Ricardo Tomé, director coordenador da Media Capital Digital e docente na Católica Lisbon School of Business and Economics
A META das subscrições: Opinião de Ricardo Tomé
A 30 de outubro último, a Meta-anteriormente-conhecida-por-Facebook inc. anunciou que iria lançar, na Europa, uma opção de subscrição mensal para navegar sem anúncios no Facebook e Instagram no valor de […]
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A 30 de outubro último, a Meta-anteriormente-conhecida-por-Facebook inc. anunciou que iria lançar, na Europa, uma opção de subscrição mensal para navegar sem anúncios no Facebook e Instagram no valor de 9,99€ para web e 12,99€ para o caso das apps. A explicação da empresa é que, desta forma, conjugam as obrigações europeias em volta do RGPD, pois fornecem a opção de navegar gratuitamente com anúncios targetizados ou, caso o utilizador não pretenda publicidade endereçada, basta pagar… Quem ativar o pensamento crítico percebe logo que alguma coisa escapa nas entrelinhas: então e porque não uma opção de navegar sem anúncios segmentados?
Só para termos uma ideia, recuemos a fevereiro de 2022. Com a introdução de mecanismos de proteção à privacidade pela Apple (basta pesquisar pela sigla IDFA) todas as apps para iPhone/iPad tiveram de passar a adicionar a agora célebre opção “pedir à aplicação para não seguir” para os utilizadores poderem usar a aplicação sem que a mesma pudesse incorporar dados da navegação cruzados com a atividade noutros sites e apps. Num exemplo: impedir que usem os meus dados de navegação em sites de pesca para depois me bombardear com anúncios de pesca na app, mantendo-me assim “anónimo”.
Mas isto tem consequências comerciais. As receitas da Meta previstas para 2022 foram revistas pelo seu CFO, David Wehner, e estimadas em menos -10Bi$, qualquer coisa como -10%. Só que as ações caíram 26%… Na verdade, 2022 acabaria por não ser muito diferente de 2021, com as receitas quase em linha (116Bi$ vs 117Bi$), só que o resultado líquido caiu de 39Bi$ para 23bi$, com razões apontadas sobretudo aos custos relacionados com a aposta na realidade virtual, segmento Oculus e Metaverso Horizon (Tech + RH). A leitura de vários analistas é que estes investimentos teriam em conta uma previsão de receitas maior, para os absorver, e tal não sucedeu (daí os subsequentes layoffs que se seguiram, quer em 2022 e já também em 2023).
Mas as pedras no sapato não se ficaram apenas por aqui na limitação relativa ao uso de dados pessoais para publicidade. Nas barras dos tribunais, em 2023, são já dois casos (Irlanda e Alemanha) que podem ascender a centenas de milhões de euros de multas (e má reputação para a empresa, além de, em si, travarem o lançamento mais ágil de soluções nos seus produtos, que passam a ter de avançar mais devagar para garantir a conformidade com as leis europeias).
Então porque é que a Meta lançou a opção de subscrição para navegar sem anúncios?
Opção A Foi uma espécie de teste e seguidismo para explorar receitas D2C, tal como já fazem os streamers (Netflix, Spotify, et.al) ou como Elon Musk está a testar com a X nalguns países. Só que a aparente razão de Musk está no combate aos bots fraudulentos e os streamers produzem e distribuem conteúdos.
Opção B Foi para conseguir nova linha de receitas e começar a converter utilizadores grátis em pagantes. Mas então porquê começar com um preço premium de 10€ e 13€, tão elevado? Fui explorar e, pelos vistos, a pergunta estava também a ser feita por vários jornalistas no mundo tech, que chegaram à mesma conclusão: se dividirmos as receitas totais de 116Bi$ pelos 3,9Bi de utilizadores, obtemos uma receita anual média de 30$/ano… Então porquê começar a cobrar 10$/mês para conseguir que alguém que antes gerava 30$/ano agora gere 120$? Estamos a falar de cobrar três vezes mais pelo que esse utilizador geraria em publicidade. É um aumento de 300%!
Opção C Parece ser a mais credível: é, simplesmente, uma forma ardilosa, pseudo-esperta e elaborada de conseguir um aparente contorno à diretiva europeia que pretende proteger os utilizadores, colocando-lhes uma opção tão cara que os “obriga” a dar o consentimento a publicidade personalizada, desativando as opções intermédias onde poderíamos aceitar publicidade não segmentada. Ou se paga, ou se aceita. Não é para remover anúncios, mas para remover as obrigações que visam dar opções de proteção por uso de dados pessoais aos utilizadores.
Quando temos uma empresa que diz ter como missão “permitir que as pessoas construam comunidades e aproximar o mundo”, mas recorre a este tipo de “soluções” para poder tratar os dados pessoais das mesmas apesar de escândalos como o Cambridge Analytics no passado, a conclusão é só uma: nada mudou. A missão pode ser permitir às pessoas construírem comunidades, mas o objetivo da missão é claramente a “data”, e o uso da mesma, para monetizar livremente e com o menor controlo possível por terceiros essa atividade.
Nos media pedimos autorização para cedência dos dados e para que, com isso, a publicidade possa pagar o jornalismo, outra opção é permitir que o utilizador não seja seguido e não ter publicidade endereçada e a terceira dar acesso pago a algum conteúdo premium para obter receitas adicionais e financiar mais jornalismo. E com isso o negócio cresce (é sempre um negócio de media) mas todos ganham num conjunto de opções equilibrado.
No caso da Meta não se pretendem combater bots, nem fake news, nem financiar nada que não seja a recuperação da sua margem de lucro e da capacidade de fazer o máximo possível sem limites claros ao uso dos dados pessoais, numa clara afronta ao conceito da regulação que a UE aplicou nos seus estados-membros (e, com isso, também dando um sinal ao mundo e aos seus utilizadores). Lembremos, aliás, que a aplicação concorrente do X, a Threads, nem sequer abriu ainda na UE, precisamente porque a Meta não quis ceder a estes “caprichos” da Europa (opinião igualmente e publicamente já partilhada por Elon Musk, mas pelo menos louvemos a Musk a frontalidade, bem como a abertura em descrever os argumentos, ao contrário de Zuckerberg).
É bom, portanto, que ao usarmos estas aplicações enquanto utilizadores saibamos, ao abrir as mesmas, o que está a ser feito por trás delas. E, enquanto anunciantes ou produtores de conteúdos, refletir da mesma forma. Todos temos negócios que queremos ver florescer. E, felizmente, a história está repleta de marcas de sucesso. Sobretudo aquelas que melhor souberam ser fiéis aos seus princípios e valores e respeitaram e alinharam pelas preocupações dos seus clientes. Preocupações essas que são as que a União Europeia endereçou e agora a Meta tenta contornar.
O que a UE fez foi transpor as preocupações dos seus cidadãos para um conjunto de leis. Esses cidadãos são também os utilizadores dos serviços da Meta. Portanto, o que a Meta aqui revela é que não pretende levar em conta as preocupações dos utilizadores e não lhes dará uma opção senão pagar 10€/mês.
Que fique claro quem é que está errado. E não é a União Europeia. Muito menos nós.
Artigo de opinião assinado por Ricardo Tomé, diretor coordenador da Media Capital Digital e docente na Católica Lisbon School of Business and Economics