A conversa hipócrita dos custos da campanha
Artigo de opinião de Luís Paulo Rodrigues, consultor de comunicação e autor do blogue Comunicação Integrada

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Está a ganhar terreno mediático uma narrativa hipócrita sobre os gastos dos candidatos na campanha eleitoral para a Presidência da República portuguesa, cujas eleições se realizam em 24 de Janeiro de 2021. São eleições que se realizam em condições especiais, por causa da pandemia da covid-19 e com um superfavorito: o actual Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, que conta com o apoio do bloco central PS-PSD.
Sabemos que a campanha se realiza em condições limitadas pelo impacto da pandemia que, só por si, fazem diminuir os gastos. Mas, mesmo em condições como aquelas que agora experimentamos, uma campanha eleitoral bem feita, para que os eleitores fiquem bem informados e esclarecidos, não se faz sem recursos humanos, técnicos e financeiros.
Uma campanha eleitoral é eminentemente um exercício multidisciplinar de comunicação e marketing político. Os custos com uma campanha eleitoral são, essencialmente, custos com a comunicação e o marketing de uma candidatura. Nesta campanha presidencial, os candidatos poderão não viajar pelo país em jantares de vitela assada, em arruadas no centro das cidades ou comícios para as televisões, mas precisam de apostar noutras estratégias que também custam dinheiro.
Um bom vídeo, por exemplo, custa dinheiro. Uma boa campanha digital, com produção de conteúdos que chamem a atenção dos eleitores – não confundir com “fake news” e quejandos –, exige a contratação de bons profissionais. Ou seja, tudo custa dinheiro. Quem disser o contrário só pode estar a brincar às campanhas eleitorais ou a mentir.
Talvez valha a pena recordar o que gastaram todos os candidatos na campanha para as últimas eleições presidenciais, realizadas em Janeiro de 2016, segundo os números que foram publicados pelo Tribunal Constitucional.
Nessa campanha, Marcelo Rebelo de Sousa, que também não tinha problemas de falta de notoriedade e foi sempre
apontado como superfavorito, gastou 176 mil euros. Quem mais gastou foi Sampaio da Nóvoa (924,7 mil
euros), seguido por Edgar Silva (581 mil euros), Maria de Belém (541 mil euros), Marisa Matias (303 mil euros) e Henrique Neto (248,7 mil euros).
No lote dos que gastaram menos apareceram os candidatos que também foram menos votados: Paulo
Morais (59,5 mil euros), Cândido Ferreira (28,7 mil euros), Vitorino Silva (8,1 mil euros) e Jorge Sequeira (seis mil euros).
Por isso, foi com estupefação que, há dias, ouvi o Presidente da República e recandidato, Marcelo Rebelo de Sousa, a introduzir na campanha a questão dos gastos, ao ter revelado ao país que é muito poupadinho e só vai gastar uns míseros 25 mil euros. Marcelo Rebelo de Sousa vai gastar menos de metade do que gastou Paulo Morais há cinco anos porque pode dar-se ao luxo de não precisar de fazer campanha. A campanha dele é feita todos os dias na sua acção como Presidente. E os meios de comunicação tradicionais limitam-se a mostrá-lo e a divulgar o que ele faz e o que ele diz. Aliás, Marcelo não precisa de gestão de redes sociais – há cinco anos também não precisou –, muito menos de
“outdoors”, porque ele próprio é uma rede social e um outdoor, com a vantagem de ser ambulante, andando de um lado para o outro. E os debates televisivos que ele quer fazer com todos os candidatos, naquilo que pode ser visto como um exercício de humildade democrática, só o favorecem. Porque a televisão, onde se comporta como um peixe na água, é o campo preferido de Marcelo para a sua campanha.
O candidato João Ferreira, apoiado pelo Partido Comunista, anunciou que vai gastar 450 mil euros na sua campanha. Não é uma exorbitância. Longe disso. Como disse o próprio, e muito acertadamente, ao gastar 450 mil euros na campanha presidencial está a valorizar as eleições. Mesmo assim, gastará bem menos do que Edgar Silva, o candidato apoiado pelo PCP em 2016. No entanto, será bem mais do que os outros candidatos que, ao que parece, vão gastar muito menos, não para tentarem imitar o miserabilismo populista de Marcelo Rebelo de Sousa, mas, provavelmente, por falta de recursos.
De resto, a narrativa sobre os gastos, que Marcelo puxou para a campanha sem pedagogia, só beneficia o atual Presidente, deixando os adversários que gastem acima de 25 mil euros com o rótulo de gastadores.
Artigo de opinião de Luís Paulo Rodrigues, consultor de comunicação e autor do blogue Comunicação Integrada
(www.luispaulorodrigues.com)