Uma lei para todas as estações?
Poderá não ser o projecto ideal, mas a actual “proposta como está representa um avanço face à Lei actual”.
Ana Marcela
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Poderá não ser o projecto ideal, mas a actual “proposta como está representa um avanço face à Lei actual”. A avaliação é de José Faustino, presidente da direcção da Associação Portuguesa de Radiodifusão (APR), referindo-se ao novo projecto de Lei da Rádio que chega à discussão pública depois de um longo processo negocial com os parceiros. E o mesmo diz Nuno Inácio, presidente da Associação de Rádios de Inspiração Cristã (ARIC). “Não é o documento ideal, mas é muito melhor do que o que temos hoje”, afirma. “Só depois de receber os contributos dos diversos associados é que a Confederação de Meios se irá pronunciar [sobre o projecto-lei]”, afirmou ao M&P, por seu turno, Rui Ramos Pereira, secretário-geral da Confederação Portuguesa de Meios de Comunicação Social, organismo que do sector radiofónico além da APR, tem como associados a Rádio Comercial, da Media Capital Rádios, e o grupo R/com. Este último também se escusou, pelo menos por agora, a pronunciar-se. “Só tomaremos uma posição pública na próxima semana”, afirmou José Luís Ramos Pinheiro, administrador do R/com, grupo que detém a RFM, Renascença, Mega Hits e a Rádio Sim. “Em termos globais a Lei é positiva”, diz, por seu lado Jordi Jordà, director-geral da MCR, frisando que a nova proposta “adapta-se muito mais à realidade actual”. “Facilita muito mais a vida ao sector”, considera. Até 19 de Abril os parceiros farão chegar ao ministro dos Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão, os seus contributos sobre a nova proposta de Lei.
O sector rádio foi uma das áreas que fugiu à ‘fúria legislativa’ do primeiro governo de José Sócrates, não tendo a Lei datada de 23 de Fevereiro de 2001 sofrido alterações de fundo, mesmo com as modificações introduzidas a 22 de Agosto de 2003 com a Lei que aprova a reestruturação do sector empresarial do Estado na área audiovisual ou com as quotas de música portuguesa, questão introduzida com a Lei nº 7/2006 de 3 de Março. Quase uma década depois da Lei base, o sector tem em cima da mesa uma proposta de Lei que, de acordo com o projecto a que o M&P teve acesso – e que os operadores ao que apuramos se preparam para discutir em conjunto na próxima segunda-feira -, faz algumas alterações em pontos há muito reivindicados pelo sector, documento que o próprio legislador reconhece que requeria actualização. “O quadro normativo da rádio carece de actualização, reclamando a criação de oportunidades para a qualificação e desenvolvimento da actividade, e de melhores condições para que os operadores de rádio possam adaptar-se ao dinamismo do mercado”, justifica o legislador na Exposição de Motivos. Para isso, diz, “torna-se necessário proceder, num quadro geral de transparência quanto à titularidade dos alvarás, ao incentivo de novas formas de colaboração e partilha de recursos entre rádios, de que possam beneficiar particularmente as rádios locais”.
O regime de propriedade foi naturalmente um dos pontos objecto de alteração. De apenas cinco licenças em todo o território nacional, uma pessoa singular ou colectiva poderá possuir até 10 por cento do total de licenças de serviços de programas de rádios locais atribuídas em todo o país, o que significa que, sendo actualmente mais de 300 o número de rádios locais, o número de estações que podem ser detidas pela mesma entidade aumenta substancialmente. A mudança é, de resto, justificada na Exposição de Motivos do diploma, pela constatação de que a anterior previsão sobre o regime de propriedade era “despida de racionalidade económica”, não favorecendo “o surgimento de projectos estruturados e consistentes, sobretudo ao nível das rádios locais”, procurando-se com esta alteração colocar um limite “mais realista e conforme ao desiderato de fomentar o profissionalismo no sector”. Jordi Jordà acolheu de forma positiva esta flexibilização do regime de propriedade, considerando que esta maior abertura não só facilita a vida dos operadores já no mercado, como poderá dar origem a “outros grupos”. Nuno Inácio, por seu turno, admite que a nova proposta “abre mais o mercado da rádio do ponto de vista empresarial”, podendo ser “uma solução interessante para alguns operadores de rádio”, embora considere que “não é o futuro”. Quanto aos novos limites, irão “permitir a alguns empresários que estão no mercado legalizar situações já existentes”, comenta sem precisar casos.
O bom e o mau da nova proposta de Lei
A questão de fomentar o mercado de rádio, dando condições de desenvolvimento do segmento das rádios locais, é igualmente referida no diploma que mexe em questões como a emissão em cadeia (ver caixa) e “possibilita a transmissão de alvarás em relação às associações e entidades não comerciais”, ponto destacado por José Faustino. O fim da obrigatoriedade de pelo menos uma frequência em cada município estar afecta a um serviço de programas generalista é também uma alteração vista como positiva pelo responsável da APR, bem como por Jordi Jordà que destaca a maior liberdade de programação. “O produto rádio vai ganhar em muito, tanto para o operador, como para o ouvinte”, argumenta. Já Nuno Inácio, da ARIC, tem uma visão distinta considerando que isso poderá “desvirtuar” o princípio das rádios locais. Contudo, considera que o facto da nova proposta ainda manter “a obrigatoriedade de um número de horas de produção local e noticiários com informação local”, embora em número mais reduzido, ajuda a “manter o conceito das rádios locais”, mas ressalva: “Haja capacidade das entidades de fiscalização em garantir o seu cumprimento, o que antes não conseguiam.”
As duas associações dividem-se todavia no que se refere ao facto de um operador não poder possuir mais de 50 por cento das licenças atribuídas na mesma área de cobertura, distrito, área metropolitana ou, no caso das Regiões Autónomas, ilha. A APR não está de acordo com esta limitação, estando a equacionar propor uma nova fórmula de cálculo, que prefere ainda não detalhar. Já Nuno Inácio considera que esta limitação é “uma garantia de pluralismo de informação”. “É como se a SIC e a TVI fossem do mesmo proprietário. É uma garantia de que não há excesso de concentração de meios”, argumenta, uma linha de racicionínio partilhada pelo director-geral da MCR que considera que este limite impede “excesso de concentração”.
A proposta de Lei contempla aspectos relativos ao financiamento que, pode ler-se na Exposição de Motivos, visam “introduzir maior transparência nos auxílios atribuídos pelos municípios, afastando riscos de condicionamento da independência das rádios locais”. De acordo com o projecto, o financiamento por autarquias locais a operações radiofónicas é permitido, contudo, com a ressalva de que o mesmo terá de ser aprovado “por decisão de maioria de dois terços dos deputados municipais eleitos”. Nuno Inácio destaca o facto do novo diploma ter referências específicas ao sector radiofónico das regiões autónomas – um assunto caro à ARIC, já que dos cerca de 70 associados, 15 são rádios dos arquipélagos dos Açores e da Madeira – dando a possibilidade das estações locais não terem a sua frequência restringida a um concelho, possibilitando que se estenda a toda a ilha. “Algo que permite que estações situadas em concelhos com baixa densidade de população possam ter capacidade de sobrevivência”, considera. As rádios locais também viram o seu ‘estatuto’ reconhecido nas coimas impostas pelo regime sancionatório, já que os ilícitos quando cometidos por estações locais, vêem reduzido para um terço o montante máximo das contra-ordenações. Outros aspectos, como uma melhor clarificação da qualificação profissional necessária dos profissionais de rádio, a renovação dos alvarás ser feita no âmbito de uma avaliação do desenvolvimento da concessão e não de “uma avaliação oportunista” ou a harmonização dos perídos de licença entre a Anacom e a ERC para os 15 anos foram igualmente destacados como positivos pelas fontes ouvidas pelo M&P.
Nuno Inácio mostra-se particularmente crítico no que se refere às quotas de música. Apesar da proposta colocar no sector privado a quota nos 25 por cento (o patamar mínimo), para Nuno Inácio a própria ideia da quota “não faz sentido”. “Faz sentido no serviço público. Já que pagamos para as rádios públicas na factura de electricidade, acho bem”, comenta. “As outras rádios devem ser livres de programar o seu produto”, defende, frisando que, apesar da oposição, “as rádios da ARIC cumprem de forma avassaladora os quotas”.
– As principais mudanças na Lei
Duração das licenças
A licença passa dos actuais dez anos para 15 anos, sendo renovável por iguais períodos.
Regime de propriedade
A proposta de lei amplia o número de estações que uma pessoa singular ou colectiva pode deter. Das actuais cinco estações em todo o território nacional, cada operador pode deter até 10 por cento do número de licenças de rádios locais atribuídas em todo o país. Ou seja, sendo que actualmente existem mais de 300 rádios locais, cada operador pode passar a deter cerca de três dezenas de licenças. Contudo, na mesma área de cobertura, distrito, área metropolitana ou ilha, caso das regiões autónomas, não é possível a mesma pessoa singular ou colectiva possuir um número igual ou superior a 50 por cento dos títulos atribuídos a essa área geográfica.
Mudança de propriedade
Apesar de manter o princípio de intransmissibilidade das licenças e autorizações, o novo projecto abre uma excepção no caso das cooperativas, associações ou outras entidades sem fins lucrativos. Neste caso, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social pode autorizar a transmissão da licença para “entidades congéneres, quando esta seja comprovadamente necessária para a salvaguarda do projecto licenciado”, possibilidade que só pode ser exercida dois anos após a última alteração do projecto autorizada pelo organismo regulador.
Emissão em cadeia
É permitida a emissão em cadeia até seis serviços de programas (anteriormente apenas eram permitidos quatro) desde que pertençam a diferentes distritos e a concelhos não contíguos a que podem acrescer mais dois nas regiões autónomas. Os serviços de programas que integrem uma cadeia “devem transmitir um mínimo de seis horas de programação própria, a emitir entre as sete e as 24 horas”. No actual diploma o número de horas obrigatórias é de oito, sendo também forçoso que os serviços de programas generalistas ou temáticos informativos produzam um mínimo de “três serviços noticiosos respeitantes à sua área geográfica”, valor que se reduz a dois blocos informativos na nova proposta.
A proposta de Lei também põe fim à obrigatoriedade de em cada município pelo menos uma frequência estar afecta a um serviço de programas generalista.
Quotas de música
A nova Lei impõe uma quota de música de 25 por cento da programação musical dos serviços de programas. A Lei 7/2006 de 3 de Março, que regula as quotas de música, estipulava uma margem entre 25 a 40 por cento. No caso do serviço público, o diploma remete para o contrato de concessão, que estipula uma quota de 60 por cento de música portuguesa no serviço público de rádio.
Restrições
O projecto de Lei mantém as restrições ao exercício de actividade de rádio, bem como o seu financiamento, directa ou indirectamente, por partidos, associações políticas, sindicatos, associações patronais e profissionais, “salvo” se a actividade for “exercida através da internet” e consistir em serviços de programas de “natureza doutrinária, institucional ou científica”. A mesma regra aplica-se ao Estado e suas participadas. Todavia, o novo diploma abre a possibilidade da concessão de incentivos das autarquias à actividade de rádio, embora “sujeita a aprovação por maioria de dois terços dos deputados municipais eleitos”.
Regime sancionatório
Reduzir para um terço o montante máximo das contra-ordenações quando os ilícitos são cometidos por serviços de programas de cobertura local é uma das alterações contidas no novo diploma. As coimas oscilam, consoante o ilícito cometido, entre 1.250 euros a um máximo de 100 mil euros.