Na sequência da conquista da conta da identidade visual do Euro 2028, Nuno Santos, CEO da VML em Portugal, revela a estratégia que está na origem da adjudicação, estabelece os objetivos a cumprir até 2030 e a tática a implementar.
Em entrevista exclusiva ao M&P, o líder da agência multinacional fala sobre o crescimento proveniente das contas internacionais e faz o balanço da fusão entre a VMLY&R e a Wunderman Thompson, que resulta na criação da VML.
Adianta que a faturação da VML em Portugal cresce 17% em 2024 face ao ano anterior, refletindo o foco na integração com as agências do grupo WPP e na exigência criativa. Aborda ainda o impacto das fusões no ecossistema criativo, que concedem aos clientes “mais valor e um poder criativo muito maior”.
Acabam de ficar responsáveis pelo ‘branding’ do Euro 2028. Qual é a estratégia que vos vale esta conquista?
O segredo é ter talento e experiência. Temos um historial de trabalho de ‘branding’ para eventos desportivos, incluindo a identidade visual do Euro 2024, que também criámos. Somos a agência dentro da VML a nível mundial mais destacada na área de ‘branding’ para grandes eventos, o que é uma sequência natural do trabalho extraordinário que esta equipa realiza a nível internacional.
É um privilégio e um orgulho, incluindo para o talento português, termos a oportunidade de trabalhar num evento desta dimensão. Também sentimos que temos o direito de ganhar.
Como é que surge esta oportunidade e quais foram as outras empresas participantes?
Participámos num concurso internacional, no qual competimos com os melhores estúdios de ‘branding’ e de marketing de eventos desportivos a nível mundial. O Euro 2024 teve toda a identidade visual do evento desenvolvida pela equipa de ‘branding’ da VML, liderada por Pedro Gonzalez, diretor executivo, e por Hélder Pombinho, diretor criativo. O mesmo acontecerá para o Euro 2028.
Há sempre este concurso, quatro anos antes do evento e a VML Portugal volta a conquistar esta conta. É algo de que nos orgulhamos muito. A brincar, até é caso para dizermos, Portugal já ganhou.
Para além da identidade visual, haverá outros aspetos criativos ou estratégicos que vão trabalhar?
O processo mal começou mas estamos a falar de uma mega marca, um megaevento que conta com uma maior coordenação e uma série de parceiros a trabalhar em conjunto.
Por agora, temos esta peça, que é a identidade visual e o ‘branding’, mas obviamente que vão existir oportunidades para criar uma série de outros elementos da cadeia de valor deste evento, nomeadamente no que diz respeito a ativações e à comunicação, entre outros.
A VML acaba de ser distinguida como uma Standout Agency de 2024 na A-List da Ad Age e sobe para a 2.ª posição no ranking WARC Creative 100 2024. Como é que a agência em Portugal contribui para este sucesso?
Temos cada vez mais trabalho de relevo internacional, é a nossa maior área de crescimento. Estamos a finalizar as submissões para a ‘network’ [VML a nível mundial] e Portugal é um dos países europeus que mais inscrições vai enviar, tendo em conta a nossa dimensão. O ‘branding’ também contribui de forma notável, sobretudo com a conta do Euro.
Contribuímos com a extensão das grandes campanhas de comunicação, sobretudo trabalhos diretos para clientes internacionais, alguns em colaboração com as agências do grupo WPP, com as quais trabalhamos no desenvolvimento de campanhas e na implementação de estratégias de ‘roll-out’.

Nuno Santos, CEO da VML Portugal, diz que a colaboração com as agências do grupo WPP é um dos focos
Duplicar o volume de negócios até 2030
Qual é a estratégia que a VML Portugal segue para alcançar essas conquistas?
Há cinco anos, definimos uma estratégia que nos permitiria alcançar a afirmação internacional da VML Portugal. Desde que esta equipa assumiu a gestão da agência, após a fusão da Wunderman Thompson com a VMLY&R, o objetivo tem sido ser a agência número um em Portugal.
Queríamos ser uma agência com capacidade de influenciar o mercado e ambicionávamos ser uma agência relevante no contexto europeu. Isso é importante para os clientes nacionais, pois a escala que obtemos através do trabalho para grandes clientes a nível internacional permite-nos adquirir competências com um nível de profundidade e extensão impossível de obter de outra forma.
Atualmente, somos 460 pessoas a trabalhar numa única agência. Temos uma das maiores equipas criativas em Portugal, bem como as maiores equipas de ‘accounts’, de estratégia, de tecnologia, de ‘e-commerce’, de automação de marketing e de marketing de performance. Queremos continuar a crescer, sendo que pretendemos duplicar o volume de negócios da agência até 2030.
Que implicações terá esse objetivo em termos de recursos humanos, ferramentas e estrutura da agência?
Não conseguimos duplicar o que fazemos sem alterar o modelo operativo da agência, que assenta cada vez mais nas ferramentas de inteligência artificial (IA) que fazem parte do WPP Open e já são fundamentais para tudo o que fazemos. Somos o escritório europeu com o melhor nível de adoção de ferramentas de IA, o que nos coloca na melhor posição para crescer mais rapidamente e realizar um trabalho de maior qualidade do que qualquer outro escritório europeu.
Pretendemos ter recursos cada vez mais qualificados, seniores e autónomos, numa organização cada vez mais descentralizada, que delega nas equipas e lideranças intermédias a capacidade de decisão. Procuramos um talento muito específico, com muita ambição e competência nas carreiras, bem como experiência de trabalho no estrangeiro ou com educação multicultural. Um talento que também tem de ser diversificado.
Em que sentido?
Temos pessoas de 24 nacionalidades, falamos cerca de 17 línguas e trabalhamos para 13 mercados internacionais, nomeadamente Austrália, Nova Zelândia, Áustria, Suécia, Dinamarca, Estados Unidos, Inglaterra, Espanha, Suíça, Quénia e Arábia Saudita, entre outros.
A VML Portugal é uma verdadeira fusão cultural de recursos. A nossa própria identidade reflete isso mesmo. Somos uma agência internacional, alegre, fácil de trabalhar, eficiente, talentosa e com muita capacidade de intervenção junto de grandes clientes.
Quanto é que estão a investir em ferramentas de transformação e IA, entre outras?
A nível mundial, o grupo WPP anunciou que no desenvolvimento de ferramentas de IA está a investir 300 milhões de dólares (€276 milhões) por ano. A nível local, o investimento consiste em capacitar os recursos humanos para a utilização das ferramentas do WPP Open.
Estas abrangem a totalidade da cadeia de valor, desde a identificação de audiências e a definição de ‘insights’, que permitem criar melhores ‘briefings’, até à multiplicação de ‘assets’, ‘dynamic content optimization’ e ligação entre planos de meios e planos de conteúdos. Esta automatização liberta energia, recursos, atenção e investimento para aquilo que é fundamental: aumentar o valor na fase inicial da cadeia de valor.

Que estratégia vão implementar para fazer crescer o negócio em áreas chave, como a transformação de marketing, o comércio eletrónico e a criatividade?
A estratégia de crescimento da VML assenta em três pilares. O primeiro é ampliar aquilo que fazemos melhor do que qualquer outro escritório da VML no mundo: ‘branding’, ‘purpose-driven marketing’ e ‘business-to-business’.
Lideramos as relações de comunicação e marketing das organizações das Nações Unidas, como a UNICEF, a NFPA e a OMS, entre outras, e temos a maior operação para a Microsoft dentro da rede VML. Aliás, se isolássemos a operação da Micrsoft numa agência, tornar-se-ia uma grande agência no mercado nacional, só com um cliente.
O segundo pilar é a expansão da nossa área de ‘ecommerce’, com foco em duas vertentes: ‘design & build’ e ‘run & operate’. Contamos com cerca de 140 pessoas nesta área em Portugal e pretendemos duplicar essa capacidade até 2030, reforçando a aposta em ‘marketing effectiveness & intelligence’.
O terceiro pilar é o ‘scale of marketing businesses’, onde criamos equipas dedicadas para resolver problemas complexos de clientes internacionais. Através da competitividade dos nossos preços, conseguimos colocar equipas dedicadas a clientes.
Um exemplo é a coordenação, a partir de Lisboa, do ‘shopper marketing’ da The Coca-Cola Company na Europa. Este apoio a grandes marcas vai impulsionar o crescimento da nossa operação, prevendo-se um aumento significativo da equipa nos próximos anos.
Vão investir em outras áreas, além das que refere?
Mais do que investir em novas unidades de negócio, é gerir a energia que colocamos em cada uma das áreas que referi e a forma como articulamos a complementaridade com outras competências que já existem dentro do grupo WPP.
Não faz sentido duplicarmos essas ‘capabilities’ dentro da VML. Mas no que se refere ao ‘branding’, estamos a explorar novas áreas, como a implementação de inteligência generativa, garantindo que as marcas são consideradas na criação de ‘assets’, ideias e textos. Também investimos em ‘branding’ experiencial, cruzando eventos, marca e comunicação.
‘Social media’ é outra área importante, sobretudo o ‘social commerce’, na qual vamos acelerar a dimensão, o número de pessoas e as competências, à medida que os clientes o fizerem. Em 2024, esta foi uma das áreas de maior crescimento da agência, liderada por Tito Santana e Mafalda Coelho, cujo trabalho tem sido amplamente reconhecido pelos clientes.
Crescimento acelerado por contas internacionais
Quanto é que representam as contas estrangeiras face às nacionais em termos de crescimento?
O mercado internacional representa atualmente cerca de 55% do volume de negócios da agência e deverá crescer para 70% a 75% até 2030. É importante salientar que o crescimento com contas locais continua, mas a um ritmo mais lento do que o internacional, devido à maturidade do mercado. Somos a agência número um em investimento de media local, o que limita as avenidas de crescimento nesta área.
Como é que atraem e conquistam clientes e contas estrangeiras?
É preciso fazer um bom trabalho todos os dias. Temos de fazer um trabalho do qual as pessoas falem positivamente, pois os clientes são a nossa maior força de venda e os nossos maiores embaixadores. Foi assim que conquistámos a conta do Tony Blair Institute.
Uma pessoa que tinha trabalhado connosco num projeto da UNICEF foi para o Tony Blair Institute e, assim que chegou, pegou no telefone e disse: ‘temos de fazer exatamente o mesmo que fizemos na UNICEF’. Isto acontece cada vez mais, com oportunidades que surgem diretamente.
Além disso, temos outros dois grandes motores de crescimento: os nossos gestores de contas globais – que confiam na nossa qualidade e a transmitem aos clientes -, e a nossa capacidade e visibilidade criativa, com projetos como o Euro 2024 e o Euro 2028, que reforçam a credibilidade da agência.
Uma das coisas que aprendemos, eu incluído, é a desmistificar o que é feito lá fora e deixar de ter medo de enfrentar ou agarrar as oportunidades que existem. A nossa equipa tem um critério de exigência alto e, se continuarmos assim, seremos uma referência não só para os clientes, mas também para os profissionais que aqui trabalham. Estamos determinados a fazer coisas que valham a pena; caso contrário, mais vale irmos vender gin tónicos para a praia.
Que desafios podem surgir ao trabalhar com clientes fora de Portugal?
Ao contrário do que acontece em Portugal, onde as estruturas são piramidais e as decisões são mais diretas, com clientes internacionais lidamos com processos longos, estruturas matriciais e múltiplos níveis de aprovação, o que exige uma adaptação à complexidade organizacional.
Temos clientes nos Estados Unidos, mas com equipas na Índia e nós a gerirmos tudo o que está no meio. É complexo. Outro desafio é a formalidade das relações. As reuniões requerem preparação, agendas, registos e ‘follow-ups’ rigorosos, o que implica um período de adaptação para os novos colaboradores.
Criámos um sistema em que as pessoas passam três a seis meses em missões temporárias, antes de assumirem funções permanentes, e isso ajuda-nos a prepará-las para lidar com estes desafios. Apesar disso, temos a confiança e a certeza de que, em termos de maturidade, somos definitivamente um dos países mais competitivos neste aspeto.

Quais são os principais clientes e projetos para fora que têm em mãos?
Temos seis clientes globais com os quais interagimos diretamente e de forma aprofundada. A Microsoft, o Tony Blair Institute, a The Coca-Cola Company, a Philip Morris International, a Amazon e as organizações das Nações Unidas, que consideramos como um único cliente, pois são geridas pela mesma equipa.
Também estamos a acrescentar agora mais três clientes, que ainda não posso adiantar quem são, mas que atuam em áreas mais clássicas, como B2C e bens de consumo rápido.
A nível nacional e internacional, em que concursos estão a participar?
Estamos envolvidos em três concursos a nível nacional, nenhum foi oficialmente comunicado. Contudo, confesso que vejo os concursos de forma menos transformadora do que via anteriormente. Atualmente, há poucos casos em que um concurso, por si só, revoluciona uma agência. Claro que existem exceções, como a EDP e a Galp, entre outras, que representam contas volumosas e exigem grandes equipas.
O que realmente gera impacto são as relações construídas ao longo do tempo, e conseguimos estabelecer melhores relações com os clientes quando essa relação é construída desde a base e não apenas ganha. É isso que permite transformar verdadeiramente as marcas, algo que temos feito com a Vodafone e, mais recentemente, com a Wells.
A renovação da Wells só foi possível graças a um trabalho colaborativo e integrado entre as nossas equipas. O segredo para construir grandes marcas está cada vez mais na criação de relações sólidas, alinhadas numa estratégia profunda e partilhada. É fundamental não só para garantir a criatividade, mas também para assegurar a efetividade de toda a transformação da marca.
A campanha de Natal da Coca-Cola nos Estados Unidos, criada apenas com IA, foi alvo de controvérsia. Qual é o equilíbrio entre tecnologia e criatividade e como é que lidam com estes obstáculos, enquanto agência que quer adotar cada vez mais estas tecnologias?
Quando surge uma nova ferramenta, cria-se uma confusão entre aquilo que ela pode fazer e a finalidade para a qual é utilizada. Enquanto o trabalho criativo for notícia apenas por ter sido desenvolvido com IA, isso indica que ainda não atingimos a maturidade na sua utilização.
Atualmente, vários projetos com IA servem apenas para demonstrar a tecnologia, sem uma relevância real. Em vez de se discutir se uma campanha foi boa ou não, discute-se se foi feita com IA, desviando o foco do que realmente importa: o impacto e a criatividade.
Como diz a Sara Soares, a nossa diretora criativa executiva, quem inventou a guitarra elétrica não inventou o ‘rock & roll’. Portanto, quem inventou a IA não vai inventar a publicidade feita com IA. Cabe-nos a nós utilizá-la da melhor forma. E não tenho dúvidas de que, daqui a dois, três ou quatro anos, ninguém estará a debater se algo foi ou não feito com IA. Esta tecnologia será apenas parte do processo criativo.

Indústria marcada por fusões
Como avalia o impacto das fusões que têm marcado as agências?
A lógica das fusões faz todo sentido num mundo onde os clientes valorizam cada vez mais a simplicidade e a integração de competências. O grupo WPP tinha um número excessivo de ‘networks’ e era essencial reduzir a complexidade, não apenas a visível, mas também a interna, por exemplo, a coordenação de contas e sistemas.
Nos últimos cinco anos, o grupo tem vindo a caminhar para a simplificação, o que se traduz em mais valor para os clientes. Em Portugal, esta estratégia resultou num modelo claro e eficiente.
Faz todo o sentido, por exemplo, continuarmos a ter duas agências criativas, pois a diversidade é essencial à criatividade. A VML e a Bar Ogilvy têm identidades distintas: nenhuma é melhor ou pior, são apenas diferentes. O foco continuará a ser a colaboração integrada entre as várias agências do WPP, maximizando o valor entregue aos clientes.
No que consiste essa integração?
O objetivo é oferecer soluções simples e integradas, para que os clientes não tenham de lidar com a complexidade. Recentemente, numa conversa com um cliente com quem estamos a negociar uma colaboração, percebi que ele trabalha com cinco agências diferentes para um único projeto.
Isso significa cinco equipas, cinco contactos e cinco abordagens distintas. Nesse caso, uma simples reunião de ‘briefing’ pode envolver 12 a 14 pessoas, cada uma com a sua visão.
A realidade é que o ecossistema do marketing e da comunicação se tornou demasiado complexo para os clientes gerirem sozinhos. Cabe-nos, enquanto agência, assumir essa complexidade internamente e simplificar os processos para os clientes. A integração das equipas e a utilização de sistemas como o WPP Open permitem-nos chegar aos clientes de forma mais eficiente e coordenada.
Qual é o impacto dessas fusões, a nível da criatividade e da rentabilidade?
O feedback dos nossos clientes após a fusão tem sido extremamente positivo. Tínhamos dois departamentos criativos relativamente pequenos, mas com identidades distintas. Agora, conseguimos mobilizar equipas muito maiores para responder a desafios estratégicos.
Se um cliente precisa de uma solução criativa, podemos ter seis duplas a trabalhar em simultâneo, o que não era possível anteriormente. Isso concede aos clientes um poder criativo muito maior, desde que haja capacidade financeira para o investimento.
Alguns clientes podem sentir a perda do romantismo de trabalhar com uma pequena agência independente, mas a realidade é que não somos essa pequena agência; somos um dos maiores departamentos criativos de Portugal. Temos diversidade de talento, com seis diretores criativos e uma diretora criativa executiva, o que nos permite oferecer múltiplas abordagens para cada desafio.
E a nível da rentabilidade?
Quanto maior formos, mais fácil será obtermos rentabilidade. O grupo é atualmente mais rentável do que era há quatro ou cinco anos, porque simplificámos bastante a nossa operação. Não apenas do ponto de vista dos custos estruturais, que são diluídos, mas também porque conseguimos um modelo operativo bastante mais eficiente e simples, que acrescenta mais valor aos clientes e que é mais fácil de rentabilizar, que é o que nos interessa.
Quais foram os desafios da integração das agências que resultam na VML Portugal?
Tratavam-se de duas agências bastante diferentes. A VMLY&R, bastante marcada criativamente pela Judite Mota, que fez um trabalho extraordinário na integração das duas agências e como diretora criativa executiva da VML durante o ano de concretização da fusão, e a Wunderman Thompson, que tinha uma identidade cultural mais internacional, com muita diversidade em termos de ferramentas, tecnologia, dados e CRM, e uma equipa criativa com quatro diretores criativos.
O que conseguimos fazer ao fundi-las foi crescer sem perder grande coisa. Temos uma equipa extraordinariamente motivada e que se identifica com a identidade da VML. As pessoas têm orgulho em trabalhar aqui e naquilo que queremos ser: um dos escritórios mais inspiradores da ‘network’. A fusão correu muito bem para ambas as agências, a ponto de pensarmos porque é que não fizemos isto mais cedo.
Houve obstáculos?
No início, qualquer fusão suscita receios. As pessoas preocupam-se com o seu trabalho e as duplicações suscitam sempre atenção. No entanto, numa equipa de 200 pessoas, conseguimos evitar grandes duplicidades. Claro que algumas áreas deixaram de fazer sentido, como a pequena equipa de media que a VMLY&R tinha, já que o grupo WPP tem agências de excelência nessa área.
Felizmente, conseguimos evitar um impacto emocional negativo, como acontece em algumas fusões em que há cortes drásticos de 20% ou 30%. Isso porque se tratou de uma fusão entre duas organizações em crescimento: a Wunderman Thompson estava a expandir-se e a VMLY&R também se encontrava estável. Quando as agências estão a crescer, a fusão tende a ser mais fácil. Se a fusão acontecer quando as agências estão a perder dinheiro e o objetivo é poupar, o processo pode ser traumático.
Em ano de fusão, contratámos mais colaboradores do que em qualquer outro ano dos últimos cinco, com 45 novas contratações. Após uma fusão, é necessário algum tempo para criarmos uma identidade única, sem as subidentidades de cada agência. No entanto, ficámos muito felizes quando chegámos à festa de Natal e vimos o impacto da fusão. Percebemos que tínhamos agora uma mega-agência. Só então considero que o processo de fusão foi concluído de facto.
Como é que a saída da Judite Mota afeta a estratégia criativa da agência?
A saída da Judite é sempre uma perda por tudo aquilo que a Judite é. A Judite esteve no grupo durante quase 30 anos. É, obviamente, uma perda para qualquer agência. Por outro lado, ficámos a ganhar muito com a entrada da Sara Soares, que é uma diretora criativa executiva extraordinária.
A Sara traz-nos a experiência e a profundidade internacional de que precisamos para continuar a crescer. Aceitou o desafio e, dois meses depois, não tenho dúvidas de que, pelo trabalho que as equipas têm estado a fazer e pelos resultados para os clientes, já é e continuará a ser uma diretora criativa executiva extraordinária.

A crescer 17% em 2024
Quanto cresceu e faturou a VML em 2024?
Em 2024, a nossa faturação aumentou 17%. Não posso adiantar valores, mas posso referir que as duas agências consolidadas (Wunderman Thompson e VMLY&R) cresceram, em média, 12% ao ano nos últimos cinco anos.
Qual é o peso da VML na faturação total do WPP em Portugal?
Não posso divulgar as percentagens do grupo, mas posso dizer que somos a segunda maior agência do grupo nesse sentido. Com um total de 460 pessoas, somos quase metade do número total de pessoas que trabalham no grupo WPP em Portugal. Acima de nós está apenas o GroupM.
Quais foram os clientes que mais contribuíram para o crescimento e faturação da agência em 2024?
Os clientes internacionais, como a Microsoft, a The Coca-Cola Company, o Tony Blair Institute, a Philip Morris, a Amazon e as organizações das Nações Unidas, foram os que mais contribuíram. Crescemos bastante com o Santander e com a Wells. A Vodafone não cresceu, tendo ficado estável, e os restantes clientes têm estado mais ou menos estáveis em Portugal.
Quais foram os acontecimentos e campanhas mais marcantes para a VML em 2024?
O trabalho que realizámos para a Vodafone, tanto a nível da marca como do âmbito comercial, é extraordinariamente aprofundado. A campanha de Natal da Vodafone é sempre a mais aguardada. Todos os outros anúncios de Natal são emitidos e, depois, há o da Vodafone, que é sempre o que todos querem ver.
Um dos projetos de que mais me orgulho, e no qual estive envolvido desde o início na relação com o cliente, é o que fizemos para a Wells. A campanha ‘Não Fica Bem’ teve o poder de transformar profundamente uma marca que, anteriormente, era distante e pouco conectada com as pessoas, especialmente com as mulheres.
Hoje, a marca é algo com a qual qualquer mulher se orgulha de se identificar, o que é um privilégio. A campanha de Black Friday da Leroy Merlin foi, pelo contrário, um trabalho leve e bem-humorado, mas que trouxe resultados extraordinários para o cliente, o que também é muito importante.
Pessoalmente, o projeto de que mais me orgulho é o trabalho que estamos a fazer para um consórcio liderado pela Unicef. Estamos a combater a desinformação sobre a vacinação contra a poliomielite em regiões onde a doença ainda é endémica, como o Quénia, o Corno de África, a República Centro-Africana, o Afeganistão e o Paquistão.
Foi um ano bom em termos de prémios?
Conquistámos o prémio de Agência Criativa do Ano nos Prémios Eficácia, onde ainda obtivemos três Ouros, quatro Pratas e três Bronzes. Nos Prémios CCP, ganhámos um Ouro, duas Pratas e sete Bronzes. Infelizmente, não ganhámos em Cannes, mas diria que quase todo o trabalho de 2024 não foi a concurso.
Na prática só o trabalho feito até março/abril é que conseguiu entrar nesse concurso. Portanto, os grandes concursos criativos começam agora com o trabalho de 2024 e temos muita esperança para esses trabalhos.
Quais são as perspetivas de crescimento e os próximos projetos da VML em 2025?
Continuamos a prever um crescimento de 15% ao ano. Perspetivamos sucesso criativo, que é algo em que estamos focados, e receber o reconhecimento do mercado, porque às vezes falta o reconhecimento. Não há uma categoria para avaliar o trabalho que temos feito com a Vodafone e a Wells, entre outras. É um trabalho de consistência de marca, e até agora não havia uma categoria para isso. Pela primeira vez já existe, em Cannes.
Quanto aos próximos projetos, queremos continuar a apostar nas áreas que nos distinguem internacionalmente, aumentar a presença nesses projetos, trabalhar com as melhores marcas portuguesas em várias áreas, desde a criatividade ao ‘ecommerce’. Estamos empenhados em fazer isso porque acreditamos que estamos aqui para desenvolver as pessoas que trabalham connosco e gerar alguma rentabilidade ao acionista.
Criatividade portuguesa tem de se virar para o marQuais são as oportunidades que antevê no mercado publicitário nacional? Em termos de oportunidades, é levar o nosso talento ao palco internacional para ser cada vez mais reconhecido. Este ano, em Cannes, fiquei a par de uma coisa, a existência da Associação de Criativos da Holanda. O meu sonho é que um dia houvesse em Cannes uma entidade semelhante que congregasse os anunciantes e os criativos portugueses, a defender o nosso potencial criativo global. É possível esse sonho concretizar-se? Acredito que sim. É uma oportunidade extraordinária para todas as agências do mercado. Não só as internacionais, que obviamente podem ter mais alguma facilidade de acesso, mas também as agências independentes. Como diria Agostinho da Silva, temos de nos virar para o mar. Temos tido sucesso e acho que este é o momento da criatividade portuguesa se virar para o mar. E os desafios? A questão da escala e da rentabilidade. É difícil ver que os nossos clientes não querem necessariamente fazer menos – até acho que querem fazer mais -, mas têm de dividir os orçamentos por cada vez mais áreas, o que significa que o orçamento de cada agência é mais pequeno, mas estas são cada vez maiores. Se pensarmos no volume dos orçamentos de comunicação de há dez anos, por exemplo, eram muito maiores. Não é porque os nossos clientes queiram necessariamente, mas porque é a realidade dos negócios atualmente em Portugal. Marcas e grupos de consumidores mais pequenos significam orçamentos mais reduzidos. Porém, isso cria desafios à própria existência e sobrevivência de algumas agências. Esse é o desafio. |