familiar e na educação. “A capacidade de me colocar no lugar dos outros foi algo que foi crescendo ao longo do meu processo de desenvolvimento pessoal, especialmente quando percebi que um ponto de vista é apenas uma visão a partir do ponto onde estamos e que existem vários pontos de vista, dependendo de fatores como o contexto, educação, religião, experiência”. Logo, esta proximidade ao kindness “está intimamente ligada ao meu processo de desenvolvimento pessoal, mas também com a humildade necessária quando nos abrimos ao ponto de vista dos outros. Também associei essa ideia à minha vida no Brasil, em 2011, de onde trouxe o lema “gentileza gera gentileza”, desafiando-me a perceber que não sou mais importante do que qualquer outro ser humano, desde o segurança até aos membros do conselho de administração. Por último, essa conexão estende-se à minha experiência como CEO durante a pandemia, com uma liderança humana e, portanto, kind, além da necessidade urgente de “kindness” num mundo cada vez mais polarizado”.
Chief love officer
Numa altura em que se fala tanto de fenómenos como The Great Resignation ou sobre Quiet Quitting, e que revelam que as culturas empresariais mais antigas começam a estar esgotadas, surgem exemplos de uma gestão mais humanizada. Milton de Sousa, professor associado da Nova SBE, abordou o conceito de liderança com sentido no livro The Meaningful Leader, a edição deste ano do QSP Summit teve como foco a temática da liderança e Cristina Amaro, CEO e CLO da The Empower Brands House lançou recentemente o livro Chief Love Officer onde demonstra como uma liderança mais empática é crucial para o sucesso das empresas.
E para quem ainda tem dúvidas sobre o verdadeiro papel de um chief love officer e da sua importância nas organizações, basta ler a dedicatória no início do livro de Cristina Amaro: “ao comendador Rui Nabeiro – uma eterna fonte de inspiração. O Sr. Rui sempre será uma inspiração pela generosidade e respeito pelo outro. Ele far-me-á sempre acreditar que é possível ser um líder empático nos dias que correm. O homem, a marca, a empatia e o rigor podem viver todos num só. É possível ter sucesso e ser-se humano no mundo do trabalho. Quando se questionar sobre o que é um CLO, lembre-se dele. Da sua obra. Da sua generosidade. Da sua enorme humanidade. Rui Nabeiro foi um verdadeiro chief love officer”.
Kindology e o modelo Robin Hood
Susana Coerver diz, em jeito de brincadeira, que o modelo de impacto social do projeto é inspirado em Robin Hood: quem pode pagar, vai acabar por ajudar a financiar o acesso tratamentos de doenças mentais de quem não tem essa possibilidade através de duas vias. Primeiro com as consultas. “Até ao momento temos 28 terapeutas/psicólogos e sempre que alguém pode pagar, marca uma consulta e ajuda a financiar consultas quem não pode pagar, criando um movimento de circularidade de saúde mental e, por isso, kindology”. A cada cinco consultas “oferecemos uma para o banco de horas de consultas. Não pedimos a nenhum terapeuta que ofereça o seu trabalho, todos são remunerados e selecionados com critérios clínicos rigorosos pela diretora clínica, Joana Namorado”.
A segunda via está associada ao merchandising. “Acreditamos que todos somos e podemos ser influenciadores de saúde mental, mesmo quando estamos em silêncio, através da nossa linha de produtos que falam sobre saúde mental. A cada duas camisolas vendidas, conseguimos oferecer uma consulta. Como a nossa missão é democratizar o acesso à saúde mental, precisamos de escala e desenvolvemos serviços para empresas, como workshops, formação de primeiros socorros em saúde mental, avaliação de riscos psicossociais e políticas de prevenção desses riscos, além de consultoria de saúde mental em contexto organizacional”.
Este artigo foi publicado na edição 937 do Meios e Publicidade. Para aceder ao artigo na íntegra clique aqui