Métricas e falta de estudos condicionam criatividade e aumentam invisibilidade das marcas
A valorização excessiva das métricas quantitativas está a afetar a criatividade, o que acaba por refletir-se na visibilidade dos anúncios publicitários. Com orçamentos mais reduzidos e menos estudos de mercado, as marcas focam-se nos resultados, desvalorizando as emoções dos consumidores
Luis Batista Gonçalves
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Os números não deixam margem para dúvidas. Milhares de marcas em todo o mundo estão a desperdiçar milhões em campanhas publicitárias que, por estarem mais preocupadas em atingir métricas quantitativas do que em serem criativas, passam despercebidas à maioria dos consumidores. “O mercado tem de fazer essa análise porque temos uma taxa de 80% a 90% de invisibilidade”, alerta, em declarações ao M&P, António Roquette, CEO da Uzina e presidente da Associação Portuguesa das Agências de Publicidade, Comunicação e Marketing (APAP), moderador da tertúlia que debateu O Custo da Invisibilidade, a 21 de maio, no 26º Festival CCP, que decorre até 24 de maio na Fábrica do Pão do Beato Innovation District, em Lisboa.
“A taxa de cliques média é de 0,57%”, sublinha Nicolas Grassi, estratega independente, um dos oradores convidados. Na apresentação que fez na iniciativa promovida pelo Clube da Criatividade de Portugal (CCP) em parceria com a APAP, o especialista divulgou estatísticas preocupantes para o setor, baseadas em dados públicas do setor. Além de 32,8% dos utilizadores de internet recorrerem a bloqueadores de publicidade para recusar anúncios, só 1,22% dos seguidores de Instagram é que interagem com publicidade na aplicação. No Facebook, não ultrapassam os 0,86% e no YouTube não vão além dos 0,64%. O TikTok lidera com 5,6%, segundo os dados compilados por Nicolas Grassi.
“Em 2023, na categoria de telecomunicações, só quatro anúncios é que registaram uma taxa de recordação de, pelo menos, 10%. Na categoria de hipermercados e supermercados, não houve nenhum”, afirma Nicolas Grassi, atribuindo parte da responsabilidade ao desinvestimento em publicidade criativa que se tem vindo a registar nos últimos anos. “Compensar a falta de criatividade custa 228 mil milhões de dólares [€210,4 mil milhões]”, assegura o especialista, que garante que 75% do sucesso de uma campanha depende da criatividade, podendo alavancar as vendas até 49%.
“15% é quanto os orçamentos de marketing vão ser reduzidos em 2024”, garante Nicolas Grassi. “O grande custo da invisibilidade é a perda da perceção do valor do marketing”, adverte o especialista que é um forte crítico das métricas que têm vindo a ser usadas para avaliar investimentos. “O ROI [retorno do investimento], o ROC [retorno do conteúdo] e o ROAS [retorno do investimento em publicidade] são métricas altamente questionáveis nos dias de hoje”, afiança.
Novas formas de avaliação em análise
Em vez de indicadores numéricos, começam-se a valorizar cada vez mais as métricas emocionais. Nos Estados Unidos, a Mediaprobe recorre a sensores fisiológicos para captar valores de excitação psicológicos para avaliar a recetividade aos anúncios televisivos em tempo real, incorporando o contexto e as características das audiência na interpretação. Além de valorizarem mais a publicidade criativa, os espetadores vão perdendo o interesse à medida que o número de anúncios vai aumentado nos intervalos. “Depois do décimo, os que se seguem tornam-se invisíveis”, assegura Pedro Almeida, CEO da Mediaprobe, outro dos oradores.
“A probabilidade de as pessoas se lembrarem de um anúncio depende do impacto emocional do mesmo e da exposição e repetição do mesmo. Por cada aumento de 10 inserções, essa possibilidade aumenta cerca de 5%”, revela Pedro Almeida. Numa altura em que as marcas reduzem o investimento publicitário, acertar no alvo torna-se imperativo, sob pena das insígnias virem a perder visibilidade. A falta de estudos de mercado acaba, no entanto, por dificultar as estratégias de marketing e o planeamento de meios.
“O investimento que era feito em estudos de recordação e memorização era muito maior há 15 anos. Tem havido um grande desinvestimento a este nível. Não temos dados que nos permitam evoluir”, critica Alberto Rui Pereira, CEO da IPG Mediabrands Portugal, e representante das agências de meios na tertúlia. “Gastamos apenas 1% do nosso orçamento de marketing em estudos. É muito pouco. É preciso gastar mais”, assume António Fuzeta da Ponte, diretor de marca e comunicação da Worten. O representante dos anunciantes é outro crítico das métricas quantitativas.
“Esses números são muitas vezes usados contra nós, apesar de serem números que não dominamos. Muitas vezes, borrifo-me no que dizem as métricas, mas eu não sou o melhor exemplo porque uso um método que, se calhar, deveria ser proibido. Eu baseio-me muito na minha intuição e gosto muito de andar na rua a tentar perceber as pessoas para saber como devo comunicar com elas”, revela António Fuzeta da Ponte. Graça Magalhães, diretora da VML, representante das agências publicitárias, também valoriza muito esta abordagem. “Somos máquinas de sentir que pensam e não o contrário”, sublinha a criativa.
“A emoção tem ganhos brutais no tempo que as marcas perduram na memória das pessoas. A psicologia e a neurociência estão-nos a mostrar isso. A emoção, independentemente do portefólio emocional que é explorado nos anúncios, tem um papel fundamental no combate à invisibilidade das marcas”, defende Graça Magalhães, outra das críticas da atual metodologia de avaliação. “Estamos a sofrer o impacto de décadas de decisões tomadas com base na racionalidade, com a grande preocupação de obter KPI [indicadores de performance]”, lamenta a responsável.