Grande consumo: Seis pistas para decifrar 2021
Artigo de opinião de Pedro Pimentel, director-geral da Centromarca
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Se o ano transacto foi um ano atípico e desafiante, 2021 não promete ser menos. Diria mesmo: ultrapassada a surpresa e o ‘mistério’ com que acolhemos a pandemia, temos pela frente não apenas a saturação e a desmotivação que o arrastar indefinido desta crise provoca, como também o enfrentar de um conjunto de consequências que serão ossos duríssimos de roer pela nossa economia e pela nossa sociedade.
O contexto económico antecipa-se muito negativo e os sinais de uma crise económica profunda e demorada não param de se avolumar. E mesmo o sector do grande consumo, aparentemente menos penalizado num primeiro momento, irá sofrer um forte impacto. A memória da crise da troika é ainda muito recente e, não obstante as diferenças de génese e evolução, deixa-nos algumas lições sobre como devemos enfrentar os anos vindouros, a começar pela percepção de que a curva de propagação da crise neste sector tende a ter um desenvolvimento desfasado do que se verifica na generalidade da economia. Isto é, os efeitos depressivos tendem a avolumar-se um pouco mais tarde, mas também a recuperação económica deixará marca apenas alguns trimestres mais tarde. Mas é igualmente notório que as estratégias promocionais que fizeram escola a partir de 2012, dificilmente conseguirão no contexto actual o mesmo efeito de alavancagem de vendas que então provocaram.
Contudo, há novas tendências que irão marcar este novo período e mesmo em tempos de incerteza, assimetria e volatilidade, permito-me deixar meia dúzia de pistas que, espero, poderão ajudar a decifrar 2021 no mundo dos produtos de grande consumo.
1. Alteração das rotinas de compra
O confinamento, o trabalho à distância e a transferência do consumo de fora para dentro de casa, associados à vontade de fazer uma compra alargada e com o menor risco possível, vieram alterar as rotinas dos consumidores, verificando-se uma diluição da compra ao longo da semana (em detrimento da anterior compra predominante ao fim de semana) e a concentração da mesma numa única loja (o chamado one-stop-shopping). Isto implica, para os fabricantes uma ainda maior atenção ao alargamento da distribuição numérica dos seus produtos. No entanto as dificuldades económicas e a recuperação progressiva da mobilidade, podem – mais à frente – fazer reverter parte destas ‘novas’ rotinas, com a redução das cestas e multiplicação das visitas às lojas.
2. Aumento da sensibilidade aos preços
Naturalmente, as dificuldades económicas que uma parte substancial da população sentirá, aumentarão a respectiva sensibilidade aos preços e tenderão a impactar a estratégia comercial dos retalhistas e das marcas. Apesar disso, parece curto apresentar o preço como argumento concorrencial único ou mesmo principal. Haverá, para além disso, que considerar o forte agravamento de preços que se está a verificar nos mercados internacionais de muitas matérias-primas e dos transportes (em especial por via marítima) e perceber que conviverão – e terão de ser geridas no mercado – tendências simultâneas de contornos deflacionistas e inflacionistas.
3. Redesenho do fenómeno promocional
Quando se fala em dificuldades económicas acrescidas, não parece descabido adivinhar que a aposta de retalhistas e marcas possa passar por mais promoções ou, pelo menos, por promoções mais profundas. Contudo, face à vulgarização e massificação das promoções no nosso país, dificilmente se conseguirá um impacto equivalente ao de 2012-2014. O ano em curso parece, pois, mais propício ao desenvolvimento de modelos do chamado ‘every day low price’ em contraposição ao alargamento da dinâmica promocional e tal poderá verificar-se não apenas nas insígnia de discount. Há mesmo, como é sabido, retalhistas ditos convencionais que com as suas promoções permanentes, adoptam o modelo de preço baixo continuado, mas comunicam-no como se de promoções (enquanto oportunidades de compra por redução de preço) se tratasse.
4. Mais espaço para as marcas próprias?
É simples o raciocínio de que com a crise económica surgirá uma redução do rendimento disponível de muitas famílias e a diminuição do respectivo poder de compra e que daqui resultará, como se disse atrás, uma maior sensibilidade do consumidor em relação aos preços, oferecendo oportunidades adicionais aos produtos com preço mais baixo o que, por associação, levará à conclusão de as marcas próprias dos distribuidores tenderão a ver crescer a sua presença e a sua quota global de vendas. No entanto, há duas outras derivadas que deverão ser igualmente consideradas e que poderão ter impacto relevante no maior ou menor espaço que as marcas próprias conquistarão. Desde logo, o peso das vendas de marca própria (em valor) no total de vendas dos retalhistas convencionais ronda os 30-35%, enquanto a percentagem equivalente nas insígnias de discout sobe abruptamente para valores de 70-80%, pelo que o efeito no mercado da eventual transferência de consumidores de um canal para o outro pode ter um impacto muito significativo no equilíbrio entre marcas no mercado. Para além disso, é notória a maior atenção e investimento dos retalhistas convencionais em relação às suas próprias marcas, até por reacção ao trabalho de aproximação ao consumidor que os discouters têm vindo a fazer nos últimos anos.
5. Redefinição de sortidos
O reforço da presença das marcas próprias nas prateleiras do retalho tenderá a diminuir o espaço ocupado pelas marcas dos fabricantes, mas esse não será, por certo, o único fenómeno que terá impacto no redesenho do sortido oferecido pelos distribuidores aos seus consumidores. Parece certo que o chamado consumo consciente e consumo patriótico ganharão tracção pelo que a comunicação e a oferta serão também moldados pelo ‘compre local’ e o ‘consuma português’. Mas 2020 deixou também a descoberto certas fragilidades, a nível operacional, de alguns operadores, pelo que ganham eco os rumores do que se poderá apelidar como descomplexização da operação, ou se quisermos, a redução do sortido de algumas importantes insígnias. Redução do sortido e aumento do peso da marca própria são, como é fácil de adivinhar, más notícias para as marcas de fabricantes e, dentro destas, muito em especial para as segundas e terceiras marcas quer perderão espaço e relevância no mercado.
6. Dinamização do canal online
A fechar, o relevo devido para a dinamização do canal online. O rápido crescimento ocorrido em 2020 – apesar de continuar a representar uma parte marginal do mercado (menos de 4% das vendas totais do grande consumo) – significa um conjunto de novas oportunidades, com compradores mais frequentes, novos compradores, cestas com muito mais categorias de produtos e até o desbravamento de novos territórios a nível etário ou geográfico. Mas a evolução não se verificou apenas do lado da procura. Também do lado da oferta surgem novos players e, por certo, alguns dos players mais relevantes que não têm ainda uma venda online alargada não deixarão de querer ocupar uma parcela deste canal, cuja evolução positiva se manterá, com toda a certeza, nos próximos anos. Mais procura respondida por mais oferta, implicará uma dinamização acelerada do canal online no grande consumo.
Parece, pois, que num ano em que o entorno e contexto apresentam sinais predominantemente negativos, os operadores do sector do grande consumo – fabricantes, marcas e retalhistas – terão desafios duros e difíceis, mas desafios essenciais para conseguirem sobreviver e ultrapassar mais uma crise económica que o nosso país irá inexoravelmente atravessar.
Artigo de opinião de Pedro Pimentel, director-geral da Centromarca