“Já ninguém quer só designers, marketeers ou programadores”
Como as novas gerações e o cruzamento de disciplinas estão a mudar o IADE, nas palavras do seu director Carlos Rosa Numa altura em que o IADE assinala meio século […]
Rui Oliveira Marques
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Como as novas gerações e o cruzamento de disciplinas estão a mudar o IADE, nas palavras do seu director Carlos Rosa
Numa altura em que o IADE assinala meio século de existência, é hora de olhar para a forma como perspectiva o ensino do design, marketing e publicidade. Fundada por António Quadros em 1969, a instituição apresenta-se agora como IADE – Faculdade de Design, Tecnologia e Comunicação da Universidade Europeia (UE), após a sua compra por parte do grupo Laureate International Universities.
Meios & Publicidade (M&P): O IADE começou, há 50 anos, como uma escola de decoradores. O curso criado mais recentemente é o da licenciatura em Creative Technologies, com uma designação que já não é em português. Como é que pode evoluir esta instituição nos próximos anos?
Carlos Rosa (CR): Se fôssemos nós a criar as novas tendências ou a inventar o futuro seria maravilhoso. A criatividade está agora nos sítios de fronteira. Creative Technologies é um pouco isso: a tradução do que pode ser o futuro e o desenho da escola. Temos duas opções, ou apontamos para o centro das áreas científicas e fazemos crescer o design, marketing, comunicação e tecnologia como cursos tradicionais ou olhamos para as intersecções entre essas áreas para percebermos onde podemos criar inovação e ditar tendências. O Creative Technologies constrói-se na fronteira entre a tecnologia e o design e vai absorver alunos das artes, da matemática, da física e da programação.
M&P: A leitura do que é o design está a mudar muito rapidamente.
CR: Estamos muito seguros do que estamos a fazer mas a incerteza é gigantesca. Além da licenciatura temos um mestrado em aprovação que é também construído numa linha que divide duas áreas científicas. Quando montamos estes programas chamamos os parceiros do mercado para termos uma ideia mais fiel do que está a acontecer e de quais são as necessidades do mercado. Já ninguém quer só designers, marketeers ou programadores.
M&P: Os alunos estão conscientes disso?
CR: Que alunos? Os que estão cá ou os que nós queremos absorver? Será que os miúdos de 17, 18 anos, que são aqueles que vão escolher estas licenciaturas, estão conscientes de que aquele poderá ser o seu futuro na criatividade? O feedback que temos por parte do mercado é fantástico porque querem já os miúdos. O problema é que demorámos um ano a montar a licenciatura, um ano a aprová-la, e mais três para saírem os primeiros licenciados. Ao fim de quatro ou cinco anos, se calhar, já não é assim tão inovador. A criatividade é uma área em que a mudança anda a um ritmo mais acelerado do que noutras áreas. Quando somamos o vector da tecnologia a velocidade aumenta ainda mais.
M&P: Qual é a licenciatura mais procurada?
CR: A licenciatura que põe mais alunos é a de Marketing e Publicidade. A área científica do IADE mais procurada e que põe mais alunos continua a ser a área de Design porque temos mestrados e duas licenciaturas na área: Design e Design Global. O IADE tem cerca de 2500 alunos. A licenciatura de Marketing e Publicidade coloca 300 alunos por ano.
M&P: Estão a contar com alguma transformação nos próximos anos?
CR: Temos de estar de acordo com o que os miúdos querem para os seus cursos e de acordo com o que as empresas, agências, ateliers e marcas pretendem para o seu desenvolvimento empresarial. Não podemos ensinar Design como quando o IADE nasceu ou como se ensinava Marketing e Publicidade nos anos 90.
M&P: No ano passado assinava um artigo de opinião no M&P com o título “O poder do design gráfico: curar o mundo, combater a vulgaridade e ficar na História”, uma descrição que corresponde à ideia idílica da disciplina…
CR: Se tivesse de escrever hoje, escrevia a mesma coisa. O design gráfico já não é só fazer o poster. O design de produto já não é só fazer um par de óculos ou uma cadeira. Também o é, mas há caminhos no design que temos de olhar com muita atenção. Se não nos reinventarmos vamos ficar denotados como uma escola antiga, tradicional, conservadora e isso não é interessante para as escolas de criatividade, que devem ser escolas de vanguarda. O IADE sempre o foi, estava já a ensinar design não podendo ter o nome design no curso. Cinquenta anos depois damo-nos ao luxo de abrir licenciaturas em inglês, com aulas em inglês.
M&P: Em que ponto está a captação de alunos estrangeiros?
CR: É um problema porque temos demasiados. Este ano vamos ter de reduzir o número de Erasmus porque está a vir demasiada gente e isso cria-nos alguns problemas. Não queremos prestar um mau serviço aos alunos. Neste ano lectivo recebemos cerca de 160 alunos no primeiro trimestre e 120 no segundo. Depois temos uma percentagem muito grande de estudantes internacionais residentes que são 10 por cento do total, sendo que o IADE tem 2500 alunos. O IADE já percebeu que não há mais ninguém para absorver no mercado internacional. A escola já é líder, já preenche as suas vagas todos os anos.
M&P: Então como pode crescer em termos de alunos?
CR: Há duas hipóteses. Ou vamos roubar alunos às outras escolas de design do país, o que não é interessante porque se não houver uma concorrência forte não seremos tão bons. É bom haver um Ronaldo e um Messi ao mesmo tempo. Agora, claramente, o mundo internacional é muito atractivo. Montou-se uma equipa para trazer alunos que está focada só no mercado internacional. O reflexo disso está no curso de doutoramento que tem uma percentagem superior de estudantes internacionais face aos estudantes nacionais.
M&P: A nível internacional o IADE está bem cotado?
CR: Diria que sim. O IADE conseguiu a distinção da revista Domus como uma das melhores escolas de design da Europa. Está a atrair muitos estudantes brasileiros mas também italianos, que são de um país que é referência no design e que escolhem vir estudar para Lisboa. Depois há muitos que vêm fazer Erasmus e depois voltam para fazer mestrado. O IADE tem tudo para ser uma escola de referência no contexto europeu.
M&P: Lisboa, à parte da questão de a cidade “estar na moda”, tem um ecossistema atractivo para as áreas criativas?
CR: Sem dúvida e o IADE tem aqui um diamante em bruto para lapidar, com esta combinação do design, comunicação e tecnologia. Ao nível de investigação interessa-nos fazer investigação aplicada. Interessa-nos que a nossa investigação esteja ligada a um projecto, que dê origem a um produto. Não é fazer um estudo comparativo com um gráfico bonito. Interessa-nos que dê origem a um objecto inovador. A partir do objecto pode-se fazer um segundo estudo de aceitação, de utilização ou de empatia. De forma arrogante, queremos fazer o que faz o MIT, apesar de estarmos muito longe disso. Em Portugal talvez possamos ser a instituição que, não sei se é a que está mais perto disso, que tem os ingredientes certos para chegar a essa dimensão inovadora do que pode ser o mundo dos objectos físicos, visuais e interfaces. Nos anos 90 o IADE formou 100 por cento dos art directors, dos directores criativos e dos accounts das agências em Lisboa. Foi uma época em que a publicidade e o design estavam em alta.
M&P: Os actuais alunos de design, marketing e publicidade querem ir trabalhar para agências?
CR: Começam a ter uma postura diferente perante o mercado de trabalho. Já não estão focados em entrar numa grande agência para trabalhar grandes contas. Há uma veia, não sei se é empreendedora, mas sinto que cada vez mais os miúdos estão focados em fazer trabalhos à peça, projecto a projecto. Há muitos ex-alunos que nos últimos cinco ou seis anos têm trabalhado assim. Não são funcionários de uma agência mas trabalham para todas. São criativos em nome individual ou criativos independentes.
M&P: Em que tipo de empresas querem trabalhar estes alunos?
CR: Querem trabalhar em nome individual, querem mais fazer o que os diverte do que pensar numa grande agência. Esta geração não é igual à dos anos 90. Sou dessa geração e, nessa altura, toda a gente queria ir para grandes empresas de design e publicidade da altura, como a BBDO, Novodesign. Hoje percebe-se que os alunos têm como referência designers em nome individual. Levam para as aulas nomes desconhecidos porque a internet nos deixa chegar a novos sítios, as referências são cada vez mais díspares.
M&P: Criaram um departamento chamado Fábrica. Em termos práticos é o quê?
CR: É um organismo que tem vários braços e que ajuda a que a máquina do IADE se desenvolva mais rapidamente. O IADE tem na sua estrutura programas lectivos e a unidade de investigação. A ideia é que a Fábrica consiga alimentar a unidade de investigação. Definimos três linhas de actuação para a Fábrica. Uma é a de projectos especulativos que não têm concretização. Depois temos a fabricação paralela que acompanha as áreas curriculares, como por exemplo o desafio que lançámos à Catarina Carvalho, directora executiva do Diário de Notícias [para redesenhar uma edição do jornal], o que fizemos com o Banco Alimentar no ano passado ou o que temos fechado para o início do próximo ano lectivo com a Cruz Vermelha. Depois temos a fabricação do futuro que é o que queremos fazer em paralelo com a unidade de investigação, que é alimentar a investigação aplicada, de forma a que o IADE comece a ser olhado não só pela sua inovação em termos de programas curriculares mas também por acrescentar valor no quotidiano, com novos produtos e serviços. Abrimos ainda o Observatório, que é uma espécie de CSI para o ensino superior para recolher crenças e atitudes dos miúdos entre os 15 e os 17 anos de forma a desenhar os programas adequados. O segundo vector do Observatório é o do contexto empresarial, nomeadamente o que querem e precisam as empresas e como se vêem daqui a 10 anos. Não queremos trazer alunos dos liceus nem arranjar empregos com estas relações. Trata-se de trazer informação, dados, para perceber que ajustes temos de fazer nas unidades curriculares.
M&P: Como vê o interesse de as empresas entregarem briefings às universidades para recolherem ideias ou desenvolverem projectos concretos?
CR: As empresas têm esse interesse porque têm a frescura e irreverência dos jovens, a par da massa crítica. Se uma empresa vier ao IADE injectar um projecto num mestrado em Design e Cultura Visual são logo 120 a 130 alunos. Se trabalhar em modelos individuais são 120 propostas. É vantajoso para as empresas terem esta ligação para as universidades. Ainda por cima, há a ideia de que ir à universidade é mais barato do que ir a um atelier ou a uma agência. Mas, porque é que é mais barato? Devemos fazer prestação de serviços enquanto instituição? Fazendo, porque devemos cobrar menos do que um atelier? A pergunta crítica é se devemos fazer ou não esses projectos. É que, fazendo, temos de ter uma postura diferente da do modelo de agência. Quem vem pedir um livro, marca ou objecto a uma universidade tem de vir de uma forma diferente da que pede a um atelier.
M&P: No limite a universidade está a concorrer…
CR: Com os seus antigos alunos. Quando estou a aceitar trabalho, estou a tirá-lo àqueles que ajudei a formar. Não faz sentido.
M&P: Chegam cá muitas propostas de empresas?
CR: Demasiadas. Mas se me perguntar se quero fazer prestação de serviços respondo que, se calhar, quero mas não nesta óptica da criatividade e comunicação que se faz numa empresa. Temos cá as áreas científicas, o corpo docente e volume. Mas somos nós que definimos o timing. Na agência o cliente pede o projecto para ontem. Aqui definimos nós o timing porque queremos que se enquadre, por exemplo, na lógica de um mestrado.
M&P: Que implicações tem no quotidiano da escola e dos alunos o facto de o IADE integrar uma multinacional do ensino?
CR: Não muda nada. Como instituição privada, significa que temos um proprietário.
M&P: Em que ponto está a permanência neste edifício em Santos? Saíram notícias de que tinha sido vendido.
CR: Sim, mas ficamos aqui mais sete anos.