“Quando os jornais são úteis aos seus leitores têm futuro”
Para assinalar o sétimo aniversário, o Jornal Económico entra numa nova fase com um novo grafismo e uma edição diária digital, numa lógica de “less is more”, além da edição […]
Sónia Ramalho
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Para assinalar o sétimo aniversário, o Jornal Económico entra numa nova fase com um novo grafismo e uma edição diária digital, numa lógica de “less is more”, além da edição semanal. Estivemos à conversa com Filipe Alves, diretor do JE, que revela o que está por detrás destas alterações, porque já não guardam as notícias para o papel apostando numa lógica de “digital first” e os eventos que estão a preparar para a rentrée, a partir de setembro.
Anunciaram que o Jornal Económico (JE) está a entrar numa nova fase. O que podemos esperar do JE?
Este ano fizemos grandes alterações e essas mudanças ocorrem num novo enquadramento no Grupo Media N9ve, no qual o JE está inserido desde o final de 2022. A entrada no Grupo deu-nos várias vantagens. Por um lado, temos um acionista com uma perspetiva mais cosmopolita e internacional. Atualmente, o JE posiciona-se como um jornal lusófono, ou seja, os nossos leitores estão em todos os países onde se fala português, o que obrigou a um ajuste na estratégia para ter conteúdos para esses leitores.
Por outro lado, este ano tivemos a oportunidade de fazer um investimento em várias áreas decisivas para o futuro, como o novo site, que arrancou em soft launch em maio, e que está a ter muito bons resultados. Conseguimos aumentar a audiência em cerca de 40 a 50% nas diferentes métricas e vamos fechar o primeiro mês do novo site acima dos 2 milhões de page views.
A que se deve esse aumento?
No último ano tivemos grandes problemas de cibersegurança. Fomos alvo de um ataque que afetou o nosso posicionamento no Google e tivemos de criar uma nova plataforma. Por outro lado, melhorámos os conteúdos, reforçámos a equipa e estamos a passar para um modelo de “digital first”, ou seja, já não guardamos notícias para a edição semanal. Apostamos diariamente em ter notícias e isso é muito importante porque, apesar desse “digital first”, não estamos a deixar de investir na edição semanal. Pelo contrário, lançámos um novo grafismo, com novos conteúdos e o caminho é cada vez mais de excelência. Antes, o nosso foco podia estar mais concentrado na edição semanal, em ter um bom produto à sexta-feira, e neste momento queremos ter um bom produto todos os dias.
Esta aposta no “digital first” não prejudica a edição semanal?
Não, pois o que mudámos foi a forma de trabalhar. A edição semanal continua a ser o nosso espaço premium, com conteúdos de grande qualidade. Com a reformulação gráfica, os artigos analíticos ganharam mais espaço. Ou seja, vamos apostar mais nesse tipo de trabalhos e não guardar notícias exclusivas para sexta-feira. Vamos ter sempre histórias exclusivas na edição semanal, mas o jornal vai ser mais analítico, vai ter mais contributos de novos colonistas, novas parcerias com universidades e outras instituições. O que é notícia e o que é urgente vai sair no momento.
Há outra vertente: a edição diária digital. Na prática, vamos ser um jornal diário, vamos ter um produto premium todos os dias para assinantes, embora não em papel, mas é um jornal condensado com os grandes acontecimentos do dia e a sua análise.
De que forma a edição diária, exclusiva para assinantes, é diferente dos conteúdos no disponíveis no site?
A edição diária vai arrancar com um período experimental em que vai estar acessível a todos. Queremos dar a conhecer o produto para que os leitores possam experimentar. A diferença face ao site é que vamos ter conteúdos com mais profundidade, mais tempo de edição, mais aprofundados e notícias exclusivas todos os dias. O JE tem-se distinguido desde o início por ser capaz de dar notícias que marcam a agenda e vamos continuar nesse caminho. A edição diária é mais uma plataforma para o fazer. Vamos ter um produto que nasce com o objetivo de dar o essencial que um leitor de economia precisa todos os dias, ou seja, eliminando o ruído, a espuma dos dias. Há outros temas que fazem mais sentido no site, como artigos de lifestyle, mas que na edição diária não vão ter tanta expressão, pois é focada no essencial.
Na sua opinião, as pessoas ainda têm paciência para ler artigos mais analíticos, numa altura onde apenas se lê os títulos e pouco mais?
Há muita gente que faz isso, mas considero que há cada vez mais espaço para esse tipo de conteúdos mais analíticos. As pessoas são diariamente bombardeadas com uma informação tão intensa que acaba por ser difícil de acompanhar. Tivemos recentemente o caso da TAP em que bastava perder uma reunião da comissão de inquérito para perder o fio à meada. Mais do que nunca, a quantidade de conteúdos e de informação com que somos bombardeados de manhã à noite é tanta que há necessidade daquela função do jornalista de procurar a informação, selecionar e validar o que é importante.
CURADORIA DE INFORMAÇÃO
Um jornalismo quase como uma curadoria de informação?
Exatamente. Passa por pegar no que é realmente importante. O que quero é que o nosso leitor típico – quadros de empresas, gestores, profissionais liberais, investidores, estudantes, professores universitários – saibam que, de manhã, vão ter um guia essencial para o seu dia e, se não tiverem muito tempo para ler o resto, já ficam por dentro de tudo e isso é um grande desafio. É fácil? Obviamente que não, mas vamos fazer um esforço muito grande para isso.
Como surgiu a necessidade de reformular do JE? Foi uma forma de assinalar os sete anos?
Sim. A reformulação tem por base duas vertentes: gráfica e de conteúdos. Na vertente gráfica havia uma consciência de que o jornal precisava de um refresh. Tinha havido um trabalho anterior de atualização, mas nunca um refresh por circunstâncias relacionadas com o lançamento do jornal. Foi feito num processo acelerado e acabou por não ter a atenção devida. De há um ano para cá que estávamos a pensar fazer isto e pedimos o apoio do Pedro Fernandes, um designer conceituado que, juntamente com a equipa de arte do JE, liderada pelo Mário Malhão, produziu esta nova edição com um grafismo mais clean, moderno, apelativo, sem cortar com o que existia. Percebe-se que há um fio condutor. Nas secções, o leitor frequente do JE identifica-se pois percebe que é uma evolução, não há um corte radical com o passado.
Há mais espaço para análise e alguns temas internacionais vão ter mais profundidade. Depois existem duas alterações no conceito: por um lado, é um produto multimédia e temos conteúdos, como entrevistas, em que é possível aceder em vídeo ou podcast, basta abrir um QR Code. Isto permite dar destaque à entrevista no jornal, mas esta pode não ocupar duas páginas e ter somente o título, parte do texto e, com o QR Code, o leitor pode ter acesso ao conteúdo na íntegra. Dá ao leitor a opção de aceder ao conteúdo no formato que for mais conveniente. Estamos a dar mais opções ao leitor e a ir ao encontro do que são as novas tendências de consumo de conteúdos. Conseguimos ter mais conteúdos no jornal pois não ocupam tanto espaço, o que permite redefinir as secções.
Quais as mudanças que implementaram nas secções?
O antigo JE começava com a secção de economia e política, seguida da secção de empresas e finanças e depois o internacional, lusofonia e universidades. Com a reformulação passámos as empresas para a frente. Não é que os outros temas sejam menos importantes, mas somos um jornal virado para as empresas e muitos leitores compram o jornal para ler essas notícias.
Por outro lado, os conteúdos internacionais e de lusofonia não devem estar acantonados numa secção, uma vez que a economia não tem fronteiras. Significa que, se houver uma notícia sobre eleições no Brasil ou em Angola ou num pais lusófono, pode ser a abertura da secção de política. Ou uma reunião do banco central dos EUA pode abrir a economia. Permite pensar de uma forma mais internacional. Os temas estão apenas divididos em macro (economia) e micro (empresas). Diria que, cada vez mais, o caminho para o JE passa por procurar servir melhor a sua comunidade de leitores.
COMUNIDADE DE LEITORES
Essa comunidade é vital?
Acredito que qualquer projeto, para ser bem-sucedido, tem de ter a sua comunidade e tem de a servir bem. Não podemos estar de costas voltadas para os leitores, anunciantes e parceiros, temos de procurar cumprir os princípios básicos do jornalismo, que é ser independente, para o nosso jornalismo ter valor para as pessoas. É para isso que servimos.
Para serem reconhecidos por isso?
Diria que o ser reconhecido não é um fim em si mesmo, o ser reconhecido como independente, rigoroso e isento é necessário para que o modelo de negócio seja sustentável. Existem muitas pessoas no nosso sector que ainda não compreenderam isso. Pensam que têm de faturar em publicidade, mas esquecem-se que, para atrair publicidade e organizar eventos, é necessário que as marcas sejam reconhecidas como credíveis. A grande vantagem dos media passa por aí: ter a sua comunidade e ir ao encontro do que ela quer e construir uma comunidade à volta disso (leitores, parceiros, anunciantes), além dos stakeholders, que se associam aos eventos, às iniciativas, às pessoas que somos capazes de atrair para os eventos.
O principal é ser fiel aos nossos princípios e não abdicar do essencial porque, se abdicarmos, é o fim. Deixamos de inspirar confiança nos leitores, deixamos de ter valor comercial e deixamos de ser capazes de cumprir a nossa função perante a sociedade.
A IMPORTANCIA DOS EVENTOS
Os eventos e as conferências são uma parte importante no vosso modelo de negócio?
Sempre foram, mas este ano vamos fazer uma aposta maior com a introdução de novos formatos, como conferências à porta fechada, observatórios com stakeholders relevantes e a introduzir uma forte componente lusófona.
No segundo semestre vamos ter um calendário de eventos muito preenchido. Começamos em setembro com a conferência para assinalar o 7º aniversario do JE, onde vamos debater os grandes temas que consideramos mais relevantes para o próximo ano, quase como uma conferência de antevisão para 2024 em matéria de macroeconomia, no setor financeiro, nas empresas, na lusofonia.
Também em setembro vamos ter um grande evento em Lisboa, em parceria com a Forbes: Doing Business Angola. A ideia é criar um fórum, que se pode repetir mais tarde noutras geografias, para discutir as grandes oportunidades para investir em Angola, nomeadamente as privatizações e as mudanças que estão a decorrer em vários setores de atividade.
Além destes dois eventos, e até ao final do ano estão calendarizados o Fórum Banca, um evento anual do setor financeiro, o Fórum Telecomunicações, que vai juntar os players das telecoms para debater o futuro do setor, um grande evento sobre tecnologia na área da saúde e um outro sobre o orçamento do Estado.
A área dos eventos é importante para a faturação do JE?
Sim, é muito importante. Há um mix de receitas, que está dividido em partes iguais entre o digital, os produtos em papel e os eventos.
EDIÇÃO IMPRESSA
Ainda faz sentido ter uma edição impressa?
Sim, ainda faz sentido uma vez que o papel se paga a si mesmo, além de ser um suporte muito do agrado dos nossos leitores. Ao manter o papel estamos a ir ao encontro desses leitores, nos quais me incluo, que gostam de ler em papel. O papel num jornal semanal faz todo o sentido pois é uma forma de posicionamento e de promoção do próprio jornal. Pela nossa experiência, as próprias fontes valorizam muito o papel, que resulta de um trabalho de edição, de escolha do que é relevante. É um espaço finito e as pessoas têm noção de que o que está ali é importante o suficiente. Por isso, acho que o papel vai continuar sempre a fazer sentido. Hoje em dia, a dicotomia entre o papel e o digital não se coloca. A verdadeira dicotomia é entre o que é premium (reservado a assinantes) e o que é livre e a tendência é que cada vez mais produtos com qualidade sejam reservados a assinantes.
E onde se inserem os conteúdos no jornal?
O JE à sexta-feira é um semanário, nos outros dias é um diário, que sai em papel e no digital. Temos mais leitores pagos no digital do que no papel, mas o caminho passa cada vez mais por conteúdos com valor acrescentado para os leitores, para que sintam necessidade de comprar. Neste caso, os económicos têm vantagem face aos generalistas pois é mais fácil dar conteúdos que fazem a diferença e que ajudam os leitores a fazer escolhas informadas e esclarecidas na sua vida profissional, nas suas poupanças, até na vida pessoal (escolher o sítio onde vão morar, a escola dos filhos). Um jornal de economia pode ajudar a tomar essas decisões. Quando os jornais são úteis aos seus leitores têm futuro. Acredito muito nisso. Isto conjugado com outras formas de monetização, como a publicidade e os eventos, acaba por fazer um mix que permite a sustentabilidade de um projeto.
O facto de terem uma área de podcasts e vídeos é uma forma de atrair leitores mais jovens?
É para ir ao encontro das novas tendências de consumo de informação e para proporcionar aos anunciantes outros suportes para a publicidade, nomeadamente o branded content onde o vídeo é muito importante. O facto de termos um produto multimédia, apesar de ser papel, faz com que o leitor possa aceder aos conteúdos multimédia e permite chegar a mais pessoas, com interesses distintos.
Como se convence um jovem adulto a comprar um jornal económico?
De duas formas: por um lado fazendo bom jornalismo. Os jovens são muito mais idealistas, dão mais atenção a temas do interesse coletivo. É uma mudança geracional e até as empresas têm sentido isso. Querem trabalhar em empresas e projetos que partilhem os seus valores, que tenham uma causa em que possam acreditar e se o jornalismo for levado a sério também pode ajudar a mostrar a essa juventude que é possível tentar chegar à verdade. Sermos honestos no nosso trabalho faz toda a diferença. É um ideal, mas acho que nós (jornalistas) temos de tentar ir atrás de um ideal, chegar o mais próximo possível da verdade e, para isso, temos de usar as ferramentas: o contraditório, verificar os factos, cruzar informações, ser honesto, olhar para as histórias sem conflitos de interesse. Em Portugal ainda se dá pouca importância ao conflito de interesses e é um tema que se vai colocar, mais tarde ou mais cedo. Temos de ser procurar ser sérios e chegar à verdade de forma honesta e isso implica seguir os princípios básicos do jornalismo. Só assim temos futuro como setor.