“Se os criadores digitais se tornam marcas, por que não tornar as marcas criadoras de conteúdos?”
Em entrevista exclusiva ao M&P, Inês Ramada Curto e Pedro Filipe-Santos, sócios em Portugal da brasileira Snack Content, partilham sobre como as marcas devem capitalizar o vídeo social, a abordagem a este formato e o percurso que os traz até à empresa, que está a investir €500 mil no mercado nacional
Catarina Nunes
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Um ano e meio depois de trazerem do Brasil o estúdio de marketing digital Snack Content, Inês Ramada Curto e Pedro Filipe-Santos, codiretores executivos da Snack Portugal, falam sobre a empresa que quer transformar marcas em criadores de conteúdos digitais, focando-se na criação de linhas editoriais para marcas nas redes sociais e respetiva materialização em formatos de vídeo social.
Nesta abordagem, a estratégia e a execução são baseadas na Snack CBI (Community Building Intelligence), uma metodologia construída e testada no Brasil desde há 13 anos, que indica não só os temas para conteúdos que mais ressoam nas redes sociais como as melhores opções de criadores, trazendo-os para dentro dos canais das marcas. Isto em vez de se canalizar os investimentos para as plataformas dos influenciadores, permitindo às marcas o aumento das audiências nos seus canais e a construção de comunidades digitais próprias.
O podcast do Prémio Cinco Estrelas e da Betway, e a criação de conteúdos de vídeo ‘always on’ para a Haier são os projetos que a Snack Portugal já tem no ar. Em entrevista exclusiva ao M&P, Inês Ramada Curto e Pedro Filipe-Santos partilham as suas visões sobre como as marcas devem capitalizar o vídeo social, a abordagem da Snack Content a este formato em ascensão e o percurso que os traz até à empresa, que está a investir €500 mil no mercado nacional.
Meios & Publicidade (M&P): Como é que a Snack Content vem do Brasil para Portugal, com vocês como sócios?
Pedro Filipe Santos (PFS): Existia há 10 anos quando foi comprada, há três anos, pela B&Partners, e começou a expansão quando Bazinho Ferraz, fundador e presidente da B&Partners, percebeu que o modelo da Snack podia ser replicado.
O José Maria Abecassis, que nós conhecemos, e o sócio dele estão a ajudar a formatar o negócio da Snack e a levantar capital, para que seja exportável para outros países, como Itália e Estados Unidos, onde já estamos em Milão e Los Angeles. O José Maria disse-lhes que tinha os sócios perfeitos em Portugal, eu e a Inês. (ver caixa com perfis)
M&P: Qual é a atividade do B&Partners e qual é a área da Snack Content?
PFS: É um grupo que trabalha várias áreas de comunicação, ativação de marca, produção de eventos e, desde há três anos, ‘social video’, que é o que a Snack faz. Criamos e produzimos conteúdos de vídeo para redes sociais. Se nos pedirem também fazemos fotos, mas não é o nosso ‘core’.
M&P: Quem são os acionistas da Snack em Portugal?
PFS: Nós os dois, cada um com 15%, e a Snack Brasil com 70%, através do Vítor [Knijnik] e do Nelson [Botega], que são os fundadores que venderam a Snack à B&Partners, mas continuam na empresa.
M&P: Quanto é que vocês investiram?
Inês Ramada Curto (IRC): Estamos a investir com trabalho, não há um investimento financeiro.
M&P: Qual é investimento que a Snack Brasil está a fazer em Portugal?
PFS: Começámos em novembro de 2022, estamos a fazer um ano e meio. Até chegarmos ao break-even, daqui a dois ou três anos, não será difícil estarmos a falar de um investimento de €500 mil.
M&P: No que é que se destaca a proposta de valor da Snack?
IRC: A Snack CBI (Community Builder Intelligence), que já vem formatada do Brasil, e consiste na criação de comunidades digitais através de uma metodologia data driven. Somos uma empresa que não dá um passo sem consultar dados, com softwares que fazem a leitura de todos os canais em todas as redes sociais.
Percebemos quais são as melhores trends, o thumbnail que funciona melhor, o melhor texto, as palavras mais usadas, o vídeo que tem um envolvimento maior e o criador com melhor desempenho, entre outros indicadores.
M&P: Quais são as mais valias desses dados?
IRC: Estes dados dão-nos vários insights, com os quais a nossa equipa de inteligência – tanto de conteúdos como de casting de criadores digitais – já consegue apresentar ao cliente uma proposta que, à partida, será vencedora porque tem os melhores insights dos últimos 30 dias, sete dias ou três anos.
PFS: Temos ferramentas que nos permitem perguntar, por exemplo, quantos vídeos foram publicados em Portugal em todas as redes sociais – ele responde 3 milhões. Se perguntarmos só no Instagram, ele responde 1,5 milhões. Se perguntar quantos destes 1,5 milhões falam em comida, ele responde que são 100 mil.
Se destes 100 mil pedir os 50 mais vistos, ele mostra a lista dos vídeos mais vistos. Se, entre estes mais vistos, perguntar quais são os que falam em pasta italiana, ele apresenta-me 15. Destes 15, pergunto quais é que foram vistos por pessoas entre os 15 e os 25 anos e por aí fora. Conseguimos filtrar completamente tudo.
M&P: É um software exclusivo da Snack?
IRC: Usamos dois ou três programas de dados de Silicon Valley, que é preciso pagar para ter acesso como se tem à GfK ou à Marktest. O programa é um produto básico. O que faz parte da metodologia CBI é a maneira como se usa e interpreta o programa, e se retira dele insights onde assenta a estratégia. O Excel pode ser usado de mil e uma formas, é um canivete suíço, e o CBI é parecido.
PFS: Por exemplo, alguém gosta de vídeos de música e de praia. O que é que uma coisa tem a ver com a outra? É aqui que entramos e conseguimos relacionar uma coisa com a outra, fazendo camadas de interesses sobrepostos, para definir uma comunidade com gostos similares.
Se estamos a trabalhar iogurtes ou pensos higiénicos, a nossa metodologia permite tratar cada marca com a mesma formatação, embora sejam targets e produtos diferentes. A jusante e a montante, nós conseguimos prever o que pode acontecer e medir os resultados. Na Snack. só produzimos o que sabemos que vai funcionar e mexer o algoritmo.
M&P: Como é que conseguem ter essa certeza?
PFS: Somos Google Partner e TikTok Partner e temos acesso a informação privilegiada, que nos permite perceber o que muda a cada mês porque os algoritmos mudam todos os meses.
M&P: As trends também mudam?
PFS: As trends não têm a ver com o algoritmo, são formatos em que os criadores de conteúdos decidem começar a fazer determinada coisa, como os vídeos com desafios. O algoritmo depois pega e vê que há uma coisa nova que está a gerar buzz e dá-lhe um push. O algoritmo não trabalha sozinho, precisa que um criador de conteúdos tenha uma coisa pertinente, original e fresca, como alguns desafios.
M&P: Nos conteúdos de vídeo, há muitas empresas especializadas ou o que há mais é departamentos dentro de agências?
IRC: O pão com manteiga são agências de publicidade. Há agências a fazer conteúdos, mas duvido que sejam baseados em dados. Uma coisa é trabalhar com dados à posteriori, como todas trabalham. Com dados a montante, para traçar uma estratégia em cima disso, não conheço nenhuma empresa em Portugal que o faça.
PFS: O que há é na base do ‘achómetro’, em que o conteúdos falam sobre aquilo que já sabemos, mostram uma série de lugares comuns e o guião é escrito com base nisso. Não fazemos isto. Criamos o diálogo que as pessoas já estão à procura nas redes sociais, a narrativa que as pessoas querem consumir e que temos dados que a comprovam.
Quando um destino fica na moda, não é só porque uma agência de viagens baixou o preço. É porque as pessoas começaram a falar nisso, os criadores de conteúdos foram lá e mostraram o destino. Isto cria o interesse em consumir conteúdos desse destino e as pessoas começam a seguir esses criadores porque todas as semanas têm conteúdos sobre as coisas mais giras, por exemplo nas praias na Tailândia, em Bali ou em Ibiza.
IRC: Com os nossos softwares, conseguimos ajustar facilmente o conteúdo, que está sempre a mudar. Quando se faz uma campanha em media tradicional, já não se consegue mudar.
PFS: O melhor exemplo que posso dar é a diferença entre o petroleiro e o semi-rígido, que somos nós. O petroleiro, que é um canal de televisão, lança uma novela e se estiver a correr mal, só começa a ser corrigida depois de terem gravado 90 episódios. O petroleiro demora várias milhas até conseguir mudar o rumo, nós não.
M&P: Qual foi a primeira marca que trabalharam?
IRC: A Wells com o podcast da enfermeira Carmen, mas ainda não existia a Snack Portugal nem participámos no projeto. A Snack Brasil subcontratou uma produtora em Portugal. Connosco, o primeiro projeto foi o podcast do Prémio Cinco Estrelas, que fazemos ainda hoje, com o À Descoberta das Cinco Estrelas.
Criámos também o canal de YouTube deles porque, à semelhança de qualquer outro prémio, só são falados quando há prémios, uma vez por ano. Com o ‘always on’ de comunicação com um podcast por semana, 52 episódios por ano, conseguimos falar da marca o ano inteiro.
PFS: Organicamente, em um ano, conseguimos 25 mil subscritores no canal do YouTube do Cinco Estrelas e queremos chegar aos 100 mil até o final do ano, também organicamente.
M&P: Qual é o formato?
IRC: Há uma apresentadora, a Sofia de Castro Fernandes, que entrevista diretores de marketing das marcas premiadas, sobre temas que os nossos dados mostraram que são tendência e que podem ser relevantes. Não é um programa de autoelogio, com a marca a dizer que ganhou o prémio porque é a melhor.
Pode falar, por exemplo, sobre retenção de talento nas empresas ou sobre a segurança que devemos ter com os meios digitais de pagamento. Fazemos tudo: a estratégia, a ideia, o formato, os guiões, os cenários, a imagem, os cortes de edição e, quando existem media pagos, também fazemos plano de meios na parte digital.
M&P: O vosso software também dá para fazer plano de meios?
PFS: Como somos parceiros da Google e do TikTok, os nossos dados permitem-nos perceber onde é que deve ser promovido e reforçado o algoritmo, para atingir determinado target e objetivo. Nem tudo passa por deitar um balde de dinheiro, passa muito pelos hashtags que se usam, pelos metadados, pela hora a que é feita a publicação e pelo corte que se escolhe.
IRC: Não se investe em 40 minutos de podcast, investe-se num corte que tem 30 segundos e vai-se investindo aos poucos.
PFS: Cria-se uma comunidade com os cortes, não é com o episódio principal inteiro. Os algoritmos favorecem a permanência em cada conteúdo. Se um vídeo durar 15 segundos e for visto durante 14 segundos, a seguir o algoritmo vai dar outro exatamente parecido e assim sucessivamente.
M&P: Que outros clientes ou projetos têm?
PFS: Fazemos o podcast patrocinado pela Betway, o Um Para Um com o Pedro Pinto, que é publicist de desportistas e faz entrevistas a atletas portugueses que trabalham fora e que se distinguem nas suas áreas.
Estamos a fazer consultoria para uma marca multinacional, que não podemos referir ainda porque o contrato não está assinado, que já produz conteúdos. Estamos a fazer-lhe um plano estratégico para otimizar a maneira como os conteúdos são produzidos.
M&P: Além destes podcasts, têm mais algum numa base regular?
PFS: Neste momento não. Estamos a fazer a produção de conteúdos para a Haier, com pequenos episódios sobre arrumação de frigoríficos, um ‘always on’ de seis meses.
M&P: O ‘always on’, na prática, significa o que é?
PFS: Diria que é as marcas terem um canal temático próprio, com os conteúdos que querem transmitir, mas de uma maneira que seja conteúdo de entretenimento e não publicidade.
IRC: O que as marcas fazem muitas vezes é ter o que chamamos de Depósitube, DepósiTok e DepósiGram, que são formas de depositar campanhas em redes sociais. Mas esses conteúdos não são nativos dessas redes sociais.
PFS: A conta de YouTube do Meo, por exemplo, tem o discurso do presidente da Meo, a campanha de Natal, o making-of do Meo Sudoeste, a campanha do Regresso às Aulas e uma ativação de marca.
Depois, estão dois meses sem publicar e, de repente, publicam três dias seguidos. Além de isto não ser o que o algoritmo quer e precisa, também não é aquilo que as pessoas que seguem as redes sociais querem. As pessoas querem fidelizar-se, querem consumir conteúdos.
M&P: Quais são os valores de faturação da Snack e quanto é que cobram aos clientes?
IRC: A Snack global, que está presente em São Paulo, Lisboa, Milão e Los Angeles, faturou €15 milhões em 2023, e cobra em média cerca de €50 mil por marca, por 12 meses de um ‘always on’ de vídeos, com estratégia, inteligência de dados, criatividade e produção. Temos empresas em que, para um ano de ligação com a Snack, cobramos mais de €100 mil como temos outras que cobramos €20 mil.
Depende se querem chave na mão de vídeos para o ano inteiro, com criatividade, estratégia, produção, gravação, inteligência de dados e de casting, análise de dados e acompanhamento estratégico, ou se querem uma parcela do menu da Snack.
M&P: Trabalham clientes que a Snack tem no Brasil ou em outras geografias?
IRC: Ainda não estamos a fazer essa ponte. No Brasil, por exemplo, trabalhamos a Boticário, que já comunica como um criador de conteúdos digitais, em linha com a nossa máxima ‘se os criadores viram marcas, porque é que a marca não pode virar criadora e começar a comunicar exatamente como eles?’.
A expressão ‘always on’ vem da ideia de comunicar com uma grelha de conteúdos, como faz um canal de televisão, habituando a comunidade a esses conteúdos.
M&P: Qual é a estratégia que seguem no casting de criadores?
IRC: Quando fechamos um ‘always-on’ de conteúdos para uma marca, é preciso fazer o casting para não se apostar numa influenciadora com um perfil como o da Madalena Abecassis, e fazer crescer a comunidade dela, mas ir buscar criadores pequenos, médios ou grandes, para os trazer para a marca. É como construir o elenco dos Morangos com Açúcar, em que o ‘squad’ serve a comunicação da marca.
PFS: Os Morangos com Açúcar tiveram sete temporadas e sete castings diferentes. Ou seja, o que é mais importante é a marca, o conceito e a linha editorial. O que propomos é criar uma linha editorial para as marcas, com base em dados, com várias temporadas.
Não interessa qual é o casting, o que é certo é que a marca mantém-se, mesmo que no primeiro ano seja o Pedro Teixeira e a Rita Pereira, e no ano a seguir sejam outros quaisquer.
M&P: Quais são os critérios de escolha nesse casting?
IRC: A nossa inteligência de dados vai buscar a pessoa certa para fazer o conteúdo para a marca. Isto é feito no Brasil, onde temos 30 pessoas só a trabalhar inteligência de dados.
M&P: Não há espaço para um criador que não entrega os melhores resultados, mas que tenha uma dimensão pessoal que justifique a escolha e que os brasileiros desconhecem?
PFS: Isso é cair no erro do ‘achómetro’.
IRC: É o que fazíamos antes, sem dados. É achar que determinada pessoa comunica bem um conteúdo. No entanto, quando é preciso alguém que fale sobre ténis, vai-se buscar alguém que é ex-jogador, árbitro de ténis ou treinador.
PFS: Há um filme em que o Brad Pitt é treinador de uma equipa de beisebol e vai buscar só jogadores de segunda e terceira linha, porque os dados estatísticos diziam que em 20 jogos, a probabilidade de ele marcar com esses jogadores era superior à média, mesmo que os adversários tivessem o Cristiano Ronaldo.
Se não queremos ou não temos dinheiro para ter uma Madalena Abecassis, vamos encontrar as ‘rising stars’ que possam ser uma Madalena Abecassis e que os dados nos apresentaram. Depois, trabalhamos com o cliente e, aí sim, podemos ponderar uma pessoa com uma personalidade que se encaixa melhor com a marca, mas os dados já nos mostraram cinco pessoas.
M&P: Na Haier vão trabalhar com que criador?
IRC: Com a Rita Carvalho de Matos, que é a nossa Marie Kondo, porque a Haier quis fazer conteúdos sobre organização de frigoríficos. Podíamos ter ido buscar a Cristina Ferreira ou a Rita Pereira, mas nenhuma delas tem a ver com organização nem com frigoríficos. A Rita Carvalho de Matos tem a ver com organização e nunca fez conteúdos para frigoríficos nem cozinhas.
PFS: Em Portugal, aliás, estamos a inovar. Nunca ninguém mostrou como é que se arruma uma cozinha, ao contrário da arrumação de closet, que é um tema que toda a gente faz.
M&P: A Rita Carvalho de Matos não é conhecida?
IRC: Há muitas pessoas que estão fora do radar das marcas, como estão fora do conhecimento geral, mas os nossos softwares apanham essas pessoas. Em Portugal, há cerca de 63,5 mil criadores e, dentro deste painel, os nossos softwares pesquisam e dão-nos os criadores para comunicar frigoríficos e organização, por exemplo, e podem aparecer 10, 50, 300.
O que o programa dá, e daí ser indiferente estar no Brasil ou em Singapura, é as melhores pessoas que comunicam todos os temas e áreas, com os filtros que quisermos, como abaixo de X anos ou abaixo de 100 mil subscritores, etc.
PFS: É encontrar territórios com comunidades de conversa, por exemplo sobre beleza, que nem a L’Oréal nem a Garnier ocupam e que descobrimos todos os dias. Ou criamos comunidades possíveis, que as marcas não estão a ocupar, esta é a beleza dos dados.
M&P: Esses criadores têm de trabalhar em exclusivo para essas marcas?
PFS: Não, desde que não seja no mesmo território. Um Bruno Nogueira, por exemplo, pode estar a apresentar um programa num canal e a fazer shows de stand-up. Mas não pode fazer um programa semelhante num canal da concorrência.
M&P: Qual é a razão da denominação Snack Content?
PFS: Antigamente, estávamos três horas a ver um programa de televisão, como o Festival da Canção ou os Jogos Sem Fronteiras. Consumíamos conteúdos como se fosse um cozido à portuguesa. Neste momento, as pessoas consomem conteúdos curtos, em snacks. Quando estamos à espera do Uber, temos cinco minutos e vemos três vídeos no TikTok.
Ou estamos à espera para uma consulta e vemos dois vídeos no Instagram. Consumimos os conteúdos à nossa medida, em qualquer lugar, como e onde queremos. Nas últimas eleições legislativas, houve 300 horas de comentários sobre debates e entrevistas de 20 minutos…
IRC: E o ‘short’ ganhou.
PFS: Depois, tivemos o short do short, que são os cortes dos comentários sobre o debate, no YouTube. O ‘always on’ é ter um canal que me vai alimentando com estes snacks de conteúdos. Isto em todas as áreas, porque ninguém vai a uma banca de jornais e quer uma revista sobre desporto. Quer uma revista sobre ténis, surf, motociclismo, etc.
IRC: O negócio digital aproxima-se muito do negócio das bancas, da imprensa especializada, como o M&P.
PFS: Trabalhamos as marcas como uma grelha horizontal, com o conteúdo principal e conteúdos ‘hub’, ‘hero’ e ‘help’.
M&P: Quais são as diferenças entre esses conteúdos?
IRC: Os ‘hero’ têm uma produção mais elevada e podem ser uma série ou um documentário, que têm robustez e são mais pontuais. Os ‘hub’ e ‘help’ são os que fazem o colchão do canal, como dicas, listas, tutoriais, pergunta e resposta, que são formatos digitais típicos.
M&P: Qual é o foco principal da Snack Content?
PFS: Criar comunidades para as marcas, aumentando a sua própria audiência em vez de a marca estar a pôr um balde de dinheiro na Madalena Abecassis, na Tripeirinha, n’A Pipoca Mais Doce ou em outros quaisquer. Em vez de gastar dinheiro a aumentar a comunidade desses influenciadores, o investimento é feito no próprio canal das marcas.
M&P: Como é que a Snack aparece no Brasil?
PFS: Antes da Snack, o Vítor e o Nelson tinham a Rede Snack, um agregador de canais no YouTube de criadores que tinham comunidades que geravam dinheiro com as marcas que se queriam associar a esses canais. Eles decidiram virar o jogo para serem as marcas a terem os seus próprios canais e falaram com os criadores para eles manterem os canais, mas passarem a ser a cara de marcas e venderem esse serviço.
Antes disto, o Vítor era vice-presidente de criação da Young&Rubicam, agora VML, e o Nelson era diretor de criação e começaram a perceber que o conteúdo era rei. A publicidade, agora, aliás, está cada vez mais virada para o conteúdo e o que ganha Ouro em Cannes são casos de responsabilidade social, com três minutos.
M&P: A preferência por esse tipo de campanhas tem a ver com os próprios consumidores, as pessoas, estarem à procura de emoções?
PFS: Sim, a procura de narrativas. Agora não se vendem carros, vendem-se como marcas que ajudam as pessoas a serem mais felizes.
IRC: Uma das tendências da publicidade é exatamente impactar emoções e inspirar, para se tornar ligeiramente conteúdo.
PFS: É uma coisa das novas gerações, que entendem que as marcas têm de devolver à sociedade aquilo que ganham. É uma maneira de combater a imagem capitalista que as marcas têm. Os millennials são muito de esquerda e socialmente ativos, e as marcas perceberam que não podem só estar a vender. Têm de mostrar que partilham as dores e têm empatia com os seus problemas e ansiedades.
M&P: Para quem comunica, faz publicidade e trabalha marcas, isso torna o trabalho mais difícil ou mais fácil?
IRC: Mais fácil.
PFS: O nosso trabalho na Snack ficou mais fácil. O Marcelo Lourenço, diretor criativo da Coming Soon, escreveu uma crónica sobre ter estado num júri de prémios de criatividade, em que apareceu uma campanha que ele achou brilhante e estava toda a gente a votar nela. De repente, alguém disse “epá, não vamos votar nessa que isso é apenas publicidade”.
E ele disse, “onde é que chegámos? Já tenho saudades das campanhas em que queremos vender o produto e não uma ONG”. Estamos no campeonato da publicidade, não estamos no campeonato da responsabilidade social, nem as agências são ONG.
IRC: Às vezes, os conteúdos tornam-se publicidade por causa desse viés. Se não lhe for dada a dimensão emocional, informativa e intuitiva, que estimule os sentidos, fica só como publicidade.
PFS: Outro aspeto é que o YouTube, ou outra rede social, não distingue se é um criador a fazer os conteúdos ou se é uma marca. Para o algoritmo, ,é indiferente se é uma marca ou uma pessoa quem cria, o que lhe interessa é o conteúdo.
M&P: O utilizador faz essa distinção?
IRC: Distingue. Quer bons conteúdos, independentemente de serem de uma marca ou de um criador.
PFS: Por isso, a importância da nossa metodologia de dados, que nos diz o que o espetador quer ver.
M&P: Em termos da vossa estrutura física, os estúdios e os equipamentos audiovisuais, como é que chegaram a estas instalações [os antigos estúdios da Valentim de Carvalho, na Cruz Quebrada]?
PFS: Desde a pandemia, em 2020, já estava aqui com a Briskman, que se mantém.
IRC: Trabalhei há 15 anos na Valentim de Carvalho, no piso 6. Este edifício não era um cowork. Tinha a Valentim de Carvalho e a LMK Vídeo.
M&P: Quais são as características deste espaço que encaixam nas vossas necessidades?
IRC: Uma empresa como a Snack, que está em crescimento, precisa de espaço. Em Lisboa, é difícil, o espaço é muito limitado e é difícil encontrar um sítio onde se consiga expandir para mais 100 ou 200 metros quadrados de área.
PFS: Aqui, se tivermos um projeto especial, conseguimos arranjar uma sala em que podemos pôr seis pessoas, dois guionistas, dois editores e dois gestores de redes sociais, durante três meses a trabalhar. Começámos com 50 metros quadrados e agora já ocupamos 300 metros quadrados, isto no espaço de um ano.
IRC: Tivemos mais clientes e trabalhos, aos quais precisámos de dar resposta.
PFS: No filme Campo de Sonhos, o personagem do Kevin Costner é um cultivador de milho que ouve uma voz a dizer-lhe para construir um campo de beisebol. A voz diz-lhe: ‘if you build it, he will come’. Se ele construísse um campo de beisebol, o Mickey Mantle, uma das vedetas do beisebol, iria aparecer.
Ele constrói, e toda a gente na terra chama-lhe maluco, mas há um dia em que os fantasmas dos melhores jogadores de beisebol aparecem e jogam, e ele e a família são os únicos espetadores do jogo. Na minha vida, usei sempre essa frase e nunca me dei mal. Se construir o campo, os jogadores aparecem. Se estiver preparado para ter trabalho, o trabalho aparece.
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