O papel e a cor como suportes de arte
O objetivo da Renova é precisar a arte como território da marca, que leva o papel higiénico preto e vermelho em visita privada no Museu Thyssen-Bornemisza, em Madrid, orientada por obras com estas cores (na foto)
Catarina Nunes
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Entrar no Museu Thyssen-Bornemisza, em Madrid, depois de as portas terem sido fechadas ao público, remete imediatamente para o imaginário de filmes como ‘Noite no Museu’ ou ‘O Caso Thomas Crown’ – este último, nas mentes mais no limite do conceito de ‘aventura’.
Porém, na ativação de marca fora de horas da Renova, que traz cerca de 30 convidados para uma visita privada a parte do acervo colecionado pelo Barão Heinrich Thyssen-Bornemisza e o seu filho Hans Heinrich, não há animais empalhados a ganhar vida nem o roubo de uma pintura, perpetrado por um bilionário excêntrico.
Durante a próxima meia hora, uma historiadora de arte irá conduzir os convidados entre as várias salas vazias, no museu situado no distrito de arte madrileno. A pedra de toque com a Renova? Em cada uma das sete obras destacadas, o preto e o vermelho são as cores predominantes, fazendo a ligação ao mais recente lançamento da marca de papel ’tissue’, o papel higiénico de face dupla, preta e vermelha, enquanto suporte de arte.
“O objetivo da ativação é precisar um território de marca em Espanha, onde estamos há mais de 25 anos. Temos feito muita comunicação aqui, mas aquilo que pretendo é que seja uma marca criativa e ligada à arte e à criatividade, que em Espanha não é tão visível como é em Portugal ou em França”, explica Paulo Pereira da Silva, CEO da Renova, em declarações ao M&P, o único meio nacional convidado a estar presente.
Convidados das artes e da moda
Entre os 30 convidados que vão chegando à entrada do Thyssen perfilam-se personalidades locais ligadas à arte, à moda e aos interiores, em que se destacam, Carolina Herrera, diretora criativa e filha da estilista venezuelana com o mesmo nome, e Xandra Falcó, membro da direção da Círculo Fortuny, associação de marcas de luxo espanholas.
Os portugueses baseados em Madrid, Verónica de Mello, curadora, e Francisco Faria, modelo e criador de conteúdos digitais para marcas de luxo, alinham do lado da comitiva nacional, lado a lado com Francisco Torres, arquiteto de interiores, e elementos da equipa da Renova em Portugal e também de Espanha.
“Na criação de marca em um determinado país, trabalho que nunca está acabado, é importante fazer este tipo de ativação junto de um público em que não o fazemos habitualmente, em Espanha. O mundo também tem mudado muito e agora temos de fazer muito mais coisas com influenciadores”, justifica Paulo Pereira da Silva.
A visita começa por uma pintura de Ernst Kirchner, ‘Rua com Prostituta de Vermelho’. A historiadora de arte que conduz a visita recorda que a existência da cor, presente na natureza, é anterior ao ser humano. “A começar pelo vermelho do sangue, inerente ao nascimento. É o primeiro pigmento de cor usado na arte rupestre, com o preto e o castanho. O vermelho vem do ocre, que se julga que vem do amarelo, mas é definido em função da quantidade de óxido de ferro”, explica.
Paulo Pereira da Silva chega ao vermelho do papel higiénico Rouge et Noir de outra forma, depois de já ter criado o primeiro papel higiénico preto, lançado mundialmente em 2005. “Tenho um fascínio pelo Japão e pelas lacas pretas de um lado e vermelhas do outro, com aquela sofisticação japonesa e apenas duas cores. Isto com o brilho da laca, é elevar a sofisticação, na simplicidade e minimalismo. Pensei em conseguir fazer um papel que fosse assim”, recorda o CEO da Renova.
Sucesso Rouge et Noir
Atualmente, o papel preto por fora e vermelho por dentro, vendido dentro de uma caixa de oferta, é o produto mais luxuoso da marca. “O nosso maior mercado é a China, onde é vendido no TikTok e na internet, com entrega no mundo inteiro. Não está no ‘mass market’, provavelmente estará em lojas ou em hotéis de quem compra na nossa loja online”, refere Paulo Pereira da Silva.
Em paralelo com a moda e outras expressões de criatividade, a arte é parte da identidade da Renova, nomeadamente através da Renova Art Comissions, que encomenda projetos a artistas. Paulo Pereira da Silva aponta como o primeiro nesta área o trabalho com o fotógrafo de moda Jean François Jonvelle, com imagens de rostos a preto e branco e o conceito ‘Renova Cuida de Si’, utilizados numa campanha publicitária em Portugal.
Mais tarde, entrega uma tarefa semelhante a Peter Lindbergh, cujo trabalho resulta em outra campanha publicitária, apresentada numa das primeiras ModaLisboa que a Renova patrocina, há cerca de 20 anos. “Ter ido buscar fotógrafos a França teve a ver com a marca. Quando cheguei à Renova fiquei à frente da parte comercial e de marketing e quis ter uma visão internacional da marca, de alguém que já tivesse trabalhado com várias marcas”, justifica.
Na ligação à arte em Espanha, o CEO quis fazer diferente daquilo que faz em Portugal. “Estamos num país que tem uma vida artística e social muito forte e viva em Madrid. Queria fazer alguma coisa ligada à cor, que é característica pela qual somos muito conhecidos. Foi o Raul Romero [relações públicas da Renova em Espanha] que teve a ideia da visita ao Thyssen com ligação à cor”, refere.
A visita já existe, criada pela agência de viagens de luxo personalizadas Nuba España, mas agora é adaptada para a Renova, com as obras selecionadas pelo Thyssen. À pintura de Kirchner com a qual arranca a visita, somam-se as de Piet Mondrian, Max Beckmann, Willem de Kooning, Palma el Viejo, Peter Paul Rubens e Jean-Honoré Fragonard.
A ativação segue para o Horcher, restaurante inaugurado em 1943, junto ao parque Retiro. Paulo Pereira da Silva justifica a escolha por ser “um clássico que está a inovar e a tornar-se ‘fashion’, que é o percurso que a Renova fez”. Aqui, o espaço é igualmente moldado à imagem do conceito que orienta a noite da Renova no Thyssen.
A cor vermelha domina o ambiente, na iluminação e arranjos de flores, nos guardanapos Renova impressos com pinturas do Thyssen, a par de guardanapos com desenhos e citações de artistas, como Le Corbusier, Maria Dolores Pradera e Cristóbal Balenciaga, replicados pela mão da caligrafista e ilustradora espanhola Mariana Valdecasas Solís.
Precisar o território Renova
Paulo Pereira da Silva salienta que esta ativação não é determinada por um contexto específico do mercado em Espanha. “As marcas para estarem presentes precisam de comunicar, senão não existem. A Renova pretende ter um território muito preciso, que tem de ser construído continuamente. Aqui não é tanto uma questão comercial de estar a vender o produto, é um trabalho de precisão na construção da marca”, argumenta.
A marca está construída. Porém, a perceção que tem não é aquela que quer que venha a ter, como tem em Portugal. “Até agora, comunicámos muito em Espanha, em televisão, revistas, ‘outdoor’ e autocarros nas principais cidades, e continuamos”. A questão é que “com um produto de grande consumo, o trabalho de marca tem de ser feito. A marca para existir tem de existir, as pessoas têm de ver o logótipo e os produtos”, defende.
A partir daqui, acrescenta, há a necessidade de precisar qual é o território da marca. “Ser uma marca histórica em Portugal é muito diferente de estar em outro país, em que esse conhecimento não é tão claro. O que temos feito na Coreia do Sul, começou logo por ser fora de hipermercados, onde não estamos, para trabalhar a marca como algo de muito diferenciado, com ações deste tipo com instalações em museus”, aponta.
Esta é uma estratégia de criação de uma perceção de marca mais elevada, para lá do aspeto funcional associado ao papel higiénico, por territórios onde já está em Portugal. “A Renova era uma marca conhecida, mas quando começámos a trabalhá-la, na cabeça das pessoas, era uma fábrica de papel”, recorda Paulo Pereira da Silva.
A estratégia em Espanha vai continuar, com uma vertente de ‘cobranding’. “Começámos há uns meses, na Feira de Sevilha, uma parceria com a Inés Domecq que tem a marca IQ, que agora tem uma área de ‘home’ numa vivenda em Madrid, onde vende os produtos dela e também os nossos, em ‘cobranding'”, avança.
Paulo Pereira da Silva revela que, durante o evento no Thyssen e no Horcher, surgiu a ideia de o criador de conteúdos Francisco Faria fazer algo durante a próxima feira Art Basel, em Miami. Já em Portugal, “gostava de partilhar o nosso acervo artístico, as muitas instalações que fizemos com artistas e que estão guardadas na Renova. Na fábrica estamos a criar um espaço para o fazer e provavelmente vamos fazê-lo também em museus”, remata.
* a jornalista viajou a convite da Renova