Há vida para além do mupi e do outdoor
No léxico publicitário habituámo-nos a identificar a palavra outdoor com os painéis exteriores de grandes dimensões. Mas na tradução literal outdoor significa “fora de portas”. E hoje, mais do que nunca, quando se fala de publicidade outdoor há muita mais vida para além do tradicional… outdoor
Pedro Durães
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Há um paradoxo evidente na publicidade. Por todo o mundo, festivais multiplicam-se em categorias cada vez mais numerosas, cada ano traz uma nova categoria. Os trabalhos, no fundo, são os mesmos, acabam é por ser inscritos em mais categorias. Isto porque as linhas que separam cada categoria esbatem-se a olhos vistos e hoje o que é digital pode ser activação e o que é activação pode ser mobile e o que é mobile pode ser outra coisa qualquer. O sector da publicidade exterior é profícuo neste tipo de evolução. Ao longo dos últimos anos tornou-se digital, tornou-se activação, tornou-se tão abrangente que, talvez por isso, Outdoor foi este ano a categoria que mais cresceu em número de inscrições em Cannes. Sendo um dos quatro vértices dos apelidados meios tradicionais, numa altura em que são os meios digitais a crescer, estes dados dão provas da reinvenção do sector. Prova disso é o facto de o único trabalho português a chegar à shortlist da categoria não ser um outdoor tradicional, nem sequer um mupi digital ou interactivo, mas sim uma loja, e não ser assinado por uma empresa de publicidade exterior pura mas sim por uma agência que nasceu com guerrilha no nome e hoje se dedica às áreas de activação de marca, a Torke+CC com o projecto The Walking Dead Blood Store, criado para a Fox Portugal. O projecto consistiu numa loja temporária de doação de sangue para o Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST) que se localizava no centro comercial Dolce Vita Tejo e onde as pessoas podiam ver a sua dádiva de sangue trocada por produtos da série exibida pelo canal Fox. Não sendo um projecto digital, a interactividade está lá, elementos que Rodrigo Rodrigues, director-geral da Torke+CC Lisboa considera serem fulcrais hoje em dia. “Acima de tudo, como em todos os meios, notamos que a tecnologia e a interactividade estão cada vez mais presentes. Seja porque as marcas procuram inovação, seja porque depois aquele suporte ou solução vai ser partilhado no mundo virtual, o que interessa é manter uma grande tendência, a da originalidade e criatividade”, afirma. Nas palavras deste profissional, hoje “o digital é o grande exponenciador. Podemos ter um outdoor que tem interacção com uma dezena de pessoas mas que se filmarmos bem um case pode ter dezenas de milhar de views. E isso é o digital que traz”, resume, sublinhando esta capacidade que o outdoor tem de não se esgotar na acção realizada no exterior, cujo efeito pode ser amplificado no universo digital.
Opinião partilhada por Vasco Perestrelo, CEO da MOP – Multmedia Outdoor Portugal, que considera que “o outdoor sempre foi um meio muito atractivo para potenciar a criatividade, mas com o digital esse potencial criativo tornou-se gigantesco pois o meio deixa de ser estático e passivo, e abre-se para um mundo de possibilidades de interacção com o consumidor”. Motivo por que, lembra, “a MOP foi pioneira nessa área ao arrancar com uma área de activação em 2008, a MOP Act. Desde aí fizemos grandes acções como as Iluminações de Natal em Lisboa, o Eurobest e a PT Bluestation mas mais importante que isto foi passarmos cada vez mais a integrar a activação na nossa oferta do dia-a-dia. Hoje uma em cada quatro campanhas de out-of-home que vendemos tem também uma acção de activação agregada”, adianta.
Para Anita Martins, directora-geral da JCDecaux, o player com maior quota de mercado na publicidade exterior no mercado português e que está em processo de aquisição da Cemusa (ver caixa), os números da categoria Outdoor em Cannes “provam que este sector permite criar e contactar com o consumidor de uma forma diferente e surpreendente. O outdoor permite um cruzamento multiplataformas de uma forma muito eficaz, temos como exemplo a activação que a Samsung fez no Chiado com o Galaxy há dois anos ou mais recentemente a acção que a Pepsi fez num abrigo em Londres, que teve um spread-out enorme em todo o mundo através da internet”, exemplifica, tocando o mesmo ponto focado por Rodrigo Rodrigues. Na opinião da profissional, “o sector está a transformar-se e está a caminhar para soluções mais abrangentes, porém a evolução da integração de todos estes elementos na comunicação de uma marca depende sempre da evolução do próprio mercado da publicidade”.
O peso do digital no outdoor
Não parece haver grandes dúvidas entre os players do sector da publicidade exterior de que a integração com o digital é uma das tendências, senão mesmo a grade tendência, neste área da comunicação publicitária. “A importância do digital está relacionada com as novas tendências de mercado e por isso em todo o mundo esta é a área de crescimento”, corrobora Anita Martins. Mas qual o peso real do digital no sector? É a própria directora-geral da JCDecaux Portugal que ressalva que “apesar deste crescimento elevado, que no ano passado ultrapassou os 30 por cento, o seu peso na facturação total de momento não ultrapassa os quatro por cento em Portugal e oito por cento na Europa”, revela, sublinhando, no entanto, que “esta é sem dúvida a tendência do sector para os próximos anos, principalmente nos grandes formatos como se assiste em países mais desenvolvidos como no Reino Unido e EUA”. Por seu lado, Vasco Perestrelo, CEO da MOP, lembra que “como em todos os meios, a ‘febre’ do digital também chegou ao out-of-home, embora neste sector, e devido ao ainda custo bastante elevado dos suportes digitais, penso que ainda não se estabeleceu qual o modelo a seguir. Mas penso que a médio prazo, e também com o decréscimo tendencial do custo do digital, o peso relativo do será cada vez maior no out-of-home pelas oportunidades que traz consigo”. Paulo Colaço, director da APS Media, por seu lado, adianta que “o digital no caso da APS Media representa em termos de faces cerca de 35 por cento com tendência para aumentar pois continuamos a aumentar a rede, sendo que no final do ano será de cerca de 40 por cento”. “Para nós o futuro é digital, entendemos que a relação qualidade/preço/dinâmica que este tipo de suporte apresenta é incontestavelmente superior a qualquer um dos outros tipos de suportes. Cremos que o futuro nos vai dar razão e na nossa área a concorrência vai ter de nos ‘copiar’”, afirma o responsável.
Já Rodrigo Rodrigues, director da Torke+CC, não se mostra interessado em perceber o peso do digital. Isto porque, explica, “para nós o digital já não se separa do real e vice-versa. E apesar de as marcas continuarem a fazê-lo numa lógica de cabimentação e budgets vão sempre estar desalinhadas com quem mais interessa: as pessoas”. “As pessoas já misturam o digital e o real nas suas vidas, fazem check-ins virtuais quando estão fisicamente num local ou comentam algo sobre o chefe numa rede social e são despedidas na vida real”, exemplifica, frisando que “a relação entre digital e a publicidade exterior é novamente associada à necessidade de integração e de escolha adequada dos meios para a história a contar”.
E o segmento outdoor mais tradicional?
Para lá do crescimento nas soluções digitais, como está o retrato da publicidade exterior mais tradicional? “A publicidade exterior em Portugal sente presentemente fortes indicadores de retoma, associados ao reinvestimento dos anunciantes no sector”, afiança Ricardo Bastos, director-geral da DreamMedia, adiantando que “o volume de negócios cresceu bastantes pontos desde o mês de Abril, atingindo resultados muito interessantes”. “O primeiro semestre foi positivo, contudo sentimos um forte impulso comercial desde Abril, que gerou por si um maior investimento da DreamMedia em novas concessões e posições outdoor”, reforça. No mesmo sentido, Paulo Colaço, da APS Media, diz acreditar “que o mercado começa a apresentar sinais de retoma depois destes últimos tempos de ‘vacas magras’. Esta ligeira inversão também tem como alavanca as diversas acções que têm surgido, tais como a final da Champions em Lisboa, o Rock in Rio, o Mundial, o lançamento de novas marcas, etc.”. Na opinião do profissional, “este mercado tem tido um valor muito constante ao longo dos últimos anos, sendo adaptado à economia, ou seja, se descontarmos o abrandamento da economia, o valor do mercado mantem-se na mesma proporção. Em relação à APS Media, o primeiro semestre manteve-se em relação ao período homólogo, mas em compensação a procura e as reservas para o próximo semestre estão com bastante dinâmica, o que antevê um semestre superior ao do ano anterior”, revela.
A retoma é também vislumbrada por Vasco Perestrelo. Nas palavras do CEO da MOP, “depois da forte crise que todo o sector publicitário atravessou nos últimos anos, sentimos que as coisas estão a mudar”. “Este mercado está hoje em total correlação com o que se passa na nossa economia em termos macro e, de facto, o fim do período de assistência da troika e consequentemente a carga de optimismo de recuperação económico que tal implica, já começa a ter consequências no sector e em particular no outdoor”, afirma, acrescentando que “neste contexto, o futuro do out-of-home tem cada vez mais potencial”. “O facto de a audiência estar mais ‘defendida’ da fragmentação que fenómenos como a internet e o digital originou na maioria dos meios tradicionais torna este meio cada vez mais valioso em relação aos outros”, considera.
Na sua análise do sector, Anita Martins, directora-geral da JCDecaux Portugal, lembra que “nos últimos anos todos os meios sofreram grandes variações nos investimentos devido não apenas à crise financeira mas principalmente à entrada dos meios digitais, que tiveram como consequência uma revolução no consumo dos meios por parte do consumidor”. “Hoje em dia, os consumidores têm acesso à informação em qualquer lugar e a portabilidade da informação e do seu consumo acentuou ainda mais a ausência de barreiras entre os meios, o consumidor pode aceder a programas de rádio, televisão, notícias ou mesmo publicidade em qualquer momento e lugar”, contextualiza, para referir que “esta revolução digital obrigou todos os sectores, que dependem dos investimentos publicitários, a fazerem uma reinvenção na sua oferta comercial por forma a oferecer aos anunciantes contactos com os consumidores de uma forma mais rápida, eficaz e económica. Por isso, a digitalização do outdoor, a segmentação, interactividade e mobilidade são elementos chave na reinvenção da área da publicidade exterior”. Nesse sentido, aponta, “o peso da publicidade exterior no total do investimento publicitário tem sofrido um decréscimo nos últimos anos devido ao crescimento do investimento nos canais cabo e no digital”. “Para nós, o primeiro semestre apresenta um crescimento superior a 2013, no entanto não podemos afirmar que este crescimento, que se verifica, aliás, em todo o sector da publicidade, seja claramente uma recuperação, pelos seguintes motivos: o primeiro semestre do ano anterior foi muito baixo e a Liga dos Campeões, o Mundial e a comunicação da marca NOS contribuíram em muito para a recuperação deste ano”, salienta.
E como se antevê este ano de 2014? Quais as perspectivas? “É o ano zero, onde será possível iniciar o processo de viragem no sector, quer em termos de investimentos quer em termos de inovação. Com a consciência de que esta tem que ser sempre calma e ponderada por forma a permitir ter uma oferta adequada às necessidades e dimensões do mercado”, aponta Anita Martins. Por seu lado, Paulo Colaço antecipa que “continuará a ser um ano de lenta retoma que poderá ter alguma alavancagem com o Mundial de Futebol, no Verão, e com o Natal, no final do ano, atendendo a que as marcas não estiveram muito activas no primeiro semestre”. João Varela, responsável da Clearspot, está confiante num “crescimento face a 2013, não só pelos grandes lançamentos mas resultado da alteração do clima económico”. “As perspectivas para 2014 são simpáticas, temos como objectivo crescer em Portugal 20 por cento face ao período homólogo e reforçar a nossa presença no continente africano, a exemplo de Moçambique, onde estamos há dois anos e lideramos a comunicação em táxis, meios moveis e possuímos uma rede com mais de 80 posições em Maputo”, refere Ricardo Bastos.
Os desafios do sector
Na opinião de Anita Martins, “os principais desafios do sector prendem-se com a constante evolução para a digitalização. Por outro lado, as empresas terão de aportar mais valor ao mercado para ajudar a que este se incremente”, frisa. Posição partilhada por João Varela, que refere que “como desafios pode-se colocar na linha da frente a capacidade permanente de construir e apresentar soluções que construam de forma integrada na comunicação das marcas valor para as mesmas”. Para Rodrigo Rodrigues, “o mais interessante é que no meio destes desafios é preciso também entenderem que por vezes o todo é maior, e mais forte, que a soma das partes, ou seja, um meio de publicidade exterior inserido numa campanha integrada, pode ser decisivo por si só mas contribuir para a campanha como um todo, fazendo parte da história que a marca quer contar”.
Depois, há os desafios burocráticos. “O sector da publicidade exterior vive uma incógnita perante a dupla tributação de taxas (autarquias e Estradas de Portugal), facto que origina severas lesões financeiras perante os operadores do sector”, alerta Ricardo Bastos. “Mas acima de tudo, o sector vive uma crise de valores, fracos valores de postura de muitas empresas no mercado, com maior incidência a Norte de Portugal, e fracos valores comerciais, em que se praticam preços no limiar ou por vezes abaixo do custo de produção com vista à conquista de determinados clientes”, lamenta. Também Paulo Colaço aponta o facto de que “o grande número de empresas que actua nesta área, embora a maioria sejam empresas muito pequenas, faz com que existam muitos interlocutores e logo uma grande variação de valores”. “Por outro lado, a questão da concentração, que ainda não sabemos como irá ficar, também poderá trazer graves consequências para o mercado, pois a situação de ‘quase monopólio’ pode colocar-se e, como sabemos, esta situação só é boa para um lado”, aponta, aludindo à compra da Cemusa por parte da JCDecaux. Uma situação que preocupa também Vasco Perestrelo, que afirma que “basicamente todos os stakeholders dos sector (operadores, autarquias e anunciantes) esperam que a a Autoridade da Concorrência faça o seu papel para garantir concorrência neste mercado e o concurso de Lisboa” em virtude da “excessiva concentração que implicaria caso se concretizasse”. “Está comprovado que é a concorrência que faz um sector inovar, investir e melhorar o seu produto. Pelo contrário, vemos que é nos sectores com elevada concentração que tal não acontece, daí que pense que a forma como este tema for tratado terá inevitavelmente consequências decisivas no sector a curto, médio e longo prazo.”