“Temos claramente um ou dois trabalhos que podem ganhar ouro”
O festival Cannes Lions arranca este fim-de-semana. Em entrevista ao M&P, Vasco Perestrelo, CEO da MOP e representante do festival em Portugal, fala sobre o estado da criatividade nacional e […]
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O festival Cannes Lions arranca este fim-de-semana. Em entrevista ao M&P, Vasco Perestrelo, CEO da MOP e representante do festival em Portugal, fala sobre o estado da criatividade nacional e antecipa o que podemos esperar da performance das agências nacionais
“É imprescindível fazermos melhor.” É desta forma que Vasco Perestrelo, CEO da MOP e representante em Portugal do Festival Internacional de Criatividade Cannes Lions, responde perante as expectativas para este ano. Em 2014 Portugal conquistou apenas um leão de bronze. Nas palavras do profissional, “temos claramente um ou dois trabalhos que podem ganhar ouro” e para pratas e bronzes “há muitos candidatos potenciais”. Ainda assim, Vasco Perestrelo reconhece que a criatividade nacional ainda não está ao nível dos anos áureos da publicidade, antes da crise. “Temos de voltar a ganhar essa capacidade de querer arriscar, de querer ganhar, de querermos ser bons”, exorta, lamentando o facto de que “a crise legitimou a cadeia de valor de não arriscar”.
Meios&Publicidade (M&P): No último ano tivemos um dos piores desempenhos de sempre em Cannes com apenas um leão de bronze [em Design para a This is Pacifica]. Este ano podemos estar mais optimistas?
Vasco Perestrelo (VP): Tivemos uma crise e isso afectou a criatividade. O que a crise fez, além de um impacto financeiro muito importante no mercado em geral e de publicidade em Portugal, que nos últimos cinco a seis anos caiu 35 a 40 por cento, foi levar o mercado todo a retrair-se, começando na cadeia de valor dos anunciantes até aos publishers. Isso aconteceu porque uma crise como a que tivemos faz com que as marcas tenham de pensar no essencial e a publicidade não é o essencial. Devia ser mas não é. Isso fez com que se retirasse um nível de risco, aumentando a aversão ao risco e reduzindo a capacidade de inovação, o que se reflectiu não só no nível de inscrição de candidatos como também na qualidade dos trabalhos. A crise legitimou a cadeia de valor de não arriscar. Nesses anos caímos muito, quer ao nível do volume de inscrições que no numere de candidatos. Em 2013 crescemos um pouco mas penso que teve a ver um pouco com o efeito Eurobest em Portugal, agora voltámos a crescer (os números finais apontam uma subida de 14 por cento nas inscrições portuguesas) e, portanto, nota-se que a publicidade, os prémios e a capacidade de risco está a voltar.
M&P: Mais do que o volume de inscrições, o fraco desempenho terá tido mais a ver com os projectos que existiam e a falta de capacidade das marcas portuguesas em arriscar? O único leão foi, aliás, para um projecto desenvolvido para um estúdio alemão.
VP: Exactamente. Telecomunicações tem sido talvez o mercado mais competitivo em Portugal do ponto de vista da comunicação, mas o mercado de cada marca caiu muito e isso teve um impacto natural na capacidade de investimento, apesar de aí, porque a concorrência ainda é muito dura, ainda houve, principalmente pelo movimento de concentração da NOS e pela força do Meo, uns vestígios de criatividade boa, arriscada, como consequência de o mercado ser muito competitivo. Mas há outros mercados que não são tão competitivos. Quando as marcas chegam à conclusão de que podem, no limite, sentar-se à mesa e chegar a um acordo para cada uma baixar os seus investimentos em x por cento e ficam as duas na mesma em termos relativos, estamos em maus lençóis. Significa que a crise é de tal ordem que faz com que as marcas cheguem a conversar em vez de concorrerem umas com as outras.
M&P: E do lado das agências criativas? Acha que a necessidade que muitas sentiram de reter clientes lhes retirou essa capacidade de propor coisas arriscadas?
VP: Completamente. Há dois níveis de crise, um sustentado em que todo o mercado sofre mas depois existem algumas agências que, por terem uma cultura diferente, vêem nisso uma oportunidade, muitas vezes até são mais ousadas e fazem mais e melhor criatividade para se distinguirem e tirarem partido dessa homogeneização do mercado. Mas há um segundo nível de crise, que infelizmente foi aquele a que chegámos, em que é tão grande e o impacto nas empresas é de tal ordem que esse efeito de curto prazo vai embora também. As agências são feitas de pessoas e, quando se cai 20, 30, 40 ou 50 por cento de receitas, isso tem um impacto imediato no principal custo, que são as pessoas. E não havendo recursos, há uma tendência para que menos pessoas tenham de fazer o mesmo número de trabalhos e isso acaba por homogeneizar o trabalho. Há menos tempo e o exercício criativo é um exercício que precisa de tempo e de reflexão. A crise retirou tudo isso e a consequência foi o trabalho ser bastante mais mediano.
M&P: E neste momento as agências já têm esse tempo?
VP: Ainda não. O grande problema da crise é que vamos demorar mais tempo a recuperar a situação que tínhamos antes. O mercado caiu muito depressa e vai demorar duas a três vezes mais o tempo que tivemos de perda para recuperar os níveis do passado. Mas há coisas boas no meio disto, porque no meio desta revolução consequente da crise, houve a revolução digital, a revolução dos media, várias revoluções ao mesmo tempo, que fazem com que os paradigmas estejam a mudar de uma forma muito mais abrupta. Há muitas agências novas que apareceram já nestas condições e são muito mais elásticas, mais flexíveis, a fazer coisas sem ser nos standards das grandes agências, sempre num modelo muito enraizado nos tempos do analógico.
M&P: A criatividade nacional já está num nível de qualidade semelhante ao dos anos em que trouxemos mais leões de Cannes?
VP: Acho que não, tenho que ser sincero. A crise balizou-nos a todos, a começar pelo anunciante e até chegar a nós, tirou-nos a todos este capacidade de risco e nós somos bichos humanos e acomodámo-nos a isso. Temos de voltar a ganhar essa capacidade de querer arriscar, de querer ganhar, de querermos ser bons. Os resultados da publicidade em Cannes, relativamente a Portugal, durante muitos anos foram melhores do que a nossa posição relativa em relação ao mundo. Em muitos outros rankings não estávamos tão bem como em Cannes em termos criativos, o que mostra que é um sector ambicioso. Isso perdeu-se um bocadinho. É preciso agora que as pessoas que estão à frente das agências voltem a ter esse sentido de querer arriscar e vencer.
M&P: Ao nível das inscrições, no último ano tivemos apenas 10 inscrições em Filme, metade das do ano anterior. Na competição dos Young Lions, pela primeira vez, este ano as inscrições em Cyber superaram as de Filme. É uma tendência esta diminuição das inscrições em Filme a a aposta cada vez maior no digital?
VP: Acho que sim. Há duas tendências a acontecer em filme. Também há filme em Cyber e há muitas coisas low budget que, como vão depois para YouTube, estão a ir para a categoria de digital. Enquanto em Filme tem sido mais o filme tradicional, e aí ainda são grandes produções. E a nossa crise deu cabo disso, com excepção dos filmes da NOS, que tiveram, por força da fusão, a circunstância de ter um grande budget. Mas onde se gastava mais dinheiro numa campanha era na produção do filme e, portanto, isso teve um impacto de curto prazo. Mas há um efeito paralelo, os custos de produção também estão a cair. Hoje em dia consegue-se fazer um filme como telemóvel, o exercício dos Young Lions em Filme em Cannes é com telemóvel. Portanto, há aqui um efeito que vai começar a ter peso a médio prazo, vão começar a aparecer grandes ideias, talvez com níveis de produção muito altos, mas que custam muito menos. Vai dar outra vez um boost à produção de filmes. Mas muitas vezes os filmes mais low budget não vão a televisão porque ainda é caro e vão parar a Cyber. Se continuar a haver essa separação, é natural que o Cyber cresça muito e o Filme não tanto, mais para Portugal. Se a categoria passar a ter mais a ver com o filme em si e não com o meio onde é divulgado, vai crescer como um todo porque estamos numa era, sobretudo no digital, de grande boom do vídeo, vai crescer aí nitidamente.
M&P: Tendo em conta os trabalhos que tem visto e os que foram inscritos, quais as categorias onde lhe parece que os trabalhos portugueses têm mais hipóteses de trazer um leão?
VP: É difícil. Inibo-me sempre um bocadinho de dizer, tenho os meus preferidos, como é óbvio. Há uma campanha que adoro, do Teatro Maria Matos e do São Luiz (projecto criado pela Leo Burnett). Mas aí está um caso que, em termos internacionais, vai ser muito difícil passar porque aquilo é muito nosso, há ali um lado emocional de ser português que nós valorizamos muito mas que tenho receio que tenha dificuldade de passar em Cannes. Espero que não. É um case global, que faz o pleno em termos de comunicação. O que sinto é isso, cada vez mais as agências a especializarem-se não só nas suas áreas tradicionais mas a irem buscar outras áreas, isso vai continuar a ser uma tendência.
M&P: Sem especificar em termos de projectos, quais as categorias com melhores hipóteses?
VP: Diria que temos possibilidades em Design, nas tradicionais temos sempre bons trabalhos e nas áreas digitais também temos coisas muito interessantes. Nas áreas completamente novas, como Innovation e Branded Entertainment, não tenho a certeza se temos alguma coisa inscrita. O que também mostra uma tendência que ainda não chegou cá e que é trabalho também da representação portuguesa, que é ir buscar toda a área tecnológica, startups e isso passou a ter um espaço em Cannes. É para isso o leão em Inovação, para ideias tecnológicas e não tanto para criatividade. Há que ir buscar todo esse sector que, em Portugal e especialmente em Lisboa e em alguns pólos, está muito pujante. Vamos, com o passar do tempo, ver esses pólos entrar em Cannes, o que é bom. A nossa ideia é que no próximo Cannes Lions Review, já este ano, já tenhamos espaço para toda essa gente.
M&P: Se tivesse de apostar numa previsão, o que diria? No último ano foi apenas um e de bronze. É fácil fazer melhor este ano?
VP: É imprescindível fazermos melhor. Temos claramente um ou dois trabalhos que podem ganhar ouro, gostava muito que pudéssemos trazer ouros. A partir daí acho que para pratas e bronzes há muitos candidatos potenciais. Embora não seja decisivo, é importante em termos relativos o que vai aparecer dos outros países. Para o ouro isso não é importante, quando um trabalho é ouro é ouro, mas para prata há uma tendência para se equilibrar um bocadinho, ver o que se está a fazer em termos mundiais. Mas acho que temos aí muitas hipóteses, shortlist então muitas mais, mas gostava de ter no mínimo dois, três, quatro leões e, se possível, um ou dois leões de ouro.
Inscrições portuguesas em Cannes crescem 14% para 241 projectos
LDepois de terem caído cerca de 31% no último ano, fixando-se em 211 projectos inscritos, as inscrições portuguesas no festival Cannes Lions voltaram este ano a crescer na ordem dos 14% de acordo com os números oficiais agora divulgados. Este ano estarão a concurso no festival de criatividade 241 projectos de agências nacionais (235 mais seis projectos inscritos no festival Lions Health), ainda assim aquém dos 313 projectos submetidos em 2009, o ano com maior volume de inscrições desde que rebentou a crise no mercado publicitário.
Em termos de categorias, Imprensa continua a ser a mais concorrida pelas agências nacionais, com 41 projectos inscritos, seguida de Outdoor com 29. Empatadas em terceiro lugar estão as categorias de Media e Promo & Activação, ambas com 23 inscrições. Logo a seguir, com 22, surge a categoria Cyber, seguida de Filme e Direct com 18 e 17 projectos nacionais a concurso, respectivamente. Com 12 inscrições estão as categorias de Design e Filme Craft e com 11 as de Rádio e RP. Branded Content & Entertainment conta com 9 projectos de agências nacionais, enquanto Design de Produto e Mobile registam apenas 5 e 2 respectivamente. Nas categorias de Titanium & Integrated, Eficácia Criativa e Glass Lions, assim como no novo festival Innovation Lions, não há projectos nacionais a concurso. No festival Lions Health Portugal conta com 6 inscrições, 3 em Pharma e 3 em Health & Wellness.
No total de todos os países, o festival bateu este ano novo recorde com 37,426 inscrições, a que se somam 1862 nos Lions Health e 845 nos Innovation Lions.
Previsões para Cannes
M&P: Esses dois projectos de que fala com hipóteses de ganhar ouro, pode adiantar quais são?
VP: Não, como representante não gosto de dizer. Também já me enganei, houve pelo menos um ano em achei que ia ganhar e nao aconteceu. O meu critério já falhou. A meu favor tenho o facto de que em todos os outros anos acertei sempre, como foram os casos da Microsoft e O Escritório ou da campanha da Fuel. Mas acho que vamos ganhar alguma coisa de ouro.
M&P: E a nível internacional? Quais os cases que se destacam e que estão na frente da corrida pelos leões?
VP: Há uma campanha internacional para o National Geographic, um filme em que só usam locução de uma pessoa conhecida, o Kevin Spacey, em que, no fundo, fazem uma analogia à nossa destruição do planeta. E os filmes são lindos. Estou a dar este exemplo porque é um exemplo completamente tradicional, em que a pureza de uma história bem contada, com um copy bem escrito, tem um efeito extraordinário. Depois há todo um conjunto de casos virais que são extraordinários.
O estado da criatividade nacional