‘As agências têm de estar um passo à frente da linguagem do consumidor’
Após 18 anos na Multivária, onde desenvolveu estudos em vários mercados para clientes de praticamente todos os sectores, João Dionísio assumiu a função de chief operator officer do grupo Strat.
Rui Oliveira Marques
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Após 18 anos na Multivária, onde desenvolveu estudos em vários mercados para clientes de praticamente todos os sectores, João Dionísio assumiu a função de chief operator officer do grupo Strat. Em entrevista, o responsável explica o trabalho que tem em mãos.
Meios & Publicidade (M&P): Entrou na Strat com a função de integrar as várias áreas da empresa, numa altura em que as outras agências estão também a vender integração. A Strat quer agora vender mais serviços aos seus clientes?
João Dionísio (JD): A minha vida profissional foi toda centrada em compreender o mercado, o consumidor e os clientes. Vivi muitos anos no terreno a ouvir pessoas e clientes, alguns dos quais são actuais clientes da Strat. Isso significa que desenvolvi uma enorme sensibilidade, não só em relação ao consumidor, mas em relação à aplicação estratégica das necessidades das pessoas. Quando venho para a Strat é um pouco como herdeiro deste conhecimento e sensibilidade. O que significa isto para a Strat? Traduzir e englobar o mais possível a linguagem do consumidor em tudo o que são os processos de tomada de decisão criativos da agência. Ou seja, que tudo o que se faz traduza o que se passa na rua e na cabeça do consumidor.
M&P: Quando estava do lado dos estudos de mercado, considerava que as agências estavam divorciadas da realidade dos consumidores?
JD: Não achei que estivessem divorciadas, pelo contrário, as agências trabalham numa área absolutamente sensível. Em 1993 fiz um grande projecto pessoal que foi ouvir directores criativos de agências de publicidade. Fiz um estudo que depois deu origem a uma comunicação num congresso sobre as suas conclusões. Percebi então que não estavam desligados, mas que é muito exigente o papel de interpretar de uma forma criativa, apelativa e excitante aquilo que se passa na realidade. Mais: conseguir que as suas ideias sejam englobadas e integradas nas estratégias dos clientes. A agência são sempre três entidades: o cliente, os clientes dos clientes e a própria agência. É esta complexidade que torna este trabalho engraçado.
M&P: Mas existe muitas vezes a queixa de que as agências não se dirigem a consumidores reais, mas sim a estereótipos que não têm correspondência com a realidade. Concorda?
JD: As agências de publicidade têm de estar obrigatoriamente um passo à frente da linguagem do consumidor. Se não, esvaziam-se da sua função. Normalmente as empresas trabalham em cima das motivações e das necessidades dos consumidores. Se se fica apenas em responder às necessidades e às motivações, não se é diferenciador. Cabe às agências de publicidade e aos departamentos de desenvolvimento das próprias empresas satisfazer as necessidades que existem mas redescobrir novas necessidades. A arte das agências é essa: descobrir o plus diferenciador. A agência tem de conseguir, em cima da linguagem do consumidor, induzir novidade, surpresa.
M&P: Voltando ao início, é difícil vender integração ou mais serviços aos clientes?
JD: A primeira componente da integração é a estratégia. A segunda componente é fazer com que essa estratégia se traduza em ideias criativas mais eficazes para os clientes. Por causa da actual conjuntura, o mercado está a viver momentos de grande desafio porque vai ter de redescobrir e reinventar os processos de trabalho e novas formas de actuação. Tem de haver um discurso de pro-actividade, um discurso de imaginação e de reinvenção. Isso tem a ver com várias coisas. O mercado está mais agressivo. Os clientes estão também mais exigentes, não só em termos financeiros, mas também em termos de criatividade. Também vivemos tempos multimédia em que as pessoas são mais rapidamente impactadas pelos novos meios. Vivemos num mundo em que os clichés se quebraram. O futebol é para pessoas X? A net é para nerds ou para cidadãos normais?
M&P: Traduzindo isso para a vida de uma agência, significa o quê?
JD: Dar maior atenção à complexidade na qual se tornaram os processos de tomada de decisão dos clientes. Segundo: a capacidade em ser inovador. E muitas vezes confunde-se a inovação dos meios com a própria inovação da criatividade e das propostas. Não chega usar os meios inovadores para ser criativo em cima desses meios. Há ainda uma terceira componente: ser eficaz internamente, isto é, conseguir com os recursos que se tem que essas pessoas tomem as decisões certas para que o seu trabalho seja o mais eficaz possível. É isto que venho para cá fazer: aportar e reforçar a visão da estratégia, articular as diferentes valências da comunicação e influenciar a organização interna, ao nível dos procedimentos e organização, para que o que saia seja mais eficaz.
M&P: As agências do grupo já trabalham de forma integrada?
JD: Estou cá há três meses. Já sou o pico visível do icebergue. Houve um trabalho de organização e reajustamento, isso não é nada de extraordinário. É o que as empresas fazem ao longo do seu percurso. Não há espaço nem tempo para estar cristalizado.
M&P: Pode dar-me exemplos de trabalhos em que esteja já em implementação esta filosofia?
JD: Não lhe vou dar nenhum exemplo por questões de confidencialidade. Pode ser uma questão de dias ou de meses até serem conhecidos. O que vai ver na rua é cada vez mais resultado dessa integração. Aos nossos clientes estamos já a oferecer isso. Em termos de new business é cada vez mais essa a visão. É preciso não confundir a integração operacional de todas as áreas com a perda de especialização. É muito importante que a agência consiga este equilíbrio: oferecer a panóplia de soluções para os clientes com os especialistas em cada área. É importante que os clientes saibam que encontram soluções para cada uma das dimensões, mas a proposta de princípio é oferece-las integradas.
M&P: No curto prazo está prevista a criação de uma nova unidade dentro do grupo?
JD: A Strat não vai criar nenhuma unidade formal, mas pode incluir nas suas funções competências específicas. Se calhar, não vai ter ninguém a trabalhar num departamento de branding, mas o branding faz parte das suas competências. Não vai haver um departamento de marketing experencial mas não vamos perder essa oportunidade. Não vamos criar um departamento de arquitectura de espaços comerciais mas é uma área em que estamos interessadíssimos e em que vamos desenvolver todas as competências. O perigo do integrado é que ficamos por três ou quatro palavras: publicidade, design ou web, mas na prática o integrado é muito mais do que isto, já que vai desde os espaços comerciais ao neuromarkting.
M&P: O grupo é competitivo em termos de integração?
JD: É. Internacionalmente as experiências que se fazem, e há aqui uma componente de experiência, teste e provocação, vão neste sentido. Independentemente de estruturalmente se assumir mais ou menos integração, a capacidade de oferecer diversidade e de integrar essa diversidade nas soluções para os clientes é a grande tendência. A Strat é competitiva? É isso que queremos e apesar de outras agências também o dizerem, acho que temos capacidade em nos diferenciarmos.
M&P: Dá aulas sobre comportamento do consumidor na Escola de Gestão do Porto. Que lições deu à agência sobre este assunto?
JD: Em termos funcionais, a Strat sempre teve uma fortíssima aposta no planeamento estratégico. Sempre esteve muito presente nas propostas apresentadas aos clientes. Não encontrei na Strat tanta necessidade assim de aulas sobre comportamento do consumidor. A empresa, culturalmente, já tinha cá dentro uma cultura do consumidor. O que se fez? Houve também a entrada de uma pessoa para o planeamento estratégico e começamos a uniformizar procedimentos em termos de briefing e de discurso. Foi mais uma revisão da forma como o consumidor aparece nas propostas. Acredito em mensagens mais directas, em insights mais objectiváveis, mas não foi aí que foram as grandes mudanças.
M&P: Porque decidiu deixar os estudos de mercado?
JD: Quando se anda, como eu andei, 19 anos a ouvir pessoas e o mercado, chega a uma altura em que há necessidade de implementação. O grande desafio é pegar no conhecimentos adquirido e gerar coisas. A minha motivação em vir para a Strat foi aplicar e operacionalizar coisas que pesquisei ao longo destes anos. Conheço a Strat quase desde o início da minha carreira porque trabalhamos sempre Super Bock em equipa. Há aqui um factor entusiasmo, mas também sou realista. Conheço bem esta estrutura.