Um assunto que não é para miúdos
Seja através do Parlamento ou da União Europeia, aumentam as pressões para restringir a publicidade a produtos alimentares menos saudáveis dirigidos a menores de 18 anos
Rui Oliveira Marques
Marcas de fabricante fazem crescer retalhistas de sortido curto
Startup portuguesa ZeroPact quer descarbonizar ecommerce
Salvador Martinha protagoniza campanha da Revolut (com vídeo)
Concorrência aprova venda da Ritmos & Blues e da Arena Atlântico
Bar Ogilvy cria anúncio para época de festas na Madeira (com vídeo)
JMR Digital traz para Portugal plataforma de automação de marketing
Luisa García e Tiago Vidal assumem novos cargos na LLYC
‘Outlets’ superam retalho nas vendas de produtos de luxo
Google Chrome pode ser vendido por 20 mil milhões de dólares
Bolo-rei da Versailles é a estrela do anúncio natalício do Pingo Doce (com vídeo)
As alterações ao Código da Publicidade, que estabelecem restrições à publicidade de determinados produtos alimentares dirigidos a menores, foram aprovadas pela esquerda parlamentar em Março de 2012, com abstenção do PSD e CDS. As propostas do PS e do PEV desceram então à Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação e não voltaram a ser mexidas, já que a Comissão tem estado mais atenta às actividades e polémicas que envolvem a RTP, Lusa, ERC e os problemas causados pela implementação da TDT. O PS queria limitar a publicidade, que tem como target os sub-18, “a alimentos que contêm teores de açúcar, gordura, gordura saturada e sódio que se revelam desajustados a uma dieta saudável”. Ficaria também proibida a “realização de acções publicitárias nos espaços escolares e nas suas imediações, de forma a reforçar a protecção da saúde de uma faixa de consumidores mais permeável a acções publicitárias que incentivam comportamentos alimentares desequilibrados e pouco saudáveis”.
As marcas, através da Associação Portuguesa de Anunciantes (APAN), têm passado a mensagem de que o sistema de autor-regulação está a funcionar. “Porquê avançar com legislação se está demonstrado que o perfil e impacto da publicidade a alimentos e bebidas dirigida a crianças se alterou tanto nos últimos anos, como o revelam tantos indicadores independentes?”, questiona Manuela Botelho, secretária-geral da APAN. Segundo Relatório de Monitorização dos Compromissos do Sector Alimentar, relativo a 2012 e apoiado pela associação, as taxas de cumprimento no que respeita à publicidade dirigida a crianças menores de 12 anos são de 99,2 por cento, no que diz respeito ao meio televisão. Entre 2005 e 2012 terá havido uma redução de 97 por cento da exposição dos menores de 12 anos a publicidade, durante os programas infantis, relativa a produtos que não estão em conformidade com os critérios nutricionais. No caso dos programas para todos os públicos, a queda na exposição a publicidade a este tipo de alimentos não foi tão significativa (-21 por cento). “Esta alteração não é devida a uma total deslocação dos investimentos publicitários da TV, mas indicia claramente o resultado de um esforço deliberado das empresas”, sublinha a APAN. Segundo a mesma associação, não existiu nas escolas do primeiro ciclo qualquer comunicação comercial associada a produtos alimentares e que não tenha sido solicitada ou acordada com as escolas. Estes resultados levam a APAN e a Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares (FIPA) a dar nota positiva às medidas de autor-regulação adoptadas por 27 empresas subscritoras, que representam três quartos do investimento publicitário em alimentos e bebidas em Portugal.
“A APAN tem procurado informar e sensibilizar os Grupos Parlamentares e a Comissão de Ética sobre tudo o que a indústria alimentar e o sector da comunicação têm vindo a fazer nos últimos anos em matéria de auto-regulação da comunicação comercial de alimentos e bebidas dirigida a crianças. A indústria é a principal interessada em manter a confiança dos consumidores nos seus produtos e marcas”, comenta a secretária-geral da associação. A APAN tem posto a tónica na auto-regulação e na formação. Em 2005, avançou com um Código de Boas Práticas na Comunicação Comercial dirigida a Menores, que ajudou, entre outros, a estabelecer a distinção entre crianças (menores de 12 anos) e menores de idade (menores de 18). Três anos depois, lançou o o programa Media Smart, para desenvolver o sentido crítico das crianças entre os 7 e os 11 anos. “Trata-se de um verdadeiro projecto de cidadania que ajuda os professores a desenvolver competências nas crianças que lhes permitam ser, no futuro, consumidores mais conscientes e capazes de tomar decisões acertadas”, considera Manuela Botelho. Já a propósito da iniciativa legislativa, que poderia levar várias marcas a terem de mudar os seus planos de media, a responsável espera que o grupo de trabalho da Comissão de Ética que se tem estado a debruçar sobre este assunto “leve em linha de conta não apenas os nossos argumentos, mas as nossas propostas que passam essencialmente pela não discriminação de alimentos e bebidas mas pela promoção de estilos de vida saudáveis”. Mas os meios de comunicação social estarão conscientes do perigo que representa para as suas receitas a possibilidade de esta restrição avançar? “Os meios, enquanto parte integrante do Instituto Civil da Autodisciplina da Comunicação Comercial e garante da eficácia da auto-regulação, não só estão sensibilizados para as questões da auto-regulação como as defendem, com a consciência do impacto que ela pode ter no seu negócio mas, também reconhece, acompanha e participa em todas as iniciativas da indústria solidarizando-se com elas e pondo-as em prática”, defende.
A Associação Portuguesa de Direito do Consumo, dirigida por Mário Frota, também se tem debatido pela adopção de legislação que, seguindo os modelos nórdicos, proíba “a publicidade dirigida a crianças ou envolvendo crianças”. Estes países conseguiram “garantir que, longe da manipulação da publicidade, se consegue criar uma consciência crítica para que, em idade própria, as crianças possam descodificar adequadamente as mensagens da publicidade”, afirma o presidente. Um parecer do Conselho Económico e Social Europeu (CESE), órgão consultivo da União Europeia, que teve como principal relator Jorge Pegado Liz, defende a criação de mais barreiras à participação de crianças na publicidade, bem como a proibição de transmissão de anúncios nos intervalos dos programas infantis. As conclusões defendem que “o consumo excessivo conducente ao endividamento e o consumo de produtos alimentares ou outros que se revelam nocivos ou perigosos para a saúde física e mental”. O parecer também refere que a “publicidade que injustamente usa crianças para fins não relacionados com questões que directamente lhes dizem respeito é uma afronta à dignidade humana e à sua integridade física e mental e deve ser banida”. O CESE considera ainda que esta é uma matéria que deve ser harmonizada no espaço europeu. As próximas restrições também podem chegar de Bruxelas.