De dia está na Até ao Fim do Mundo. À noite e aos fins-de-semana trabalha para os EUA
Começou o seu percurso profissional como web designer mas depois passou para o motion design. Filipe Carvalho, nos últimos seis anos, tem conseguido conciliar o seu trabalho como designer na […]
Rui Oliveira Marques
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Começou o seu percurso profissional como web designer mas depois passou para o motion design. Filipe Carvalho, nos últimos seis anos, tem conseguido conciliar o seu trabalho como designer na produtora Até ao Fim do Mundo com colaborações com vários estúdios norte-americanos. O seu trabalho de motion design pode ser visto nos separadores do Game of Thrones, no genérico da nova série Cosmos, no filme Amazing Spider-Man 2 e nos canais HBO, Fox, History Channel, PBS, ESPN ou FX.
Meios & Publicidade (M&P): Como é que começou a trabalhar para o mercado norte-americano?
Filipe Carvalho (FC): Comecei há cerca de seis anos. Depois de construir um portfólio razoável entre 2007 e 2009 com clientes portugueses, enviei um e-mail para um dos maiores estúdios americanos, a Digital Kitchen, que tem escritórios em Chicago, Seattlle, Nova Iorque, Los Angeles. Eu não estava à espera, mas responderam ao meu e-mail. Foi a partir daí que comecei a trabalhar com vários estúdios americanos.
M&P: Do portfólio que tinha então, que trabalhos destaca?
FC: Um vídeo institucional da Gulbenkian e outro vídeo institucional da Partex, empresa de petróleo portuguesa.
M&P: Teve sorte ou o trabalho que se faz em Portugal é uma boa referência em termos internacionais?
FC: Foi um pouco de sorte, mas também o trabalho que procurei desenvolver na altura, antes de contactar a Digital Kitchen, era à imagem do que existia nos Estados Unidos. Tentei copiar um pouco o processo criativo porque parecia-me que era a melhor forma de trabalhar. O processo criativo americano é muito diferente do português. Presta-se muita atenção e dedica-se muito tempo à parte inicial do processo de criação de um genérico de televisão. Procura-se boas ideias, são reunidas e depois separadas para se encontrar um caminho próprio para avançarmos para a produção. Em Portugal isso não acontece. Há muito pouco tempo para se pensar nas coisas porque tem de se produzir rapidamente. Depois, os orçamentos são totalmente diferentes.
M&P: Como se criam laços de confiança entre as partes uma vez que o seu trabalho é feito à distância?
FC: Trabalho, raramente, com os canais, como a HBO e a Fox, mas 97 por cento do trabalho é com os estúdios que depois têm os seus clientes. A Digital Kitchen, por exemplo, tem escritórios em quatro estados americanos. Estão acostumados e para eles é uma coisa cultural trabalhar por Skype, e-mail, FTP e remotamente. Para eles, tanto faz que eu esteja em Lisboa, Seattle ou Nova Iorque.
M&P: Como é a sua semana normal de trabalho?
FC: É complicada. Trabalho em full time na Até Ao Fim do Mundo das 10 da manhã, por vezes, até sete ou oito da noite. Chego a casa, janto com a minha mulher e depois vou-me sentar no escritório até às quatro/cinco da manhã. Às vezes isso acontece durante duas ou três semanas seguidas. Fisicamente é complicado. Tento dosear conforme a minha agenda. Se estiver duas semanas a trabalhar para um projecto nos EUA, tiro depois uma ou duas semanas em que não aceito um projecto dos EUA. Tenho de parar. No início, há seis anos, tinha um projecto internacional mas depois estava dois meses sem novos projectos. Agora já sou relativamente conhecido no mercado norte-americano. Recuso bastantes projectos porque não tenho tempo para me dedicar a eles.
M&P: Um orçamento de um trabalho para os EUA, que tem impacto mundial, não tem nada a ver com a realidade portuguesa…
FC: Os orçamentos não têm nada a ver com os portugueses. A realidade é totalmente diferente. Eles são 300 milhões de pessoas, nós somos dez. Um trabalho recente que fiz foi o do genérico da série Cosmos – A Spacetime Odissey, que passou na Fox e foi nomeado para um Emmy. Na altura do briefing que me foi dado para desenvolver o conceito, havia uma alínea que dizia que o orçamento era ilimitado. Não havia qualquer limitação de budget. Podia fazer tudo o que quisesse. Isso é uma coisa que nunca acontece cá. E este não é caso único, já me tinha acontecido antes com a HBO. Quando são projectos grandes para os canais, eles não têm problemas de orçamento.
M&P: No caso português, que canais trabalham bem nesta área?
FC: A SIC e a SIC Notícias têm muita qualidade gráfica – não falo dos conteúdos. Mesmo o Canal Q, feito por uma empresa relativamente pequena, já ganhou alguns prémios e acho que é muito bom. Não há falta de talento. O problema que encontro para a internacionalização é a dificuldade de muita gente falar inglês. Se não se sabe passar as ideias em inglês, não se chega lá, porque isto é 50 por cento visual e 50 por cento defender aquilo em que pensaste. É preciso ter um nível alto de inglês porque os americanos não vão fazer o esforço de compreender por não sermos americanos. Outra coisa é a falta de horizontes. As pessoas são muito boas, mas não pensam que conseguem mais do que têm agora aqui.
M&P: Quando olha para o seu portfólio internacional, quais são os trabalho de que gosta especialmente?
FC: A resposta é complicada porque há trabalhos que me deram mais prazer porque as pessoas eram muito boas e senti-me muito à vontade. Depois há aqueles em que o resultado em si foi muito bom. Diria que, provavelmente, o trabalho que me deu mais gozo e que teve o resultado mais interessante foi o do genérico de Cosmos, a série que sucedeu à de Carl Sagan. Fui o único freelancer chamado para o projecto e desenvolvi as ideias juntamente com o director criativo do estúdio Big Block em Los Angeles. Trabalhámos directamente com a esposa de Carl Sagan. No final, as minhas ideias foram utilizadas para o genérico e acabou por ser nomeado para um Emmy. Não fui nomeado para um Emmy porque como free lancer não posso aparecer na lista de créditos mas, na prática, é como se tivesse sido.
M&P: Esteve também ligado ao rebranding da Fox…
FC: Os rebranding de canais são processos muito longos, demoraram muito tempo e envolvem muita gente. A Fox, por exemplo, queria um rebranding total que seria depois desdobrado para o mundo. Várias empresas e estúdios foram chamados para a fase de pitching e eu estive envolvido logo nessa fase. Era tão importante para a Fox que o budget era ilimitado e tínhamos acesso aos actores das séries. Na altura tinha coisas como o Dr. House e o Dexter. Sou chamado para repensar a marca e a sua aplicação televisiva.
M&P: No site onde apresenta o seu trabalho (randomthoughtpattern.com), não tem nenhum caso português para ilustrar, mas encontra-se o genérico da novela angolana Jikukumessu. É sinal da diferença do trabalho que faz para os EUA e em Portugal?
FC: O genérico do Jikukumessu é o único projecto da Até ao Fim do Mundo que tenho nesse portfólio. Às vezes é um bocado complicado tirar um chip e meter outro. À noite tenho de meter o chip EUA, onde os orçamentos e expectativas são completamente diferentes. Mas há coisas que transbordam de um lado para o outro. Eu faço produção, isto é, animo e realizo projectos de início até ao fim na Até ao Fim do Mundo, enquanto nos EUA entro na fase de conceito. A experiência que ganho na Até ao Fim do Mundo ajuda-me a ter depois capacidades na parte de conceito para os EUA. Por outro lado, a experiência que tenho de concepting e o que aprendo com a maneira de trabalhar deles acaba por depois influenciar o trabalho na Até ao Fim do Mundo.
M&P: O genérico de Jikukumessu é bastante sofisticado para uma novela. Como foi o processo de criação?
FC: Foi peculiar. O cliente tem muita cultura de imagem, especificamente norte-americana. Foi o próprio cliente que me pediu para desenvolver um genérico um pouco à imagem dos filmes dos anos 70. Por isso, correu muito bem. Foi totalmente desenvolvido por mim desde a fase de concepting até às filmagens com os actores para o genérico. É um projecto que, pelas condições especiais que teve, podia ser americano.
M&P: Aliás, os genéricos das séries norte-americanas estão cada vez mais sofisticados…
FC: Apanhei a fase, como eles chamam, da golden age da televisão. É uma fase maravilhosa das séries de televisão, em que parece que as pessoas gravitam à sua volta. Por exemplo, fui chamado pela HBO para fazer uma coisa muito pequena para o Game of Thrones. Eles tinham um behind the scenes, um production making of da quinta temporada e precisavam de uns separadores gráficos entre as imagens. Uma coisa muito simples de fazer. Assim que disse às pessoas que estava a fazer esse trabalho para o Game of Thrones foi a loucura. As séries, mais do que os filmes, mexem muito com as pessoas. É engraçado fazer parte disso.
M&P: Em termos da golden age na TV portuguesa, não sabemos se vamos atravessar essa fase durante as nossas vidas…
FC: (risos) Não sei se estarei vivo quando a golden age chegar a Portugal. O nosso país tem muito talento mas tem um problema intrínseco que é a falta de orçamento. Não temos mercado para a indústria cinematográfica, não temos mercado e experiência para fazer boas séries de televisão. Por isso é que tive de procurar fora. Não podia ficar à espera.
M&P: Costuma trabalhar em publicidade?
FC: Pouco, às vezes faço coisas na Até ao Fim do Mundo e já fiz dois trabalhos para os EUA mas não gosto de trabalhar em publicidade nem sou chamado para isso. As pessoas olham para o meu portfólio e percebem que não é o que gosto de fazer. Gosto de fazer genéricos de séries de televisão ou de filmes, porque há espaço para uma narrativa, para contar uma história visualmente, seja de uma forma abstracta ou não. Na publicidade tem que se mostrar produto rapidamente. O espaço para a narrativa fica em segundo plano.
M&P: Não está a pensar mudar-se para os EUA?
FC: Não, mas já tive várias respostas para essa pergunta nos últimos anos. Tive propostas e já estive quase a ir porque as condições eram muito boas. Tenho 34 anos mas a minha vida acaba por ser muito cá. Depois de falar com amigos nos EUA, depois de trabalhar com eles, toda a gente me diz que o que tenho é um nicho que mais ninguém tem. Estou no meu país maravilhoso, a trabalhar para os melhores clientes do mundo, nas minhas horas e nas minhas condições.
97 por cento do trabalho é com os estúdios que depois têm os seus clientes. A Digital Kitchen, por exemplo, tem escritórios em quatro estados americanos. Estão acostumados e para eles é uma coisa cultural trabalhar por Skype, e-mail, FTP e remotamente