‘Brain rot’: a palavra do ano e o vazio de conteúdo da comunicação das marcas
“Muitas campanhas são impulsionadas pela necessidade de produzir grandes volumes de conteúdo para manter a visibilidade, muitas vezes em detrimento da profundidade e do valor”, aponta a GrowthRocks, apelando a que haja a garantia que “a atenção que captam conduz a algo que valha a pena”
Luis Batista Gonçalves
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A designação ‘brain rot’ é não só eleita a Palavra do Ano 2024 pelo dicionário Oxford, como está a determinar a forma como as marcas e os influenciadores estão a traçar as estratégias de marketing e o estilo de conteúdos digitais.
Definida no dicionário Oxford como “uma alegada deterioração do estado mental ou intelectual, como resultado do consumo excessivo de material, particularmente conteúdo online, considerado de baixa qualidade” ou “podridão do cérebro”, em tradução simples, ‘brain rot’ também é sinónimo de um tipo de comunicação, que rende visualizações nas redes sociais e inspira a criação de produtos e formatos, que contribuem para o crescimento da superficialidade e vazio nas redes sociais.
“O termo ‘brain rot’ refere-se a um dos perigos da vida virtual e à forma como estamos a desperdiçar o nosso tempo livre, abrindo portas para uma discussão necessária sobre a humanidade e o tecnologia. Não é, por isso, surpreendente que tantos votantes tenham apontado o termo, endossando-o como a nossa escolha este ano”, argumenta Casper Grathwohl, presidente da Oxford Languages, a maior editora mundial de dicionários, citado no The Guardian.
Entre janeiro e dezembro, o uso da expressão ‘brain rot’ aumenta 230%, com a sua utilização a crescer no TikTok e a proliferação de formatos de vídeos curtos e a multiplicação de ‘memes’ a serem apontadas como algumas das causas para o fenómeno de empobrecimento cultural, iniciado com a massificação das redes sociais.
Nos Estados Unidos, onde a média nacional diária de consumo digital ronda as três horas, o ‘brain rot’ transita das redes sociais e da informação para o universo das webséries. Um dos exemplos é ‘Skibidi Toilet’, série digital popularizada no YouTube, protagonizada por um exército de sanitas que tenta dominar o planeta.
O sucesso desta produção nonsense, que atrai a atenção de marcas como Amazon, Target e Walmart, dará origem em 2025 a uma ‘skin’ do jogo Fortnite, abrindo portas a novas colaborações, noticia a Forbes. Em outubro, em parceria com a Bonkers Toys, o Invisible Narratives, estúdio que produziu a websérie, lançou uma coleção de brinquedos que regista uma grande procura durante o Natal, segundo a Ad Age.
A Marc Jacobs é outra das marcas que tem vindo a explorar a tendência lançada pela mediatização do ‘brain rot’, marcada pelo estilo de comunicação e vazio de conteúdo. Além de uma paródia à cantora Sabrina Carpenter desenvolvida em parceria com os criadores de conteúdos Noah Millz e Laundry Day Boys, gerou mais de 43 milhões de visualizações no TikTok, desde junho, com vídeos protagonizados por personalidades que ganham visibilidade nas redes sociais. O vídeo em que a influenciadora Amira Bappe promove a marca enquanto leva com baldes de água é outro dos mais vistos.
Nos Estados Unidos, as marcas Nutter Butter e Sour Patch Kids também têm recorrido ao TikTok para promover os produtos que comercializam, com a fabricante de guloseimas a partilhar vídeos protagonizados por figuras de gomas a gritar para o vazio. A aplicação móvel Duolingo é outra das que está a recorrer aos ‘memes’ no TikTok, com alguns dos vídeos partilhados a ultrapassarem os 68 milhões de visualizações e 6,6 milhões de interações.
A Netflix, por seu lado, aposta em campanhas com ‘memes’ para promover séries e filmes, tal como a Microsoft Teams e a Wendy na rede social X, numa altura em que a Adobe promove um concurso de ‘memes’. ‘Dancing Pandas Don’t Sell CRMs, LinkedIn Ads Do’, campanha humorística do LinkedIn, também é catalogada como ‘brain rot’.
A aposta no ‘brain rot’ não é consensual, com agentes do setor do marketing e da publicidade, como a GrowthRocks, a apelar a uma reflexão urgente. “Muitas campanhas são impulsionadas pela necessidade de produzir grandes volumes de conteúdo para manter a visibilidade, muitas vezes em detrimento da profundidade e do valor. Esta pressão força os profissionais de marketing a priorizar resultados rápidos e métricas de envolvimento em vez de interações significativas”, aponta a agência de marketing de ‘hacking’ de crescimento, apelando a uma valorização da autenticidade.
“Os profissionais de marketing não precisam de rejeitar estratégias que despertam interesse nos consumidores, até porque captar a atenção é um aspeto essencial do trabalho que desenvolvem. Mas devem garantir que a atenção que captam conduz a algo que valha a pena”, recomenda a GrowthRocks.
Causado pela adição que leva milhões de pessoas em todo o mundo a passar horas a fazer ‘scroll’ nos telemóveis e nos tablets, a consumir conteúdos superficiais, o ‘brain rot’ afeta utilizadores de todas as idades. No entanto, segundo um estudo do Ofcom, as mulheres da geração Z são as mais dependentes, chegando a passar cerca de sete horas a navegar nas redes sociais, nos sites informativos e nas plataformas de comércio eletrónico, mais duas horas do que os homens.
O número de horas que as crianças entre os oito e os dez anos passam nas redes sociais, a consumir conteúdos de baixa qualidade, está a disparar, com vários estudos internacionais a apontar para períodos médios de exposição a rondar as quatro horas. Com a entrada na adolescência, o grau de dependência tende a aumentar, potenciando o ‘brain rot’.
Segundo o estudo do Ofcom, que monitorizou a atividade digital de dez mil consumidores, 75% dos utilizadores entre os 18 e os 24 anos passa, em média, 64 minutos por dia no TikTok, mais nove minutos do que em 2023. A utilização de Snapchat, outra das aplicações que tem aumentado a divulgação de conteúdos de fraca qualidade, ocupa-lhes mais 55 minutos. “O tempo que dedicam ao YouTube também é considerável”, sublinha Ian Macrae, investigador do Ofcom, citado no The Telegraph.