Outono quente nas audiências de televisão
A Polícia Judiciária efetuou no dia 11 de outubro buscas por suspeita de adulteração dos resultados das audiências de televisão com consequência no mercado publicitário. Como é que os diferentes […]
Rui Oliveira Marques
Marcas de fabricante fazem crescer retalhistas de sortido curto
Startup portuguesa ZeroPact quer descarbonizar ecommerce
Salvador Martinha protagoniza campanha da Revolut (com vídeo)
Concorrência aprova venda da Ritmos & Blues e da Arena Atlântico
Bar Ogilvy cria anúncio para época de festas na Madeira (com vídeo)
JMR Digital traz para Portugal plataforma de automação de marketing
Luisa García e Tiago Vidal assumem novos cargos na LLYC
‘Outlets’ superam retalho nas vendas de produtos de luxo
Google Chrome pode ser vendido por 20 mil milhões de dólares
Bolo-rei da Versailles é a estrela do anúncio natalício do Pingo Doce (com vídeo)
A Polícia Judiciária efetuou no dia 11 de outubro buscas por suspeita de adulteração dos resultados das audiências de televisão com consequência no mercado publicitário. Como é que os diferentes encaram o assunto?
As recentes buscas da Polícia Judiciária na sede da GfK vieram lançar a desconfiança no atual sistema de medição de audiências televisivas? Em causa estarão suspeitas de adulteração dos números das audiências televisivas, com consequências diretas no mercado publicitário, isto é, em centenas de milhões de euros. A Associação Portuguesa de Anunciantes (APAN) assegura ao M&P que “os resultados e a GfK merecem a confiança dos anunciantes”. Questionadas pelo M&P, SIC e RTP preferem não comentar o tema. A TVI remete a sua posição para um comunicado. Carlos Rodrigues, diretor geral editorial da CMTV, diz ao M&P que “os anunciantes têm razões para confiar no sistema de medição de audiências”, mas aponta para várias “fragilidades”.
A GfK assegura os serviços de audimetria desde 2012, tendo a empresa de estudos de mercado saído vencedora, no final de 2020, de um novo processo de consulta internacional lançado pela CAEM (Comissão de Análise de Estudos de Meios), onde têm assento os anunciantes, meios e agências de publicidade e de meios, para a medição de audiências de televisão em Portugal. O concurso foi disputado, além da incumbente, pela Marktest, Nielsen e Kantar Media. Desta forma, o contrato foi renovado a 1 de janeiro de 2021, por cinco anos.
Na sequência das buscas da PJ nas suas instalações, a GfK declarou em comunicado estar a colaborar com as autoridades com o propósito de “repor a verdade, reiterando que cumpre, e sempre cumpriu, com total rigor, transparência e idoneidade os serviços de medição de audiências televisivas”. A empresa de estudos de mercado assegura que “repudia e lamenta a tentativa, infundada e injusta, de descredibilização do sistema de medição de audiências televisivas, cujo propósito será certamente apurado”. Além disso, a GfK destaca que a metodologia de medição de audiências “obedece a critérios de total rigor, em conformidade com os procedimentos de controlo de qualidade para serviços de medição de audiências e de acordo com as regras estabelecidas para a elaboração de estudos de mercado e com as diretrizes das associações de pesquisa de mercado e sociais”.
A SIC remeteu-se ao silêncio, mas a TVI emitiu um comunicado em que garante “que envidaremos todos os esforços para que quaisquer dúvidas sobre a fiabilidade dos processos de medição de audiências sejam rapidamente esclarecidas, para que a publicidade continue a cumprir com eficácia o seu importante papel no funcionamento da sociedade portuguesa”. Acrescenta ainda que “é do interesse da TVI e dos demais operadores que o negócio da publicidade, principal fonte de financiamento do setor da comunicação social, seja credível aos olhos de todos”. O canal garantia que “tem contribuído ativamente para a credibilidade e transparência do processo de medição de audiências, peça central do negócio da publicidade, e continuará a fazê-lo no âmbito da CAEM”.
APAN destaca trabalho técnico “meritório”. CMTV diz que painel “inflaciona consumo de free to air”
Contactadas pelo M&P, a RTP e SIC preferiram não se pronunciar sobre o assunto, mas Carlos Rodrigues, diretor geral editorial da CMTV, canal líder do cabo, dá alguns contributos para o debate. “Temos a certeza de que continuamos [CMTV] a crescer. Essa certeza vem do contacto diário com os portugueses. Mesmo que a audimetria nem sempre registe esse crescimento ao ritmo do crescimento que sabemos ser real. Porém, não nos queixamos, nem temos uma lógica de auto-complacência. Pelo contrário, no mercado televisivo, a CMTV está e estará sempre do lado da ética de relacionamento. Não colocamos dúvidas nem questões por via anónima, ou pela porta dos fundos”, diz Carlos Rodrigues, para a seguir garantir que “sabemos que o painel não representa na totalidade o consumo real de televisão, porque continua a inflacionar o consumo de free to air em detrimento do cabo. Sabemos, também, que a medição não decompõe convenientemente o consumo Not Set, e devia decompor”, aponta. O Not Set, também designado por Outros, engloba atualmente o visionamento em diferido (time-shift), canais não medidos, streaming e conteúdos “não TV”, como DVD ou videojogos. “Todas estas fragilidades do sistema provêm da relação de forças que se estabelece no interior da CAEM, ou seja, podem ser facilmente resolvidas caso haja consenso entre os players desta indústria no sentido de melhorar a audimetria. Ora, a quem beneficiam essas fragilidades? Creio que a ninguém”, responde. “O pior que pode acontecer a uma indústria é quando abandona o terreno comum que a constitui e estabelece um princípio de suspeição”, retoma. Mesmo com este contexto, Carlos Rodrigues assegura que os “anunciantes têm razões para confiar no sistema de medição de audiências. Devem pugnar pelo reforço dessa confiança, contribuindo permanentemente para que a audimetria seja cada vez mais fiável e mais próxima da realidade dos consumos. Na prática, para que seja cada vez melhor”, aconselha.
A APAN defende que o atual sistema de medição de audiência usado para definir e avaliar os investimentos dos anunciantes na publicidade televisiva é “um sistema complexo, baseado numa amostra de 1200 lares com audímetros, que é gerido pela GfK, e objeto de acompanhamento permanente pela CAEM de forma tripartida e por consenso entre meios, agências e anunciantes”. Neste contexto, subinha a associação, “os resultados e a GfK merecem a confiança dos anunciantes”. Num comentário escrito enviado ao M&P, a APAN destaca ainda o trabalho técnico “meritório” desenvolvido pela CAEM, que permitiu que “esta base se mantenha a mais adequada e confiável para a medição das audiências e dos investimentos em publicidade televisiva”.
O que se passou no ano passado
Ao longo de 2021, diferentes episódios lançaram dúvidas em relação aos resultados apresentados pela GfK. A TVI questionou a diferença de resultados entre os paineis dos lares com cabo e dos lares sem cabo. A 7 de abril, a newsletter da Media Capital dava conta de que, em termos globais, a TVI tinha ficado, no mês de março, a 1,7 pontos percentuais do seu principal concorrente. A SIC tinha marcado 19,5 por cento e a TVI 17,8 por cento. Contudo, se a mesma análise for feita nos lares com cabo, “que representam 87,5 por cento do painel, então apenas 0,1 pontos percentuais separam a TVI da SIC (17,1 por cento versus 17,2 por cento). A diferença entre uma e outra forma de calcular o resultado está nos lares sem cabo”, justificava a mesma newsletter, sublinhando o “impacto significativo dos lares sem cabo nos resultados”. Neste critério, a TVI ficou em terceiro lugar, atrás da SIC e da RTP. É que, no painel dos lares sem cabo, a TVI registava uns distantes 13,1 pontos da SIC (22.9 por cento versus 36 por cento). A Media Capital constavava que “os lares sem televisão por cabo têm sido muito penalizadores para os resultados finais da TVI”. “Em março, o painel teve uma média diária de 2306 indivíduos. Destes, 303 não tinham televisão por cabo e os restantes 2057 tinham TV por cabo. Ora, se verificarmos a evolução da TVI, nos lares com televisão paga existe, desde março de 2020, uma trajetória ascendente. Em contrapartida, nos lares sem televisão paga existe uma estagnação desde o final de 2019”, enquadrava a estação da Media Capital. Publicamente, o canal não voltou a referir o tema da discrepância de resultados das audiências nos dois painéis.
Em junho de 2021, a Procuradoria-Geral da República (PGR) confirmou à Lusa que tinha recebido uma denúncia sobre a alegada adulteração de audiências televisivas, que foi remetida ao Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP), dando origem a um inquérito. Nessa altura, garantia o jornal Tal & Qual, o DIAP estaria a investigar uma alegada “adulteração de audiências televisivas a favor da SIC”. A Impresa negou então a acusação. “É absolutamente falsa, de má-fé e lesiva a acusação que o Tal & Qual e a TVI tentam fazer passar de concertação entre a SIC e a empresa que mede as audiências para a CAEM, a GfK”, reagiu, em comunicado, a estação de Paço de Arcos, assegurando que, “tal como o resto do mercado, representado pela CAEM (que agrega anunciantes, agências e meios de comunicação social), exceto, aparentemente, a TVI, confia no sistema de medição de audiências em vigor, algo que acontecia mesmo durante os anos em que a SIC não foi líder de audiências”.
Também em junho de 2021, a CAEM reagiu às notícias sobre alegadas adulterações de audiências, assegurando que “repudia, em absoluto, a presente tentativa de descredibilizar de forma infundada o sistema de medição de audiências televisivas”. “A CAEM sempre envolveu e prestou os devidos esclarecimentos aos seus associados, incluindo todos os operadores de televisão, acerca de todas as questões relacionadas com este tema”, assegura a entidade, reiterando, em comunicado, “a sua confiança na idoneidade e credibilidade do sistema de medição de audiências em vigor e na importância de reforçar a sua estabilidade”. Em julho, o semanário Nascer do Sol garantia que a PJ tinha pedido às três operadoras de telecomunicações – Meo, NOS e Vodafone – dados sobre as audiências dos canais, obtidas através das suas boxes, para comparar com os dados medidos pela GfK. Chegados a outubro de 2022, a multinacional de estudos de mercado foi alvo de buscas por parte das autoridades.