Inês Ayer – “A nossa perspetiva é moldada por um lugar que une tradição e modernidade”
Para Inês Ayer (na foto), designer sénior da Pentagram, os desafios de trabalhar em Nova Iorque são a constante necessidade de reinvenção e a pressão para se destacar, revela na rubrica do M&P De Portugal Para o Mundo, dedicada a profissionais expatriados

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“Trabalhar nos Estados Unidos é como correr numa floresta vibrante e imprevisível: o ritmo é frenético, as decisões são instantâneas e cada curva representa uma nova oportunidade ou desafio”, refere ao M&P Inês Ayer, designer sénior da Pentagram New York, onde está há um ano e meio, após três anos a trabalhar neste país.
Entrevistada para a rubrica ‘De Portugal para o Mundo’, a designer considera, contudo, que “a pressão e a velocidade com que as decisões têm de ser tomadas aqui forçam-me a crescer, a confiar ainda mais no meu instinto criativo e a ser mais ágil na procura de soluções inovadoras”.
“Trabalhar em Nova Iorque, uma cidade com tantas culturas e histórias diferentes, ensinou-me a criar de forma a ressoar com uma audiência global, sem perder a sensibilidade local”, explica Inês Ayer.
Trabalhar fora de Portugal era uma ambição ou houve uma circunstância a ditar a sua saída?
Sempre tive o desejo de explorar contextos internacionais profissionalmente, mas a saída ocorreu de forma natural. Cada passo no meu percurso foi guiado pela vontade de aprender, crescer e contribuir de forma mais significativa através do design. Foi uma consequência natural de querer expandir os horizontes criativos e profissionais.
Quais são as diferenças entre trabalhar em Portugal e nos Estados Unidos?
Trabalhar em Portugal é como cultivar um jardim: há tempo para observar, planear e nutrir as ideias com cuidado, num ambiente onde as relações florescem de forma natural e autêntica. Nos Estados Unidos, é mais como correr numa floresta vibrante e imprevisível: o ritmo é frenético, as decisões são instantâneas e cada curva representa uma nova oportunidade ou desafio.
Em Portugal, há uma valorização da profundidade e do detalhe, enquanto que nos Estados Unidos a inovação e a audácia de arriscar estão sempre no centro. Ambos os mundos têm a sua magia: um ensina a escutar a essência das ideias, o outro a transformar a realidade a uma velocidade vertiginosa. O segredo é aplicar a alma portuguesa ao ritmo americano e criar algo verdadeiramente único.
Quais são as mais-valias e os obstáculos que o ser português tem no seu trabalho?
Significa carregar uma bagagem rica em história, resiliência e uma intuição quase poética. As nossas mais-valias começam na criatividade, que surge de uma cultura onde o improviso e a solução criativa fazem parte do quotidiano.
Somos bons ouvintes, excelentes contadores de histórias e temos a capacidade única de encontrar beleza até nos desafios mais difíceis. A nossa perspetiva é moldada por um lugar que une tradição e modernidade, proporcionando-nos uma visão equilibrada entre o passado e o futuro.

“O design aqui [nos Estados Unidos] não é apenas uma ferramenta criativa, mas uma linguagem fundamental para a construção de marcas e experiências com impacto global”, diz Inês Ayer
Os obstáculos surgem da nossa tendência para a modéstia ou cautela excessivas. Num cenário internacional competitivo, por vezes, demoramos a acreditar no nosso próprio valor. No entanto, vejo isso mais como uma força em evolução do que uma fraqueza.
É um lembrete para abraçarmos com orgulho aquilo que nos torna únicos e projetarmos o nosso talento com confiança no palco global. Ser português é carregar no coração a força de quem sempre enfrentou o desconhecido com coragem.
Quais são as particularidades do mercado de design nos Estados Unidos?
O mercado norte-americano é vasto, competitivo e em constante mutação, oferecendo um oceano de possibilidades. O design é encarado como uma ferramenta estratégica fundamental e não apenas como um elemento estético.
Existe uma cultura profundamente enraizada de valorização da inovação, onde a falha é vista como parte do processo criativo e o risco é celebrado como combustível para o sucesso. Talvez a maior diferença seja a escala. Nos Estados Unidos, os projetos frequentemente têm impacto global e exigem uma mentalidade de grande alcance, na qual é necessário pensar para milhões.
O ritmo é intenso, as expetativas são elevadas e o nível de especialização das equipas é impressionante. Cada designer é, muitas vezes, um especialista numa área muito específica, mas há também uma colaboração contínua entre disciplinas.
No mercado português, há uma proximidade e uma intimidade no processo criativo, que se perdem num cenário tão grande. Oferece mais espaço para a experimentação artesanal e uma abordagem mais pessoal aos projetos, o que é refrescante num mundo tão acelerado.
Nos Estados Unidos, o desafio está na constante necessidade de reinvenção e na pressão de se destacar, num mercado onde a concorrência é feroz. Mas é precisamente nesse ambiente que o pensamento estratégico, aliado a um toque português de sensibilidade e humanismo, pode criar uma marca memorável. É um equilíbrio fascinante entre a grandiosidade e a profundidade emocional, que define o design.
Que funções desempenha e que projetos tem em mãos?
Sou designer sénior na equipa de Eddie Opara na Pentagram, onde trabalho em projetos de identidade visual, ‘branding’, design digital e estratégias criativas. Recentemente, trabalhei em projetos que vão desde startups tecnológicas a marcas globais, passando por iniciativas culturais.
Paralelamente, continuo a liderar o Studio Ayer e estou envolvida em projetos sociais e de inovação, como o Aliquoti, focado na saúde materna, e o Global Shapers Lisbon Hub, iniciativa do Fórum Económico Mundial.
Qual foi a experiência profissional nos Estados Unidos que mais a marcou?
A oportunidade de trabalhar em projetos de grande escala na Pentagram, uma das agências de design mais icónicas do mundo. O que me marcou foi a forma como o design aqui não é apenas uma ferramenta criativa, mas uma linguagem estratégica fundamental para a construção de marcas e experiências com impacto global.
Trabalhar com uma equipa em projetos que alcançam milhões de pessoas em todo o mundo é transformador. Cada desafio exige não só criatividade, mas também uma compreensão profunda do comportamento humano e das tendências culturais globais. A pressão e a velocidade a que as decisões aqui têm de ser tomadas forçam-me a crescer, a confiar ainda mais no meu instinto criativo e a ser mais ágil na procura de soluções inovadoras.

Trabalhar em Nova Iorque tem dado a Inês Ayer a possibilidade de criar designs para uma audiência global sem perder a sensibilidade local
Além do aspeto técnico e criativo, o que mais me marcou foi a forma como a diversidade de perspetivas enriquece cada projeto. Trabalhar em Nova Iorque, uma cidade com tantas culturas e histórias diferentes, ensinou-me a criar de forma a ressoar com uma audiência global, sem perder a sensibilidade local.
É uma experiência que me desafia diariamente a repensar o papel do design no mundo e a compreender que, para criar algo verdadeiramente transformador, é necessário abraçar tanto a complexidade como a simplicidade.
Em termos profissionais, do que é que tem mais saudades, em relação ao mercado português?
Da proximidade e da autenticidade das relações de trabalho. Em Portugal, existe uma ligação mais pessoal e humana entre equipas e clientes, o que cria um ambiente de trabalho colaborativo.
Pensa regressar a Portugal?
Regressar está sempre presente como possibilidade, mas não como certeza imediata. O meu percurso profissional e pessoal tem sido uma jornada de constante troca entre mundos, entre a energia vibrante de Nova Iorque e as raízes profundas que tenho em Portugal.
Vejo-me como alguém que, em vez de se fixar num único lugar, prefere criar pontes e contribuir simultaneamente para contextos globais e locais. Portugal será sempre o meu porto seguro, o lugar que me dá perspetiva e equilíbrio.
No entanto, a minha missão não é simplesmente regressar fisicamente, mas sim continuar a fortalecer os laços com o país e contribuir para o seu crescimento, através dos projetos que desenvolvo e das conexões que crio.
O que me move é a possibilidade de criar impacto onde quer que esteja fisicamente, seja em Portugal, na América ou noutros lugares, e levar comigo a experiência global que tenho acumulado. Não se trata de ‘quando’, mas de ‘como’ e ‘porquê’ — e o ‘como’ e o ‘porquê’, para mim, sempre foram sobre a criação de um legado que transcenda fronteiras.